Categoria Religião  Noticia Atualizada em 09-05-2009

"Debate" de alto nível dispersa tensão por polêmicas entre papa e o islâ
Príncipe discursa com o papa sentado ao lado

Foto: Daniel Buarque/G1

Daniel Buarque

Um encontro diplomático intelectual e um debate religioso de alto nível maracaram o segundo dia da viagem de Bento XVI ao Oriente Médio, neste sábado (9), em Amã, na Jordânia. Depois de uma rápida visita ao Monte Nebo (de onde Moisés teria avistado a terra prometida após vagar por 40 anos no deserto), pela manhã, o papa rumou para a mesquita de Al Hussein, a maior e mais nova da cidade, onde se reuniu com representantes de vários países, ouviu um excelente discurso do príncipe Ghazi Bin Muhammed Bin Talal, que representava o governo, e respondeu com ideias igualmente elegantes.

O G1 esteve presente no encontro realizado no local sagrado para os muçulmanos, que se sucedeu, na peregrinação papal, à visita de Bento XVI ao centro Regina Pacis, na sexta-feira (8), quando deu atenção a parte da pequena comunidade cristã da Jordânia e dos países vizinhos. O encontro ocorreu numa tenda ao lado de fora da mesquita e teve participação de cerca de 400 pessoas - incluindo mais de cem jornalistas.

Os discursos em tom quase acadêmico deste sábado serviram para dispersar a tensão que podia haver em torno da visita, já que Bento XVI havia se envolvido em polêmica ao criticar a religião islâmica em 2006. Os dois discursos focaram o diálogo entre cristãos e muçulmanos, religiões que vêm se aproximando nos últimos anos, segundo eles.

Apesar de a maior parte dos líderes religiosos da Jordânia terem evitado até este sábado tratar da polêmica declaração do Papa de três anos atrás, quando citou um texto que dizia que o islâ era uma religião violenta, o príncipe Ghazi não deixou o assunto em branco. Em uma repreensão suave, lida em inglês perfeito, agradeceu Bento XVI por ter se "arrependido" (assim mesmo, com aspas) da declaração, alegou que os muçulmanos acabaram se sentindo ofendidos, mas que sabia que, por sua fé, nenhuma declaração podia ofender o profeta.

Contra o preconceiro

O príncipe criticou a visão preconceituosa e errada com que o islâ é visto pelos ocidentais. Segundo Ghazi, o profeta Maomé, adorado pelos muçulmanos, é "completamente diferente" das descrições históricas dele no Ocidente. "Estas descrições são distorcidas por aqueles que, ou não conhecem os árabes ou o Alcorão, ou não entendem o contexto histórico e cultural da vida dele."

Ele deu boas-vindas ao papa de quatro formas: como um muçulmano, como um hashemita, como árabe e como jordaniano. E disse que ele era recebido também de quatro formas: líder espiritual dos católicos, Bento XVI – com sua coragem moral de falar o que pensa-, chefe de Estado do Vaticano e como peregrino da paz no Oriente Médio.

O príncipe defendeu que os cristãos têm total liberdade de religião seu no país, que alegou ser um exemplo da convivência entre as crenças. "conhecemos os cristãos como companheiros jordanianos, e eles são tanto parte do país quanto a própria terra", disse. E pediu que o papa lute para que os muçulmanos recebam o mesmo tratamento que os cristãos recebem na Jordânia em países em que são minoria.

Manipulação ideológica

Mesmo sem voltar a tocar nos assuntos que já renderam polêmicas em seus discursos, Bento XVI falou de forma inteligente, apoiando o diálogo interreligioso e protestando contra o uso equivocado que se faz da religião", o que, segundo ele, tem dado força e argumento para os que culpam a própria religião pelos problemas do mundo.

"Certamente, a contradição de tensões e divisões entre seguidores de diferentes religiões, infelizmente, não podem ser negadas. Entretanto, não seria o caso que muitas vezes é a manipulação ideológica da religião, às vezes por fins políticos, que é o verdadeiro catalizador para a tensão e a divisão, e às vezes até da violência na sociedade?", questionou.

Para o pontífice, é preciso que os crentes sejam verdadeiros em seus princípios e crenças. "Muçulmanos e cristãos, precisamente por carregarem o peso da história comum tão marcada por mal-entendidos, precisam hoje lutar para serem reconhecidos como adoradores de Deus", disse.

Representando o encontro religioso defendido pelo papa e pelos líderes muçulmanos, enquanto Bento XVI encerrava seu discurso, lido num inglês de difícil compreensão, um cântico religioso islâmico começou a ser ouvido ao fundo, como se houvesse alguém rezando de forma alta na mesquita. O Papa não chegou a interromper o discurso, nem houve tensão pelo som de fundo, mas ficou uma interessante sensação de que estava sendo alcançada, ao menos em parte, a comunhão buscada pelos dois credos.

"Debate" de alto nível dispersa tensão por polêmicas entre papa e o islâ
Bento XVI se envolveu em polêmica ao criticar o islamismo em 2006.
Príncipe agradeceu o papa por ter se "arrependido" da declaração.

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Por:  Alexandre Costa Pereira    |      Imprimir