Categoria Opinião  Noticia Atualizada em 08-09-2010

NOTA DE FALECIMENTO
Passou despercebido para a grande maioria uma pequena nota que dizia: “Faleceu no último dia 31 o ilustre Sr. Jornal do Brasil (1891-2010)”.
NOTA DE FALECIMENTO

Passou despercebido para a grande maioria uma pequena nota que dizia: "Faleceu no último dia 31 o ilustre Sr. Jornal do Brasil (1891-2010)".

Pois é, o Jornal do Brasil morreu. Morreu e vai deixar saudades, para mim e para tantos quantos com ele conviveram.

Em plena era da internet pode parecer absurdo ter saudade da informação em papel (imprensa), mas o JB, como era carinhosamente chamado, foi parte integrante e fundamental de minha formação.
Lembro-me de, quando ainda criança, espirrar gostoso com o cheiro de tinta fresca que o jornal exalava.

Meu primeiro interesse era nas tiras dos quadrinhos do Henfil e depois por, feliz, imposição de minha avó materna (Dina Manhães, professora de geografia e história natural) lia todo o jornal. Eu só ganhava presentes, nas mais diversas datas, se lesse tudo o que ela – minha avó – recomendasse (jornais e revistas e coleções como O Tesouro da Juventude, Trópicos, Conhecer, Barsa etc.) e assim vieram as bolas de futebol, bicicletas, espingardas de chumbinho, prancha de surf, skate, direito a viagens, barracas de camping etc. Era uma troca justa que, hoje, eu sei, saí ganhando de goleada.

Figuras como Alberto Dines, Zuenir Ventura, Zózimo, Carlos Castelo Branco, Joaquim Ferreira dos Santos, Marcos Sá Correa, Armando Nogueira, João Saldanha, Otto Lara Rezende, Jânio de Freitas, Odylo Costa Filho, Carlinhos de Oliveira e muitos outros que não me lembro, neste exato momento, povoaram meu mundo de idéias, de formação de idéias.

O Jornal do Brasil foi responsável por edições memoráveis da história da imprensa brasileira, principalmente no período da ditadura militar. Ficou famosa sua edição de 14 de dezembro de 1968, sobre o AI-5.
Para burlar a censura imposta pelos militares, publicou na primeira página, uma fictícia previsão do tempo. "Tempo negro. Temperatura sufocante. O ar está irrespirável. O país está sendo varrido por fortes ventos. Máx.: 38º em Brasília. Mín.: 5º, nas Laranjeiras." Na mesma edição, à direita, uma chamada para uma efeméride: "Ontem foi o Dia dos Cegos".

Também ficou famosa a primeira página do dia seguinte ao golpe militar no Chile, em 1973. Para driblar a censura brasileira que proibia manchetes sobre episódio, o JB fez uma edição sem títulos garrafais, nem fotos. Na primeira página, com o lugar da manchete em branco, foi publicado um longo texto sobre a morte de Salvador Allende, emoldurada apenas pelo serviço de classificados.

Minha avó, atenta e deslumbrada, me revelava, também atento e deslumbrado, aquelas artimanhas para se registrar a história.

Como disse Nelson Rodrigues: "-Jovens: envelheçam!", pois só assim sentirão um pouco desse "saudosismo careta" que sinto. E lembrem-se que "Nós não somos velhos, somos jovens há mais tempo".

Vá em paz JB e obrigado por tudo.

Manoel Manhães [email protected]


Fonte: O Autor
 
Por:  Manoel Manhães    |      Imprimir