Uma vez por semana, o caminhoneiro Ronaldo Benedito Miguel, 42 anos, dirige mais de mil quil�metros do Centro Oeste at� o porto de Santos, no litoral de S�o Paulo, com seu ve�culo bitrem carregado de 38 toneladas de soja.
Foto: noticias.terra.com.br Ele vai e volta do campo ao litoral h� mais de 20 anos, mas diz nunca ter enfrentado viagens t�o longas e estressantes.
"Est� pior do que todos os anos. Voc� chega ao p�tio (de caminh�es) em Cubat�o, a� eles te liberam (para seguir at� o porto) e voc� fica 24 horas puxando fila no acostamento. Sem comida, sem banheiro, sem nada. � merc� dos ladr�es e dos noias (drogados) pedindo dinheiro."
O drama dos milhares de caminhoneiros que tentam descarregar suas mercadorias no porto de Santos voltou a se agravar, com filas de at� 12 quil�metros registradas nesta semana. Na manh� desta quarta-feira, segundo a Ecovias, a via Anchieta estava congestionada entre os quil�metros 58 e 64, por conta das dificuldades dos caminh�es em acessar os terminais portu�rios.
Em mar�o, as filas de caminh�es para chegar aos terminais alcan�aram 30 quil�metros, enquanto os navios esperavam semanas no mar at� chegar sua vez de atracar.
Safra recorde e falta de estrutura
Com safras recordes de soja e milho previstas para este ano, o Brasil refor�a sua voca��o para pot�ncia agr�cola e pode ultrapassar os Estados Unidos pela primeira vez como maior produtor de soja no mundo.
Mas os problemas para escoar essa safra exp�em os gargalos estruturais do Pa�s, que incluem insufici�ncia de armaz�ns, problemas nas estradas, falta de alternativas ao transporte rodovi�rio e, na reta final, travas nos portos.
"A produ��o (agr�cola) est� crescendo muito r�pido, mas a infraestrutura n�o reage com a mesma velocidade. � algo pregui�oso", diz Sergio Mendes, diretor da Associa��o Nacional de Exportadores de Cereais (Anec).
Ele afirma que a produ��o brasileira de soja quase triplicou do ano 2.000 para c�, devendo chegar a 83 milh�es de toneladas neste ano. Metade vai para exporta��o e um ter�o da soja que sai do Pa�s passa por Santos.
De acordo com a Companhia Docas do Estado de S�o Paulo, a Codesp, um quarto da balan�a comercial do Brasil passa pelo Porto de Santos, o maior do Pa�s em termos do valor de mercadorias movimentadas.
O porto triplicou sua capacidade nos �ltimos vinte anos, e hoje movimenta 105 milh�es de toneladas de bens a cada ano - n�o apenas gr�os, mas tamb�m a��car, cont�ineres, carros e combust�vel.
Em uma visita ao porto de Santos, por�m, n�o � dif�cil identificar problemas que parecem incompat�veis com tamanha import�ncia. Saindo de S�o Paulo, basta optar pela rodovia Anchieta, a mesma usada pelos caminh�es, para ter uma dimens�o do volume dos engarrafamentos, que come�am de madrugada.
Na altura de Cubat�o, a 20 quil�metros do porto, a maioria dos caminh�es que transporta soja estaciona em p�tios para aguardar a libera��o at� que possa seguir at� o porto para descarregar, em uma tentativa coordenar a ordem de chegada.
Mas isso n�o tem evitado o n� no acesso aos terminais. "No fim de mar�o, eles mandavam a gente sair do p�tio e a� fic�vamos 20 horas no tr�nsito para percorrer esse trecho pequeno e chegar at� o porto", diz o caminhoneiro Edson Carvalho, lembrando a pior semana at� agora, logo antes da Semana Santa.
Presos no tr�nsito, os caminhoneiros reclamam da inseguran�a e da falta de op��es para comer ou sequer ir ao banheiro. Wagner Oliveira diz que chegou a ficar 30 horas sem poder dormir.
"Ficar na rodovia � perigoso. Vem a molecada, a gente tem que dar dinheiro para n�o ser roubado. Fiquei 30 horas na fila, sem tomar banho, sem comer direito, passando sono", disse.
Na reta final antes dos terminais de gr�os, os caminh�es se afunilam para entrar na Rua do Adubo, conhecida por todos como o ponto mais problem�tico no acesso ao porto. � uma rua estreita e empoeirada, de m�o dupla, e os caminh�es avan�am um a um."O produtor n�o tem armaz�ns suficientes para mandar a soja pouco e a pouco e os nossos caminh�es acabam sendo usados como armaz�ns, parados na estrada", queixa-se o caminhoneiro Ronaldo Benedito Miguel.
No fim da rua, um �ltimo obst�culo: uma ferrovia corta o caminho e trens de carga passam sem hora certa, fazendo o tr�nsito parar - e os caminhoneiros esperarem mais.
Renato Barco, presidente da Codesp, diz que os congestionamentos se agravaram por causa da sobreposi��o das safras de soja e de milho e pioraram por causa chuvas, que impossibilitam o carregamento dos navios.
"� sem d�vida o pior congestionamento que j� tivemos. A supersafra demonstra problemas conjunturais que existem hoje no Pa�s com rela��o � infraestrutura. O problema vai desde o produtor, que n�o tem local onde armazenar o seu produto, at� a chegada ao Porto de Santos, que vem de uma forma desordenada, causando congestionamento n�o apenas aqui, mas tamb�m em outros portos brasileiros."
Investimentos
Barco diz que a situa��o atual reflete anos de car�ncia de investimentos em infraestrutura, mas destaca que US$ 3,5 bilh�es est�o sendo investidos no porto at� 2015.
Estradas e viadutos ser�o constru�dos para melhorar o acesso ao porto - ao fim da Rua do Adubo, por exemplo, um viaduto a ser entregue nos pr�ximos meses vai evitar que os caminh�es precisem interromper o trajeto na linha do trem, passando por cima da ferrovia.
Barco alerta, por�m, que embora medidas estejam sendo tomadas para remediar a situa��o, a melhora n�o se dar� de um dia para o outro - e neste ano a situa��o ainda pode se agravar com a entrada da safra do a��car, nos pr�ximos meses.
"� no meio de uma crise que se buscam as grandes solu��es. Mas as grandes solu��es n�o v�m no curto prazo", diz Barco. Em dezembro, a presidente Dilma Rousseff anunciou um pacote que prev� investimentos de R$ 54,2 bilh�es at� 2017 para modernizar o setor portu�rio brasileiro. Os investimentos est�o vinculados � chamada MP dos Portos, aprovada por uma comiss�o mista do Congresso nesta quarta-feira e que deve ir a plen�rio at� 16 de maio.
"O governo brasileiro est� correndo contra o tempo", diz Barco. "Precisamos investir em estradas e ferrovias." Para dar vaz�o � produ��o agr�cola do Pa�s, especialistas concordam que � preciso modernizar os sistemas de transporte.
Em vez de usar caminh�es para fazer a longa viagem do Centro-Oeste at� o Porto de Santos, Sergio Mendes, da Anec, diz que o Pa�s deveria investir em hidrovias e escoar seus gr�os pelo Norte do pa�s. Mendes afirma que o Brasil perde em competitividade para os Estados Unidos e Argentina por causa dos altos custos log�sticos.
"Quando voc� usa o caminh�o, voc� est� gastando cinco vezes mais do que se usasse a navega��o fluvial. � muito." A Anec estima que os produtores brasileiros estejam perdendo US$ 4 bilh�es por ano por causa do alto custo para escoar seus gr�os.
"O Pa�s precisa se modernizar e essa � uma press�o que o produtor tem que exercer sobre o governo, para que ele possa por esse dinheiro no bolso", diz Mendes.
Fonte: noticias.terra.com.br
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