Categoria Politica  Noticia Atualizada em 19-07-2012

Peru: conflitos sociais põe Humala em xeque e repetem história
No começo do mês, violentos confrontos entre polícia e manifestantes contrários à instalação de uma mina eclodiram em Calendín, na região de Cajamarca, no norte do Peru.
Peru: conflitos sociais põe Humala em xeque e repetem história
Foto: noticias.terra.com

Os confrontos deixaram cinco mortos e resultaram em uma crise política que fez a popularidade do presidente Ollanta Humala cair. E pode respingar em membros do governo, ameaçados de demoção em uma reforma ministerial prevista para o fim de julho.

"Os principais atores no conflito estão ligados ao irredentismo de movimentos sociais contra qualquer prerrogativa do Estado sobre o desenvolvimento econômico quando este degrada o ecossistema local", disse ao Terra o professor Daniel Chaves, pesquisador do Laboratório de Estudos do Tempo Presente da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Antes da violência, protestos contra a instalação da mina de cobre e ouro Conga pela mineradora peruana Yanacochoa, com apoio da americana Newport, já faziam parte da rotina de Cajamarca há oito meses. Oponentes do projeto dizem que a mina irá poluir o ar e mananciais de água, sem sequer trazer dividendos reais à população local.

Humala defende o projeto, orçado em US$ 5 bilhões sob a bandeira de que ele trará milhões para a região em arrecadação de impostos e gerará milhares de empregos. Para impedir que os protestos se tornassem ainda mais violentos, o presidente declarou estado de emergência na região, o que, na prática, restringe a liberdade dos cidadãos e autoriza militares e policiais a cooperaram em ações para restaurar a ordem pública.

Para Marcelo Coutinho, professor de Relações Internacionais da UFRJ e do IUPERJ, o cerne da questão está na descrença das populações locais e dos movimentos sociais em relação à distribuição da riqueza anunciada por projetos desse porte. "É muito difícil que eles aceitem as multinacionais por um histórico de exploração e de repressão", afirma. "É um histórico de longa data no Peru que não vai mudar tão cedo, e muito menos se mantida essa política de repressão e de estado de exceção".

Para ele, Humala vem sofrendo com um cenário quase idêntico ao vivido pelos seus antecessores Alejandro Toledo (2001-2006) e Alan Garcia (2006-2011). "A novela está se repetindo: e presidente começa com muita expectativa, com uma agenda social até mais à esquerda. Uma vez no governo, são mantidas as políticas de abertura comercial, de atração de investimentos internacionais, de uma distribuição desigual da renda", diz Coutinho. "Surgem as revoltas sociais, a elas se seguem a forte repressão, estados de exceção. A popularidade do presidente vai caindo e ele começa a apenas administrar o seu mandato até o final".

Uma pesquisa publicada no jornal peruano El Comercio no domingo, e referente aos dias 11 e 13 de julho, aponta que a popularidade de Humala está em 40%, menor nível desde ele que assumiu o governo, há um ano. Em junho, o índice era de 45% e, em maio, 50%. Ao término do primeiro ano de seus mandatos, Garcia tinha 32% de aprovação e Toledo 18%.

Caso de sucesso
Para o professor Marcelo Coutinho, as dissonâncias entre a população peruana e seus presidentes ocorrem apesar de o país ser um caso de sucesso recente em termos econômicos. "Humala assumiu o Peru como um dos países da região que mais vinha crescendo nos últimos oito anos, a uma média de 6%, 7% ao ano", diz, salientando que as taxas de crescimento são ainda mais expressivas se considerado o cenário de crise econômica mundial. "A expectativa era de que ele distribuísse melhor os recursos oriundos do comércio de bens primários. Ele lançou alguns programas, mas ainda aquém das demandas sociais".

Onde Humala e seus antecessores falharam, surge a oportunidade para que líderes de movimentos sociais adotem a causa e lhe deem contornos políticos contra a exploração estrangeira. "Lideranças dos movimentos sociais mais à esquerda, algumas delas mais socialistas, acabam adotando um oportunismo político face a essas insatisfações sociais", diz Marcelo Coutinho.

Uma das principais lideranças a emergir dos protestos é o ex-sacerdote Marco Arana, do movimento Tierra y Libertad, que foi preso durante a repressão às manifestações. Ele acusa a polícia de tê-lo agredido. Para o governo, Arana anseia se tornar um mártir e fazer do conflito um marco inicial de sua candidatura à presidência. Segundo Daniel Chaves, Arana se insere em um perfil que se repete em outros conflitos latino-americanos. "Lideranças carismáticas locais, de comunidade, bairro ou associação, por muitas vezes eclesiásticas ou religiosas, tomam a frente já que os sindicatos por vezes têm compromissos setoriais", diz.

Causa ambiental
Para Chaves, o conflito em Cajamarca faz parde de uma "busca por qualidade de vida e preservação do meio em ambiente" e seria uma tendência crescente de mobilização social na América Latina. Para ele, é possível traçar um paralelo entre o impasse peruano e conflitos indígenas como se verificam na Bolívia, onde os chamados povos originais se manifestam contra a construção de uma rodovia em uma área florestal, e a questão de Belo Monte, no Brasil. "É preciso ter clareza que as agendas são contrárias ao desenvolvimento econômico baseado no velho industrialismo, poluente e degradador, mesmo com todos os problemas que essa negação ao desenvolvimento gera", diz Chaves.

Ele ressalta a dificuldade entre a necessidade de frear a degradação ambiental e tornar as economias mais verdes e a manutenção do desenvolvimento. "Estamos destruindo nosso ambiente e as futuras gerações terão um mundo muito pior pela frente. Isso não é balela ou mentira das organizações ambientais", diz Chaves.

Dentro desse cenário, a situação do Peru segue em um impasse. O governo tendo convocoo as partes envolvidas para dialogar e a violência arrefeceu. Mas o estado de exceção ainda não foi levantado e novas manifestações seguem acontecendo.

Sombra paraguaia
Para o professor Marcelo Coutinho, guardadas às características nacionais, o contexto político no Peru tem o potencial de ser "contagiado" pela crise política que resultou no impeachment de Fernando Lugo, no Paraguai. Segundo ele, o caso de Humala se torna mais delicado se ele adotar uma postura "mais à esquerda" para resolver as questões sociais em seu país.

"Não é difícil pensar que uma maioria no Parlamento possa abrir uma frente para destituir Humala em um contexto de desordem social, de crise, de grande impopularidade do presidente", diz Coutinho. "Neste caso, ele vai ter duas opções: radicalizar à esquerda, aprofundando às divisões no país, ou se aproximar ainda mais dessa agenda mais liberal, mais à direita, e vai conseguir terminar o seu mandato, mas sem grande apoio da população".

Fonte: noticias.terra.com
 
Por:  Maratimba.com    |      Imprimir