Categoria Opinião  Noticia Atualizada em 16-06-2007

“SEU ZEZINHO”
Um poema épico escrito com drible, toques, passes, bicicletas, bolas rolando pela linha de fundo.
“SEU ZEZINHO”

Queria escrever uma crônica bem bonita sobre seu Zezinho e bem ácida sobre nossas ‘otoridades’ que em nada colaboram para uma justa homenagem (um simples busto) àquele que foi o maior técnico, treinador e preparador de craques do Brasil, quiçá do mundo.

No entanto, tudo de bom que eu tentasse dizer sobre "Seu Zezinho" já foi escrito no livro "Fotocrônicas" do genial Dr. Wilson Márcio Depes e que aqui transcrevo com uma baita inveja por não tê-la escrito.

"SEU ZEZINHO:

Trata-se de um conto que teria ocorrido na África. Mas eu não acredito: foi em Cachoeiro. No Campo do Estrela.

Pierron voava para cumprir sua missão. O bem ou o mal não lhe dizia nada e o inimigo era cúmplice do mesmo papel.

Sol fortíssimo. Mesmo assim Pierron distingue, ao longe, o povoado de Cuala, no Congo: em trinta segundos estará sobrevoando a ponte que tem por missão destruir.

Mas, ao ver a ponte, ele vê também, ao lado, um campo de futebol cheio de crianças.

Está na hora de deixar cair as duas bombas aninhadas nas asas do avião.

Ele tem que cumprir a ordem de seus patrões, se não, terá que curtir, na Europa, o desemprego e o tédio.

Atrás do pára-brisa estratégico, após uma curva de inclinação, ele reconhece negrinhos de pés descalços fazendo firulas com uma bola. Dentro daquelas cabecinhas nunca tinha passado a idéia de guerra. Nem dos preconceitos. Nem das grandes maldades do mundo.

A aviação militar havia aberto alternativas de ficar rico. A Indochina, a Argélia e, agora, as missões mercenárias no Congo. A guerra realmente parecia tê-lo arrancado definitivamente de sua doce infância.

Mas eis que Pierron se deixa dominar por recordações remotas. Daquelas gritadas por aquele homenzinho de pés chatos, imponente, quase herói, cheio de fibra:

-Põe a cabeça na bola, menino! Solta a bola! Vamos tocar de primeira!

A caminho do pouso Pierron imagina: como explicar aos patrões que ele recusou destruir uma ponte só porque jogara futebol em criança?

Um grupo de crianças a correr num campinho de futebol despertou em Pierron um sentimento que nunca mais passara por sua cabeça: a compaixão.

Hoje, mais do que nunca, tenho a certeza de que Seu Zezinho não é apenas um fazedor de craques.

É um fazedor de homens.

Uma alma de herói.

Um poema épico escrito com drible, toques, passes, bicicletas, bolas rolando pela linha de fundo.

Uma grande mensagem de amor colhida num campo de futebol.

No Campo do Estrela.

Seu Zezinho" (Fotocrônicas, p. 20, 1987, Wilson Márcio Depes)

    Fonte: O Autor
 
Por:  Manoel Manhães    |      Imprimir