Categoria Geral  Noticia Atualizada em 13-06-2014

Após um ano, polícia identifica 700 suspeitos de violência em atos em SP
Deic ainda investiga 70 pessoas suspeitas de comandarem os "black blocs". Casos de vandalismo estão em inquérito sobre formação de quadrilha.
Após um ano, polícia identifica 700 suspeitos de violência em atos em SP
Foto: g1.globo.com

Passado um ano do início da onda de protestos que tomou conta das ruas do país em junho de 2013, a Polícia Civil de São Paulo identificou cerca de 700 pessoas suspeitas de envolvimento em atos violentos durante as manifestações no estado. De acordo com o Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), aproximadamente 70 manifestantes são investigados como supostos "líderes" dos "black blocs", grupo que se autodenomina anarquista e prega a desobediência civil nas redes sociais.

Os casos de vandalismo registrados nas manifestações paulistas integram um único inquérito. Nesta apuração, a polícia tenta confirmar se os investigados cometeram o crime de "formação de quadrilha armada". Os suspeitos que forem apontados como lideranças do "Black Bloc" nos protestos serão indiciados e poderão até ser presos por esse crime. Em caso de condenação, a pena pode chegar a oito anos de reclusão.

O objetivo da Polícia Civil com essa investigação é associar adeptos da tática Black Bloc, que consiste em protestar usando a depredação, com "organização criminosa". "Os black blocs se reúnem e agem como organização criminosa", justificou ao G1 o diretor do Deic, delegado Wagner Giudice.

Os investigados foram detidos durante atos violentos ou acabaram chamados ao departamento porque teriam convocado os protestos pela internet. Eles foram liberados após serem fotografados e prestarem depoimentos na sede do Deic, na zona norte da capital paulista. Até a última atualização desta reportagem, nenhum suspeito de liderar o grupo havia sido indiciado e preso por formação de quadrilha.

Questionado pelo G1 sobre quando o Deic irá concluir o inquérito, Giudice respondeu que não há um prazo determinado para isso. "O que posso falar é que, eventualmente, os suspeitos continuam sendo chamados para prestarem esclarecimentos".
O inquérito conduzido pelo Deic conta ainda com o assessoramento da Polícia Militar e do Ministério Público. As duas instituições integram uma força-tarefa que foi criada após ter sido deflagrada a onda de protestos de junho de 2013. O objetivo do trabalho cojunto é coibir, deter, identificar e responsabilizar vândalos que atuaram em manifestações violentas.

Do ano passado para cá, estão sendo compilados todos os boletins de ocorrência envolvendo os protestos e registrados em diversos distritos policiais. O Deic ainda recebeu dados de pessoas averiguadas e liberadas pela PM nos atos. De posse desse material, o departamento centralizou a apuração e passou a intimar os suspeitos para serem ouvidos.

"Perseguição política"

Membros de movimentos populares que participam das manifestações criticam o Deic por convocar manifestantes para depor justamente nos dias e horários em que os atos são marcados pela web.

Nesta quinta-feira (12), por exemplo, o departamento foi a casa de 11 suspeitos para cumprir mandados de busca e apreensão autorizados pela Justiça. Mais de cem policiais participaram a operação, que apreendeu computadores, pendrives, celulares, cadernos, sprays, latas de tintas, manuais de como agir em manifestações, jornais, panfletos, soco inglês, nunchaku, estilingues e máscaras. Duas mulheres foram encaminhadas ao Deic para prestar esclarecimentos e acabaram liberadas.

Antes dessa ação, no dia 30 de maio, integrantes do Movimento Passe Livre (MPL) se acorrentaram nos portões da Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP) para protestar contra o que chamam de perseguição política por parte da polícia.
Os integrantes do movimento queriam falar com o secretário da pasta, Fernando Grella Vieira, para pedir que o Deic pare de intimar os manifestantes. Além disso, o MPL acusa as forças de segurança de enviarem policiais às casas de seus integrantes para obrigá-los a depor.

Alegando outros compromissos, o secretário não recebeu os ativistas. Procurada pelo G1, a assessoria de imprensa da pasta informou que respeita o direito à livre manifestação pacífica, mas que inquérito do Deic não é ilegal e "está correndo dentro da lei".

Lideranças

Segundo Giudice, em um ano de investigações sobre a violência nos protestos, o Deic listou pouco mais de 700 potenciais black blocs. "São pessoas que atendem aos chamados das convocações e vão aos atos com a intenção de quebrar e estão respondendo por danos ao patrimônio público e privado", disse.

Dentro desse grupo identificado como violento, a investigação pinçou 70 pessoas apontadas como responsáveis por comandar, organizar, convocar e arregimentar homens, mulheres e adolescentes para o quebra-quebra.

"São entre 60 a 70 organizadores dos black blocs em São Paulo", disse Giudice, que pediu a Justiça a quebra dos sigilos de páginas do Facebook e celulares dos suspeitos. "Eles usam a internet e telefones para liderarem, comandarem e organizarem essas manifestações".

Na opinião do diretor, o objetivo da investigação não é o de inibir as manifestações pacíficas, mas, sim, os atos violentos. Ele argumentou que quando ativistas mascarados se reúnem, há depredação, que é crime. "Aqueles que depredam, se organizam, convocam pessoas e saem para quebrar podem ser enquadrados na formação de quadrilha".

Junto com os manifestantes detidos, foram encontrados pedras, paus, estilingues com bolinhas de gude e coquetel molotov. "Um manifestante pacífico não vai protestar armado assim", ressaltou Giudice.

Polícia Militar

Além dos manifestantes, a Polícia Militar também se tornou protagonista da série de protestos que se multiplicou pelo país no último ano. Neste período, houve inúmeras denúncias de que policiais militares agiram com truculência e estavam despreparados para fazer a segurança nos protestos.
Dois inquéritos foram instaurados na Corregedoria da PM para apurar denúncias de desvio de conduta policial e abuso nos confrontos nas manifestações. Um apurava responsabilizar e identificar policiais que feriram ativistas. Outro investigava quem eram os policiais que agrediram jornalistas.

Nos dois procedimentos, havia relatos de vítimas de balas de borracha – munição considerada não letal que, dependendo de onde atinge, pode deixar lesões irrecuperáveis. Um fotógrafo, por exemplo, ficou cego.

Um ano depois do início dos protestos, nenhum policial militar investigado por abuso em confrontos com manifestantes foi punido administrativamente, segundo confirmou nesta sexta-feira (6) o comandante da PM, coronel Benedito Roberto Meira.
"Temos dois inquéritos em andamento na PM. Um de jornalistas atingidos por bala de borracha, outro de pessoas atingidas. Um deles está em diligência. E o outro foi entregue à Justiça Militar", informou Meira. "Por enquanto não tive informações de policiais que foram punidos", complementou.

De acordo com o comandante, uma das dificuldades encontradas nos inquéritos foi identificar o policial que poderia ter se excedido nos atos. "Muitas vítimas não compareceram as audiências para fazer reconhecimento", justificou.

Antes de a equipe de reportagem falar com o coronel, a PM havia divulgado nota para o G1 informando que "a Policia Militar esclarece que todos os relatos de eventuais abusos foram e estão sendo investigados por meio de Inquérito Policial Militar (IPM)."

Defensoria Pública

Em março deste ano, a PM utilizou pela primeira vez a "Tropa de Braço" para coibir atos violentos. O efetivo especializado foi às ruas de São Paulo durante protesto contra os gastos públicos com a Copa do Mundo. Policiais que lutam jiu-jítsu ficaram de sobreaviso. Mais de 2,3 mil PMs acompanharam a manifestação.

A medida foi criticada por especialistas em direitos humanos porque restringia o cidadão de se manifestar. "Temos estados presentes para tirar nossas próprias conclusões olhando a atuação da PM e dos manifestantes. O estudo mostra o risco de usar bala de borracha em protestos", disse ao G1 o defensor público Carlos Weis.
De acordo com ele, a Defensoria Pública de São Paulo impetrou na Justiça uma ação civil pública em abril deste ano para processar o governo paulista por danos morais coletivos causados pela suposta repressão da Polícia Militar em protestos na capital, entre 2011 e 2013.

A ação civil pública pede o pagamento de R$ 8 milhões para um fundo de direito de difusos. Deste montante, R$ 1 milhão corresponderia à indenização por uso desproporcional de força policial nas manifestações "com extrema violência física e psíquica". Até esta sexta-feira (13), a Justiça ainda não havia analisado o pedido.

Na mesma ação judicial, os autores solicitam que a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo apresente à sociedade uma cartilha que oriente como a PM deve agir em manifestações. O documento recomenda, por exemplo, que armas com balas de borracha só sejam usadas como último recurso, se o policial precisar se defender.

"Recomendamos à SSP que fosse reduzido esse armamento [balas de borracha] e fossem criadas regras de utilização. Que disparos não fossem feitos a esmo e só usados na ameaça à integridade física do policial militar", disse o defensor.
"E se fossem disparados, que mirassem da cintura para baixo, evitar a cabeça porque tem jornalistas e manifestantes que se feriram nos olhos", destacou Carlos Weis.
Caso haja situação de violência ou vandalismo do manifestante, que a reação da PM se concentre nele e não nos outros manifestantes, continuou o defensor. Ele entende que falta orientação melhor ao policial de como agir nos atos.

"A PM deve agir apenas nos focos de violência da manifestação e preservar a manifestação pacífica", observou Weis. "Precisa parar de reagir de maneira violenta e desproporcional, ferindo o direito de manifestação de quem está lá pacificamente".
O defensor sugere, por exemplo, o uso de um megafone pela corporação. "A PM não utiliza o diálogo com manifestantes. Antes de atirar, deveria dar um aviso, usar um megafone alertando sobre os limites que estão tolerando."

Questionado sobre as declarações de Weis, o coronel Benedito Roberto Meira respondeu que o que falta é a Justiça cobrar a regulamentação das manifestações em São Paulo.
"A PM está fazendo seu papel", disse o coronel. "Estamos preparados para acompanhar, garantir a manifestação e não impedir o direito de ir e vir no estádio. O que precisa é regulamentar a manifestação", enfatizou.

Fonte: g1.globo.com
 
Por:  Maratimba.com    |      Imprimir