Categoria Opinião  Noticia Atualizada em 19-03-2007

NO MOSTEIRO DE MELK
Uma vez por ano vou ao mosteiro de Melk, na �ustria, participar dos Encontros Waldzell, iniciativa de Andreas Salcher e Gundula Schatz.
NO MOSTEIRO DE MELK

Uma vez por ano vou ao mosteiro de Melk, na �ustria, participar dos Encontros Waldzell, iniciativa de Andreas Salcher e Gundula Schatz. Ali, durante todo um final de semana, somos capazes do imposs�vel: misturar um misto de retiro espiritual silencioso com apaixonadas discuss�es sobre o estado atual do planeta.

Uma vez por ano, me encontro ent�o com o antigo prior do mosteiro, Abade Burkhard. N�o falamos nenhuma l�ngua comum, mas sua presen�a me transmite n�o apenas paz, mas uma esp�cie de compreens�o especial do sentido da vida. Em 2006, dei uma entrevista para a revista News, onde dizia que Burkhard era o meu silencioso mentor, ao mesmo tempo em que alertava que ele n�o gostaria de ser chamado assim. Evidente que eu tinha raz�o: em um artigo carinhoso, ele refuta o t�tulo, mas mostra mais uma vez sua sabedoria. A seguir, trechos de suas reflex�es neste mesmo artigo (que reduzi e adaptei por causa do espa�o).

Em busca do sentido

Em um dos nossos encontros nos por�es da abadia, (Coelho) perguntou quais seriam os passos corretos a serem dados por um homem. Claro que existem muitas coisas erradas no mundo, capazes de trazer destrui��o e arrependimento. Existem outras coisas que seriam capazes de compensar tudo isso, mas nem sempre s�o poss�veis, e n�o entendemos por qu�.

Mesmo as pessoas que n�o tem f� conhecem a situa��o do mundo. Este reconhecimento permite que sejamos capazes de mover rochas, se tivermos vontade, e acender de novo todas as luzes que foram apagadas.

Quando entrei na Ordem Beneditina, eu tinha algumas pequenas raz�es para tomar tal decis�o. Pouco a pouco, comecei a percorrer meu caminho, a me identificar com ele, ao mesmo tempo em que n�o conseguia entender bem tudo que se passava � minha volta. Cada vez que eu dava uma sugest�o a respeito de algo que precisava ser mudado, ouvia a resposta:

"O que voc� quer exatamente? Este mosteiro foi educado para pensar em termos de s�culos, n�o de mudan�as imediatas".

Este coment�rio n�o me ajudava, e eu me sentia distante de todos os ideais que trazia dentro de mim.

Finalmente, uma conversa com um velho monge mudou por completo minha vis�o do assunto. Quando lhe comentei meu problema, me respondeu:

"Voc� fica chateado que aqui pensamos em termos de s�culos? Perfeito, ent�o esque�a isso, e fa�a o que achar melhor, na velocidade que julgar conveniente".

Na mesma hora eu me dei conta que todas as minhas grandes transforma��es interiores andavam devagar, e a presen�a Dele em minha alma surgindo gradualmente. N�o no plano de minha consci�ncia, e sim em um lugar mais profundo, mais denso, onde as coisas n�o se deixam abalar t�o facilmente.

Para isso, � necess�rio que a pessoa possa experimentar caminhos errados, atalhos que n�o deviam ser percorridos; pouco a pouco, atrav�s justamente destes altos e baixos de nossas vidas � que come�amos a nos dar conta do que � certo. E sentimos uma imensa liberdade para seguir adiante.

� necess�rio aprender a viver com a energia que vem do nosso interior, e que nos mant�m passionais e entusiasmados com que fazemos. Ao inv�s de buscar nas grandes coisas as respostas que necessitamos, basta prestar aten��o nos pequenos detalhes que passam desapercebidos. Como qualquer crian�a. "Eu agrade�o, � Pai, Senhor do C�u e da Terra, porque escondeste estas coisas dos s�bios e dos eruditos, e revelastes �s crian�as" (Mateus, 11:25).

� assim que nos damos conta da nossa transforma��o. Quando o indiv�duo entende que pode mudar pequenas coisas, retoma o sentido de sua vida, deixa de ter pressa porque est� concentrado no pr�ximo passo.

E quanto mais mudamos no pequeno, mais o grande � transformado.


    Fonte: O Autor
 
Por:  Paulo Coelho    |      Imprimir