Categoria Opinião  Noticia Atualizada em 07-05-2007

UM PAÍS QUE PENSA PEQUENO
Quando eu falo que o Brasil é um país que, apesar de todas as inovações tecnológicas, continua pensando pequeno e é arrastado absolutamente contra a vontade
UM PAÍS QUE PENSA PEQUENO

Quando eu falo que o Brasil é um país que, apesar de todas as inovações tecnológicas, continua pensando pequeno e é arrastado absolutamente contra a vontade no rumo da modernidade, eu falo com conhecimento de causa. Dois exemplos - um pessoal, e um que todos viram, esta semana.

Resolvi comprar um par de tênis. Meu pé é um pouco maior do que o padrão tupiniquim, e por isso não achei o modelo que queria aqui na cidade. Fui a cerca de dez lojas, e em todas elas, eu perguntava: "Mas será que não dá pra vocês entrarem em contato direto com a fábrica, ou puxar de outro revendedor?" A resposta era sempre negativa, e com um bordão irritante: "Nossa grade só vai até o número quarenta e quatro, e a gente só negocia grandes quantidades. Não dá pra fazer compra individual."

Tudo bem. Entrei no Google, coloquei o tênis que eu queria, e. bingo. Uma loja na região Sul tinha não só o meu quarenta e cinco, mas oferecia até o mesmo modelo no tamanho quarenta e seis. Mandei buscar pela internet, e dois dias depois o produto já estava em casa, com compra parcelada no cartão de crédito, igualzinho a se eu tivesse ido a uma loja local, e a loja tivesse feito isso por mim. Resultado: na era do comércio globalizado, agora procuro primeiro numa loja de Curitiba, via internet, em vez de gastar gasolina rodando pelo comércio burro de Brasília.

O segundo exemplo é o do outrora rei Roberto Carlos, que hoje - não bastassem suas batalhas contra uma desordem mental conhecida como PAC. Não, leitor(a), o PAC é o transtorno que atrapalha o Lula. O problema do Roberto Carlos é o TOC. Bom, o Roberto Carlos, como todos sabem, resolveu dar um tiro no pé por causa de uma biografia não-autorizada que ele não leu e não gostou.

O caso foi resolvido à brasileira, claro, com o juiz encarregado de solucionar o caso fazendo até distribuição de CDs de sua autoria para os presentes, mas a besteira cometida por Roberto Carlos expôs de maneira clara como se pensa pequeno nessa terra grande.

Fato número um: ainda que exponha fatos obscuros da vida do cantor, o livro não denigre a personalidade de Roberto Carlos de maneira irremediável. Não inventa mentiras do tipo "Roberto Carlos e Jerry Adriani viveram uma paixão durante dez anos, e até hoje o rei consegue esconder sua homossexualidade com perfeição."

Fato número dois: Não existe censura no Brasil, e não pode existir censura no Brasil. Se Roberto Carlos ficou insatisfeito com a descrição dos fatos de sua vida por um motivo ou por outro, que contrate alguém para escrever a sua biografia autorizada. Aí, sim, os seus fãs poderão saber, diretamente de Roberto Carlos, por suas próprias palavras, como os fatos verdadeiramente ocorreram - ou, pelo menos, como o outrora rei gostaria que eles tivessem ocorrido.

Do mesmo jeito que as lojas de calçados de Brasília precisam aprender que o mundo é globalizado, Roberto Carlos precisa entender que, ao se tornar uma figura pública, um ícone do imaginário popular, seu direito à privacidade ficou diretamente proporcional ao montante de dinheiro que ele esteja disposto a gastar para manter essa privacidade. E não é proibindo que as pessoas leiam um livro que isso vai acontecer. Especialmente quando já foram vendidos quase vinte e cinco mil deles.


Fonte: O Autor
 
Por:  Claudio Lessa    |      Imprimir