Categoria Geral  Noticia Atualizada em 09-08-2014

Cego após três tiros na cabeça realiza sonho da namorada
Rapaz foi baleado em tentativa de assalto no SIA, há um ano e meio. Ex-garçom se tornou atleta e diz pretender disputar as Paralimpíadas.
Cego após três tiros na cabeça realiza sonho da namorada
Foto:g1.globo.com

Menos de um ano e meio depois de levar três tiros na cabeça e perder a visão, Fabiano Cesário de Santana, de 24 anos, morador de Vicente Pires, no Distrito Federal, vai se casar neste sábado (9) com a namorada Jacirene Santos, de 28 anos. A cerimônia será realizada durante o casamento coletivo do Maior São João do Cerrado, no Forrobódromo de Ceilândia.
O casal se conheceu em 2011, no restaurante em que trabalhava. Ele era garçom e Jacirene, auxiliar de saladeira. Ela havia terminado um relacionamento havia pouco tempo e estava grávida, mas eles começaram o namoro mesmo assim.
Dias depois do nascimento da criança, Santana se mudou para a casa da namorada, assumiu a paternidade de Izabely e registrou a criança no cartório como sendo dele.
Um ano depois, Santana foi baleado às margens da EPTG, durante uma tentativa de assalto. Ele falava com Jacirene ao telefone enquanto pedalava ao sair do trabalho, no Setor de Cargas do SIA, quando um homem apareceu e o derrubou da bicicleta.
"Eu estava com o fone de ouvido, então não entendi nada. De repente um cara pulou a cerca e me derrubou. Como não entendi, reagi e entrei em luta corporal com ele", lembra. "Estávamos em frente a uma igreja e, de repente, ele tirou uma arma da cintura. Fui para pegar, mas não consegui. Quando corri, ele deu o primeiro tiro. Já caído, ele deu mais dois tiros. Levantei, pedi socorro para o pessoal da igreja e ele deu mais um tiro, mas esse acertou o portão ou a parede."

Três tiros acertaram a cabeça de Santana. Bastante ensanguentado, mas consciente, ele conseguiu pedir para uma pessoa ligar para Jacirene. Desesperada, a namorada correu para o local do crime, junto com o cunhado.
A polícia, porém, não permitiu que eles se aproximassem de Santana, para não danificar provas do crime. Muito nervoso, o irmão de Santana chegou a ser detido por desacato. Jacirene conseguiu se aproximar do namorado depois de prometer que não tocaria em nada.
Ela o encontrou sentado na calçada, à espera de socorro médico, com um pano no rosto. "Pedi à polícia pelo amor de Deus. Disse que só queria dizer para ele que eu estava ali pertinho. Só me deixaram dar a mão para ele."
O garçom perdeu a visão logo no primeiro tiro, que atingiu o nervo ótico. Os outros disparos acertaram a parte de cima da orelha e pouco acima do cérebro. Ele foi encaminhado para o hospital, passou por cirurgia e pouco tempo depois recebeu alta. O homem que atirou nele nunca foi identificado.

"Eu pensei muito que eu ia morrer", diz Santana. "Como foi um tiro na cabeça, eu sentia o sangue quente escorrendo no corpo e pensava: "meu Deus do céu, agora vou morrer, sangrando desse jeito". Mas não me desesperei."
Depressão
A volta para casa não foi fácil. Jacirene conta que o companheiro se fechou no quarto e entrou em depressão. "Ele ficou um tempo só, não queria tomar banho, não queria comer. Fingia que estava dormindo quando eu chegava do trabalho para não falar com ninguém", diz. "Ele falava que era melhor ter morrido do que ficar naquela situação, dependendo de todo mundo."
Foi uma senhora cega que um parente da família auxiliou a atravessar a rua que ajudou Santana a sair da depressão. Ela contou a ele sobre um projeto que ensinava e levava deficientes visuais a andar de bicicleta.
Relutante, o ex-garçom aceitou conhecer o grupo, superou o trauma do roubo e passou a pedalar com um condutor à frente. A mudança foi imediata e, pouco tempo depois, Santana já estava participando de competições e ganhou até uma medalha.
"Foi aí ele que aceitou a fisioterapia", lembra Jacirene. "A boca dele abria pouco, já que o tiro no rosto afetou toda a musculatura. Ele aceitou fazer as consultas com a psicológa, saiu do estado de depressão, começou a ser o Fabiano de volta. Ele estava desanimado para a vida, não queria de jeito nenhum."
O comportamento em casa também mudou e Santana voltou a assumir os cuidados com a filha pequena. É ele quem dá banho, veste e penteia Izabely. Segundo Jacirene, a menina de quase 3 anos já entende que o pai não enxerga.

"Ela veste a roupinha nova e pega a mão dele, passa na roupa dela e diz "olha pai, como minha roupa é linda" Ela pega na mão dele para ajudar ele. Ela é totalmente apaixonada por ele. A primeira coisa que ela faz quando chega em casa é procurar ele. Ela já corre para dentro da casa, procurando ele em todos os cômodos", diz.

Agora atleta, Santana diz que sonha em representar o Brasil e os deficientes visuais nas Paralimpíadas no judô. Ele também quer aprender a andar sozinho nas ruas, já que ainda depende de amigos e familiares para se deslocar, e quer aprender a ler em Braille para voltar a estudar.
"Bola para frente, passou. Eu pedalo agora, já participei de competições, ganhei em primeiro lugar, faço jiu-jítsu", conta. "Ainda penso [no crime], porque é difícil saber que eu nasci enxergando, nasci sadio e hoje não posso enxergar por causa de um pessoa ruim que entrou na minha vida e tentou me matar. Mas raramente penso nisso, procuro me distrair no dia a dia."
Casamento
Jacirene ouviu falar sobre o casamento coletivo do São João do Cerrado pela televisão. Ela escreveu uma carta contando a história do casal e pediu para uma amiga depositar em uma das urnas espalhadas pela capital. As melhores histórias seriam premiadas com um casamento bancado pela organização, com direito a dia da noiva, alianças, hotel, e até recepção do casamento.
"Uma semana depois me ligaram dizendo que eu tinha sido selecionada. Aí sim liguei para ele e falei: "amor, você quer casar comigo?", diz. "Ele aceitou. Amanhã a gente está esperando para casar e ser feliz para sempre."

Fonte: g1.globo.com
 
Por:  Gabrielly Rebolo    |      Imprimir