Categoria Opinião  Noticia Atualizada em 03-11-2009

OS MUROS QUE ERGUEMOS
Porto Seguro (BA). 1987. Junho. Eu e a rádio-patroa (à época) e um casal amigo. De repente um jovem turista alemão sobe numa mesa e faz um discurso maluco em português, mas com o imperativo sotaque germânico.
OS MUROS QUE ERGUEMOS
Foto: www.maratimba.com

Manoel Manhães [email protected]

Porto Seguro (BA). 1987. Junho. Eu e a rádio-patroa (à época) e um casal amigo. De repente um jovem turista alemão sobe numa mesa e faz um discurso maluco em português, mas com o imperativo sotaque germânico. Findo. Subo eu e sapeco um imaginário discurso em alemão, ou seja, palavras soltas emendadas umas nas outros (Fritz, Rummenigge, Franz, Beckenbauer, Nietzche, Lizt, Hitler, Beethoven, Badeen Meinhof, Helmut Kohl, Konrad Adenauer, Gunter Grass, Willy Brandt, Bayern, Munique, Friederich Hegel, Goethe e tudo que me vinha à mente e tivesse a mais ínfima relação com a Alemanha) e, por fim, propus um brinde erguendo o copo de cerveja e falando um imponente: Shoppenhauer (pra quem não sabe alemão: "-Viva o Chopp!"). O cara gostou e veio até nossa mesa, entabulamos um papo (em português fluente o dele) e começou uma amizade.

Piúma (ES). 1988. Carnaval. Convite feito e aceito. Wolker Lowe (tem um trema encima desse W) se esbaldou (3 namoradas em 5 dias e muita cerveja e churrasco 24 hs).

Cachoeiro (ES). 1988. Março. O meu amigo (daquela ida a Porto Seguro) conta pro prefeito e seu secretário de cultura que minha mãe (pessoa de renome , à época, no meio cultural e educativo da cidade) hospedava em sua casa um jovem jornalista da DER SPIEGEL (a mais importante revista alemã) que viera fazer uma breve reportagem sobre Cachoeiro. 2 dias depois fui convidado a levar o Wolker por um tour (com motorista e carro da prefeitura) pela cidade, para todos efeitos Wolker não falava português e eu seria o intérprete. Ou seja, ele ouvia e entendia as perguntas do prefeito e seus asseclas e eu fingia traduzir (ele me ensinara um jogo de palavras em alemão que combinadas e invertidas daria pra enganar), então Wolker respondia em alemão e eu, sem entender po#&@ nenhuma traduzia como melhor nos conviesse.

Resumo: Sucesso total Wolker tirou fotos e mais fotos com a máquina sem filme (ninguém sabia) e gravou tudo num falso gravador. Tomamos um lauto café da manhã, almoçamos e jantamos por conta da prefeitura e até hoje a revista alemã não publicou nada. OBS. Wolker não era jornalista nem trabalhava em nenhuma revista ou jornal, era estudante de Relações Diplomáticas.

Bonn (Alemanha). 1989. Novembro. Fui visitar minha irmã que mora nos EUA (há 30 anos) e de lá fui visitar Wolker em Bonn. No dia 9 bebíamos umas cervas num dos bares em torno da Praça Potsdamer Platz quando o Muro que separava a Alemanha (em duas, a comunista e a democrata) começou a ruir.

De lá para cá tenho visto outros Muros ruírem, mas, também, outros se erguerem (Trilha sonora: The Wall, Pink Floyd).

Os Muros do Preconceito se erguem quando o governo joga o pobre contra o rico (o trabalhador contra a empresariado), o negro contra o branco (o sistema de cotas, do jeito que está), os sem-terras contra os produtores, quando quer nivelar a todos por baixo, e de tanto vermos os Pucinelis e Requiões da vida manifestarem os preconceitos, que muitos temos escondidos dentro de nós, vamos cimentando esses Muros deixando de nos indignar a cada tijolo colocado até o dia em que estando alto o Muro não mais veremos o rosto do próximo e, por fim, esqueceremos que ele existe, como na Alemanha dividida

Dia 9 comemora-se 20 anos da queda do Muro e 60 anos da Lei Fundamental (a Constituição Alemã). Marquem essa data. Quebrem um Muro. Depois outro. E outro. E outro. Até que não existam mais separações entre você e o próximo.


    Fonte: Redação Maratimba.com
 
Por:  Manoel Manhães    |      Imprimir