Categoria Geral  Noticia Atualizada em 16-07-2014

"Meu plano é sobreviver", diz migrante ganês em Caxias do Sul, RS
Jovem de 19 anos chegou à cidade há uma semana e busca trabalho. Cerca de 100 africanos estão alojados em seminário do município.

Foto: g1.globo.com

A esperança de conseguir um emprego e ganhar dinheiro para enviar às famílias em Gana, na África, é o que incentiva os estrangeiros a buscarem uma nova vida no Brasil. Dos mais de 300 que chegaram a Caxias do Sul, na Região da Serra do Rio Grande do Sul, a cerca de 120 km da capital Porto Alegre, nas últimas duas semanas, muitos pretendem ficar no país e trazer a família depois de se estabeleceram.

O jovem Hardi, de 19 anos, é um desses casos. Ele deixou os pais para sustentá-los à distância. Na casa em que vivia com a família, no interior de Tamale, no Norte de Gana, o pai e a mãe cuidam de animais de uma propriedade vizinha, mas o dinheiro é pouco. "Não temos dinheiro para comer. Ninguém tem emprego lá. O meu plano é sobreviver", contou ao G1, pedindo para que seu sobrenome não fosse divulgado.

Segundo as autoridades, promessas de emprego, facilidades para conseguir o protocolo de refugiado e uma rede de assistência aos imigrantes são os principais atrativos de Caxias do Sul para os ganeses que desembarcam em busca de uma nova vida no Brasil. A rapidez na emissão do protocolo de refúgio na cidade da Serra atrai imigrantes de vários estados do país, como Santa Catarina, São Paulo e Minas Gerais. Muitos chegam apenas para buscar o documento, sem interesse em permanecer na cidade. Entretanto, com o aumento da demanda registrada, a PF passou a limitar o atendimento de imigrantes a 20 pedidos por dia desde a sexta-feira (11).

Aproveitando o apelo da Copa do Mundo, os estrangeiros entraram no país com vistos de turista, válidos por 90 dias e concedidos pela embaixada brasileira em Acra, capital de Gana. Com o protocolo de asilo, eles podem permanecer legalmente no país até que o pedido seja analisado pelo Comitê Nacional para Refugiados (Conare), vinculado ao Ministério da Justiça.

Da mesma forma que Hardi, um açougueiro de 40 anos, que não quis se identificar, contou que deixou Acra, capital de Gana, também para sustentar a família. "Tenho três filhos e uma esposa, preciso de dinheiro para dar comida a eles", afirmou.

O ganês diz ser o líder da família e que por isso tem de fazer o impossível para que os filhos e a mulher tenham uma vida digna. Ele é pai de crianças de 13,10 e oito anos. "Prefiro não falar. Senão, vou começar a chorar", revelou emocionado. O ganês, que chegou há dois dias no município gaúcho, espera aprender português para conseguir um emprego.
Já o jovem Abdul Rahman Musah, de 20 anos, pretende sustentar a mãe, o padrasto e o irmão pequeno com quem viva em Acra. O jovem juntou as economias de toda família para enfrentar esse novo desafio. Segundo ele, o total de despesas para chegar ao país, incluindo o visto, saiu por US$ 2,1 mil.

"Minha mãe comprou roupas para mim com o dinheiro que tinha. Agora, quero trabalhar, quero mandar dinheiro para a minha família", disse o jovem, que trabalhava como motorista em seu país.

Abdul chegou a Criciúma, em Santa Catarina, há duas semanas e no Rio Grande do Sul há cinco dias. Ele explica que o protocolo para permanência é mais rápido na cidade gaúcha, mas por outro lado o salário vem mais rápido em Santa Catarina. "Lá eu preciso trabalhar cinco dias e já ganhar um dinheiro, aqui são cerca de 20 dias", revelou.
Sobre o Brasil, ele afirma estar encantado. "O povo é muito legal. O de Gana também. O problema lá é a economia", disse. A única surpresa do jovem foi o clima do Rio Grande do Sul. "Nunca pensei que fizesse frio no Brasil", completou.

Redes de solidariedade

Dos ganeses que chegaram a Caxias do Sul, cerca de 100 estão alojados no Seminário Nossa Senhora Aparecida. Mantidos por doações de moradores, eles comem e dormem no local. O reitor do seminário, Padre Edmundo José Marcon, afirma que os ganeses passam um período ali e depois seguem o próprio rumo.
"Eles chegam aqui, mas não podemos acolher a todos. São orientados que o seminário é apenas um local de passagem, uma estadia provisória. Enquanto estão aqui, providenciamos o lugar para ficarem e também a alimentação", explicou o padre.

A escolha da cidade serrana, para o pároco, se deve pelo histórico de abrigo. Desde 2012 o local recebe imigrantes, principalmente senegaleses e haitianos que chegaram há três anos.
"Tem a questão da Polícia Federal, que agiliza o protocolo para que eles consigam visto de trabalho", completou.

O padre relata que muitos ganeses deixaram a família e os filhos e chegam somente com a roupa do corpo. "A gente sabe como é a situação da África. Não tem muita perspectiva de vida para grande parte da população. Eles veem no Brasil perspectiva, esperança maior, dignidade para as suas vidas. Querem trabalho, emprego", completou.

Número incerto

De acordo com informações do Ministério das Relações Exteriores, foram emitidos para o período da Copa 8.767 vistos a ganenses. Entretanto, nem todas as autorizações de entrada no Brasil foram efetivamente utilizadas. O Departamento de Polícia Federal confirmou que, daquele total, 2.529 nacionais ganenses fizeram uso dos vistos e efetivamente entraram no país e 1.397 deixaram o território brasileiro até o momento.
Permanecem no Território Nacional, com visto válido, cerca de 1.132 pessoas. De acordo com o Ministério da Justiça, até esta quarta-feira (16), ocorreram aproximadamente 180 solicitações de refúgio.

Na terça-feira (15), o Centro de Atendimento ao Migrante (CAM) contabilizou 110 ganeses dormindo no Seminário Nossa Senhora Aparecida, que acolhe os ganeses em Caxias do Sul. De acordo com a entidade, o número de novos imigrantes que chegaram à cidade da Serra apenas naquele dia foi de 26. A expectativa é que na tarde desta quarta-feira (16) mais imigrantes cheguem à cidade.

O CAM afirma também que o balanço sobre a quantidade de imigrantes que pretendem se instalar na cidade ainda é incerto, já que muitos que conseguiram o protocolo de refúgio foram para outras cidades do estado, onde a emissão da carteira de trabalho está sendo mais rápida.

Fonte: g1.globo.com
 
Por:  Emella Simões    |      Imprimir