Categoria Opinião  Noticia Atualizada em 29-12-2006

Uma Mensagem nada Convencional
Sempre quis escrever uma mensagem para fim de ano; dessas do tipo Receita de Ano Novo de Carlos Drummond de Andrade:
Uma Mensagem nada Convencional

Sempre quis escrever uma mensagem para fim de ano; dessas do tipo Receita de Ano Novo de Carlos Drummond de Andrade: "� dentro de voc� que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre"... Uma mensagem que conseguisse transmitir os meus palpites mais assertivos sobre uma poss�vel auto-ajuda politicamente correta, sem inten��es de arrefecer a trag�dia do cotidiano com um drama alienado de palavras adocicadas; uma mensagem que fosse capaz de enumerar, de forma sucinta e clara, as coisas mais importantes que as pessoas em geral gostariam de ouvir ao final de um ano.

Gostaria que fosse uma cr�nica, ou um poema, ou um conto, qualquer coisa que n�o parecesse em nada com aquelas mensagens self-service veiculadas por e-mails, essas que encaminhamos � sem ao menos terminar de ler � para todas as pessoas registradas como nossos contatos. E isso porque uma mensagem de fim de ano n�o pode ser produ��o em s�rie. Ela deve ser na medida certa, de forma que cada um que a tocar com os olhos sinta que ela nasceu n�o de uma planilha fria de windows, mas de uma alma aquecida por qualquer sentimento aut�ntico.

Tentei algumas vezes compor a tal mensagem de fim de ano, com listas de coisas imprescind�veis de se lembrar. Tentei harmonizar versos que bem poderiam ser usados num exame de consci�ncia com sugest�es pr�ticas de como compensar no pr�ximo ano o que n�o deu certo no que termina. Tentei anestesiar, ao longo dos par�grafos, a culpa de nossa futilidade no ano que passou, tornando-a melodiosa e emocionante, dando um jeitinho de fazer passar por singeleza das pequenas coisas o que, na verdade, foi ocupa��o com coisas pequenas. Tentei, enfim, adaptar a fracassada t�tica da dieta da segunda-feira �quilo que pareceria uma programa��o po�tica do que come�ar a fazer de novo no ano que se inicia; coisas que seriam anotadas na agenda ao dia primeiro de janeiro e que, irremediavelmente, seriam esquecidas at�, no m�ximo, o carnaval, e seriam empurradas com uma barriga t�o grande quanto a de Papai Noel.

O texto que sempre desejei escrever ainda n�o ficou pronto. Na verdade, eu espero que ele nunca venha a ser escrito de fato. Espero que ele sirva, em minha mem�ria, somente para lembrar que: fim de ano nunca ser� esse tempo m�gico de renova��o de nada; r�veillon n�o � mais prop�cio � mudan�a da minha vida que qualquer outro dia do ano; os pulinhos no mar (a n�o ser para comemorar), a roupa branca (a n�o ser para lembrar a paz), o mapa astral, as previs�es do charlat�o, a cidra servida em ta�as de champagne, os fogos de artif�cio (o nome j� diz, t�o artificiais), a contagem regressiva (ainda mais relativa no hor�rio de ver�o)... tudo isso n�o passa de s�mbolos do que devo trazer de real em meu interior.

A novidade � uma cria��o humana para burlar a rotina e alimentar a esperan�a num futuro melhor. O calend�rio jamais conseguir� efetuar uma mudan�a em si mesmo. O fim do ano n�o � um tempo de tudo ou nada, mas uma grande continua��o. A solu��o de nossos problemas n�o est� na irrup��o de algo novo miraculosamente ca�do do c�u, mas no "eterno retorno", para lembrar Nietzsche... na afirma��o de que "n�o h� nada de novo debaixo do c�u", para lembrar o Eclesiastes. E isso n�o com o pessimismo da desesperan�a, mas com a coragem de dar novo significado �s coisas que perduram.


    Fonte: O Autor
 
Por:  Juliano Ribeiro Almeida    |      Imprimir