Categoria Opinião  Noticia Atualizada em 23-02-2013

BICHO DE PÉ
Mas aí, eu e o Estevão ficamos nos lembrando de coisas boas da infância no interior, do pé no chão.
BICHO DE PÉ

Dia desses um amigo, o Estevão, perguntou-me se eu tinha saudades do bicho de pé e antes que eu respondesse que o Viagra não me deixava esquecer ele me adiantou que se tratava daquela pulguinha que entrava no pé da gente, fazia uma inflamação e dava uma coceira gostosa.

A coceira era tão gostosa que acho que antes da descoberta da masturbação na infância e do "transar" na adolescência e fase adulta não tinha coisa melhor, era um verdadeiro orgasmo!

E tirar o bicho? Agulha esquentada no fogão, lavada no álcool e pronto! Perfurava-se aquela bolinha a ponto de expelir o pontinho preto. Era como fazer um gol!
Mas aí, eu e o Estevão ficamos nos lembrando de coisas boas da infância no interior, do pé no chão.

Chuva era sinônimo de diversão! Andar de bicicleta sentindo a chuva bater forte no rosto, brincar na enxurrada – correndo na água ou soltando barquinhos de papel e até navegando de bóia feita de câmara de ar de pneu de carro.

Quem foi criança nos anos 60 e 70, sabia o que era brincar! Nada contra os brinquedos modernos, mas éramos mais lúdicos, mais inventivos até mesmo por necessidade, por falta de opção. Hoje os brinquedos fazem tudo sozinhos.

Era tudo muito simples – latinhas, pneus velhos, jornais, folhas usadas de caderno – e brincadeiras aconteciam.

Uma latinha com água, um talo de mamona ou de mamoeiro (ou pedaço de mangueira de jardim) e sabão em pó. Pronto! Era só enfiar o canudo na água ensaboada e soprar. Dezenas de bolinhas transparentes bailavam no ar até estourar.
Naquela época era simples fazer uma criança feliz!

Tudo se transformava em brinquedo ou brincadeira, graças a nossa criatividade. Diversão garantida por um longo período.

Foi bom lembrar isso tudo não com melancolia, mas com aquele sabor de nostalgia, de saudade. Sem lamentar a idade, há até que agradecer-se por chegar até aqui depois de pegar carona em traseira de caminhão ou vagão de trem, depois de descer de bicicleta morro abaixo sem segurar o guidão, descer morro abaixo rolando dentro de um pneu velho, nadar no rio ou mar sem bóia ou salva-vidas, andar a cavalo em arreio ou freio, no pelo.

Tive muitos amigos, brincávamos juntos (meninas e meninos), brigávamos muito (meia hora depois, ficávamos "de bem"), dividíamos brinquedos e guloseimas. Tive apelidos, coloquei apelidos e, tudo bem. Não se conhecia a palavra bullying e essas perseguições vergonhosas ainda não era coisa que traumatizava tanto.

Ralei joelho, arranquei a tampa do dedão, furei o pé com prego enferrujado, quebrei braço, perna, costela, dente, briguei na rua, toquei campainha e saí correndo, roubei jabuticabas no caminho da escola, fiquei de castigo, apanhei de chinelo, de cinto, de vara.

Brinquei de pega-pega, estilingue, pião, esconde-esconde, cobra-cega, pula-sela, cama-de-gato, policia e ladrão, pular corda, bolinha de gude, subi em árvore, cacei rã e preá.

Brinquei na terra, no barro, na lama, na areia, peguei peixinho e girino no rio, joguei chinelo na fiação elétrica, fiz barquinho e avião de papel. Joguei futebol. Troquei gato e cachorro de rua por entrada no circo (só depois descobri que viravam comida de leões e tigres).

Corri atrás do carrinho de algodão-doce, sorveteiro e do homem do quebra-queixo.

Tomei banho de mangueira, de bacia e no tanque de lavar roupa.
Meus machucados foram curados com Merthiolate – que ardia muito, Sulfanilamida (o pozinho milagroso que criava casquinha no machucado), Mercúrio-cromo (que tingia a pele), Violeta, Água Oxigenada (era legal ver a espuminha borbulhando), Iodo, salmoura.

Não usava band-aid, os ferimentos eram cobertos ou amarrados com tiras de pano ou com esparadrapo.

Tomei Óleo de Fígado de Bacalhau, Biotônico Fontoura e outros remédios horríveis.
Isso sim, acho que, era infância! Sem essas armadilhas e maravilhas tecnológicas que prendem as crianças em frente a TV, ao computador ou vídeo game. Aliás, assistia pouca TV. Quando assistia era Túnel do Tempo, Viagem ao fundo do mar, Perdidos no espaço e tomeTubaína!

Muita coisa boa a lembrar, amigo Estevão, mas o bicho de pé ...

Fonte: O Autor
 
Por:  Manoel Manhães    |      Imprimir