Categoria Opinião  Noticia Atualizada em 27-07-2009

DOS ALIMENTOS NA LEI MARIA DA PENHA
A Lei n. 11.340, de 07 de Agosto de 2006, conhecida como �Lei Maria da Penha�...
DOS ALIMENTOS NA LEI MARIA DA PENHA

Carlos Eduardo Rios do Amaral � Defensor P�blico do Estado do Esp�rito Santo

A Lei n. 11.340, de 07 de Agosto de 2006, conhecida como "Lei Maria da Penha", sabedora das peculiares das mulheres em situa��o de viol�ncia dom�stica e familiar, estabelece em seu Art. 22, Inciso V, o direito da mulher ofendida aos alimentos provisionais ou provis�rios. Eliminando-se uma poss�vel d�vida ou contradi��o, esclare�a-se que alimentos provis�rios s�o aqueles fixados de plano pelo Juiz ao receber a peti��o inicial, na a��o de rito especial disciplinada pela Lei n. 5.478/68 (Lei de Alimentos); j� os alimentos provisionais, tamb�m chamados de preventivos, est�o previstos como medida cautelar no C�digo de Processo Civil. Mas, tanto os alimentos provisionais quanto os alimentos provis�rios se destinam, fundamentalmente, a suprir as necessidades da credora, ainda que os provisionais tenham maior conseguimento quanto a tais necessidades. Andou bem a Lei n. 11.340/2006 em fazer men��o expressa a esses dois tipos de presta��es alternativas devidas pelo agressor � alimentos provisionais ou provis�rios � , para garantia da efetividade dessa medida cautelar de sobreviv�ncia da mulher.

Esta presta��o de alimentos provisionais ou provis�rios � classificada pela Lei n. 11.340/2006 como uma das diversas medidas protetivas de urg�ncia, inserida, especificamente, dentro do rol de medidas protetivas de urg�ncia que obrigam o agressor. Sua g�nese factual e legal � a pr�tica de viol�ncia dom�stica e familiar contra a mulher. Por �bvio, o constrangimento f�sico ou moral e o abuso da for�a, para muito al�m de simples descumprimento de um dos deveres conjugais (respeito m�tuo), ocasiona grave ruptura da sociedade conjugal. E, a Lei n. 11.340/2006 bem delimita ao int�rprete, generosamente, o alcance da express�o viol�ncia dom�stica e familiar contra a mulher, em seu Art. 7�, para o efeito de sua constata��o pr�tica. Para esse dispositivo, s�o formas de viol�ncia contra a mulher a viol�ncia f�sica, a viol�ncia psicol�gica, a odiosa viol�ncia sexual, a viol�ncia patrimonial e viol�ncia moral.

A imposi��o da presta��o de alimentos provisionais ou provis�rios pelo agressor n�o poder� ser deferida pela Autoridade Policial, agente p�blico que, na esmagadora maioria dos casos, � quem tem o primeiro contato com a mulher v�tima de viol�ncia dom�stica e familiar. O caput do Art. 22 da Lei n. 11.340/2006 � claro ao dispor que essa medida protetiva ser� aplicada privativamente pelo Juiz. E o ve�culo procedimental para se atingir eficaz e celeremente essa provid�ncia n�o ser� o Inqu�rito Policial, muito menos as ainda distantes Den�ncia ou Queixa formuladas pelo Minist�rio P�blico ou querelante, respectivamente. A medida protetiva de presta��o de alimentos provisionais ou provis�rios dever� ser requerida quando do atendimento � mulher em situa��o de viol�ncia dom�stica e familiar pela Autoridade Policial, que, feito o registro da ocorr�ncia, colhido esse pedido, incontinenti, o remeter� no prazo de 48 (quarenta e oito) horas ao Juiz, em expediente apartado, para a concess�o da medida. Fixando o Art. 18, Inciso I, da Lei n. 11.340/2006 o prazo improrrog�vel de 48 (quarenta e oito) horas para que o Juiz conhe�a desse expediente e decida sobre seu cabimento.

O uso da express�o "poder� aplicar" n�o impressiona, nem sinaliza poder discricion�rio ou arbitr�rio do Julgador. Quer a express�o "poder�" indicar que a concess�o dos alimentos provisionais ou provis�rios ficar� condicionada � an�lise pelo Juiz do preenchimento de seus requisitos legais. Poder�, assim, o Magistrado, por exemplo, entender restar n�o demonstrada primo ictu oculi a ocorr�ncia de pr�tica de viol�ncia dom�stica e familiar contra a mulher, postergando a an�lise do pedido para etapa posterior do procedimento, como a do Art. 16, presentes as partes envolvidas; poder� o Juiz entender da desnecessidade do pleito em raz�o da aferi��o dos pressupostos da necessidade-possibilidade, uma vez que a pr�tica de viol�ncia dom�stica e familiar contra a mulher n�o � infort�nio exclusivo de mulheres pobres ou donas de casa (do lar); poder� o Juiz reconhecer o eventual desemprego do agressor, o que � muito comum naqueles casos de depend�ncia qu�mica do �lcool e de drogas il�citas; e, ainda, poder� o Julgador reconhecer o harm�nico e pac�fico retorno do conv�vio conjugal e familiar, o que, confessadamente, n�o � raro, para a sempre surpresa dos atores do processo. Assim, ocorrentes o pressupostos da medida de urg�ncia para sobreviv�ncia da mulher ofendida e da prole do casal, dever� o Magistrado, sim, deferir os alimentos provisionais ou provis�rios. A n�o concess�o da medida de subsist�ncia, quando presentes os seus pressupostos, � medida teratol�gica e draconiana a desafiar, inclusive, a impetra��o de mandado de seguran�a, para cessar o abuso de poder ou mesmo a ocasional juizite extravagante. Mas, de uma leitura mais aprofundada e detida do caput do Art. 22 da Lei da Mulher, parece que a express�o "poder�" mais se afei�oa � imediatidade do momento para a concess�o da medida, como � aplica��o conjunta ou separada das medidas protetivas de urg�ncia solicitadas pela mulher no expediente policial. Em qualquer caso, n�o ser� a interpreta��o literal a vencedora nessa exegese, eis que o Art. 4� da Lei n. 11.340/2006, consagrando sem coadjuvantes a interpreta��o teleol�gica, preconiza que na interpreta��o desta Lei, ser�o considerados os fins sociais a que ela se destina e, especialmente, as condi��es peculiares das mulheres em situa��o de viol�ncia dom�stica e familiar.

Importante salientar, ainda, que a concess�o dos alimentos provisionais ou provis�rios, prevista no Art. 22, Inciso V, da Lei n. 11.340/2006, deve levar em considera��o o sistema de tutela da mulher em que se encontra inserido, o que importa dizer que essa presta��o de alimentos provisionais ou provis�rios imposta ao agressor � medida ex vi legis. A Lei n. 5.478/68, batizada de Lei de Alimentos, deve integrar a melhor interpreta��o da provid�ncia alimentar solicitada pela v�tima. O Art. 4� desse �ltimo Diploma � imperativo ao dispor que ao despachar o pedido, o Juiz fixar� � dever � desde logo alimentos provis�rios a serem pagos pelo devedor, salvo se o credor expressamente declarar que deles n�o necessita. Por essa Lei a liminar s� n�o ser� deferida de plano se indemonstrados o parentesco ou a obriga��o alimentar do devedor (Art. 2�). Cui licet quod est plus, licet utique quod est minus (quem pode o mais, pode o menos), ora, se nos mais singelos e costumeiros casos de separa��o litigiosa motivados por conduta desonrosa ou falta a dever conjugal, a presta��o de alimentos provis�rios ser� deferida liminarmente ex vi legis (Art. 4�, da Lei 5.478/68) t�o-s� pela demonstra��o documental do parentesco e da obriga��o alimentar do devedor, quanto mais quando a causa da ruptura da rela��o conjugal for a inaceit�vel pr�tica de viol�ncia dom�stica e familiar contra a mulher.

O inadimplemento inescus�vel e volunt�rio da presta��o de alimentos provisionais ou provis�rios, fixada pelo Juizado de Viol�ncia Dom�stica e Familiar contra a Mulher, constitui em viola��o de medida protetiva de urg�ncia san�vel pela via da advert�ncia da possibilidade da decreta��o da pris�o preventiva do agressor devedor dos alimentos, como garantia da ordem p�blica, no interesse da manuten��o digna da mulher violentada em seus atributos f�sicos e morais. Tudo, sem preju�zo da caracteriza��o do estado flagrancial do delito de abandono material, consistente na falta ao pagamento de pens�o aliment�cia judicialmente fixada, insculpido no Art. 244 do C�digo Penal; e, ainda, da imediata execu��o provis�ria da decis�o concessiva dos alimentos, no pr�prio Juizado da Mulher, que tamb�m possui compet�ncia c�vel por for�a do disposto Art. 14 da Lei n. 11.340/2006, aplicando-se a regra delineada nos Arts. 732 usque 735 do C�digo de Processo Civil, decretando-se, assim, a pris�o civil do devedor-agressor pelo prazo de 1 (um) a 3 (tr�s) meses se ele n�o pagar, nem se escusar.

Por derradeiro, cabe a sincera advert�ncia de que na fixa��o dos alimentos provisionais ou provis�rios a ser levada a efeito pelo Julgador, este n�o dever� levar em conta t�o-somente a verba ordinariamente necess�ria para manuten��o da mulher e da prole, como os alimentos naturais, habita��o, sa�de, educa��o, vestu�rio e lazer, mas, sim e principalmente, da verba necess�ria para cobrir e mitigar todas as despesas e transtornos f�sicos e emocionais ocasionados pela viola��o dos direitos humanos da mulher, prestigiando-se, assim, a desejada restitutio in integrum do estado anterior � viol�ncia perpetrada pelo acusado. Nesse sentido, o pr�prio Art. 24, no seu ainda adormecido Inciso IV, da Lei n. 11.340/2006, assegura � mulher violentada, em desfavor do agressor, a presta��o de cau��o provis�ria, mediante dep�sito judicial, por perdas e danos materiais decorrentes da pr�tica de viol�ncia dom�stica e familiar. Podendo, destarte, no arbitramento do quantum debeatur da presta��o de alimentos provisionais ou provis�rios o Juiz se pautar, tamb�m, pela verba extraordin�ria devida a t�tulo de despesas de tratamento, al�m de algum outro preju�zo que a ofendida prove haver sofrido.

Carlos Eduardo Rios do Amaral � Defensor P�blico do Estado do Esp�rito Santo

Fonte: O Autor
 
Por:  Carlos Eduardo Rios do Amaral    |      Imprimir