Categoria Geral  Noticia Atualizada em 03-11-2014

Estudante supera a dislexia e presta Enem para medicina
Dist�rbio dificulta aprendizagem na �rea da leitura, escrita e soletra��o. Jovem de 19 anos passa cerca de 13 horas por dia estudando.
Estudante supera a dislexia e presta Enem para medicina
Foto: g1.globo.com

Se a escolha do curso de medicina para o vestibular e o Exame Nacional do Ensino M�dio (Enem) assusta os candidatos pelas horas de estudo e preparo antes das provas, para quem se descobre disl�xico o caminho pode ser ainda mais tortuoso. Mesmo assim, o jovem Vitor Rossi Santos, de 19 anos, resolveu superar todas as dificuldades colocadas pela dislexia e se tornar um m�dico. "Toda a minha fam�lia trabalha na �rea da sa�de e eu vi que aquilo l� � para mim. � o que eu quero mesmo, e desde pequeno � assim. Quando perguntavam para mim, eu j� respondia que queria ser m�dico", diz.

Para isso, Vitor sabe que ter� que enfrentar cada linha que tiver que ler ou escrever neste s�bado (8) e domingo (9), quando prestar� o Enem em Mogi das Cruzes (SP), cidade onde mora. Al�m disso, a maratona neste fim de ano inclui mais 10 vestibulares de faculdades particulares, ou seja, mais horas de provas, mais leitura e escrita.

Dislexia
Enunciados grandes, textos compridos e a temida reda��o assustam ainda mais Vitor por causa da dislexia. Segundo a psic�loga e psicopedagoga F�tima Cavenaghi, quem tem o dist�rbio tem dificuldade com a leitura e a escrita. "Dislexia � um dist�rbio de aprendizagem na �rea da leitura, escrita e soletra��o. Pesquisas realizadas em v�rios pa�ses mostram que cerca de 10% a 15% da popula��o mundial � disl�xica", explica

Vitor foi diagnosticado aos 7 anos, quando descobriu que havia repetido na escola. "Foi quando eu repeti de ano. Eu estava na primeira s�rie e tinha uns 7 anos mais ou menos. Repeti e a� minha m�e foi querer saber o que aconteceu. Ela via que eu estudava, ent�o ela percebeu que tinha algo errado. Foi a� que a gente come�ou a ir atr�s para descobrir o que era", se lembra.

De acordo com a psicopedagoga F�tima, o diagn�stico na inf�ncia � fundamental para o aprendizado da pessoa. "Se o disl�xico n�o for submetido a uma interven��o especializada, ele pode se permanecer analfabeto ou semi-analfabeto, sendo exclu�do de profiss�es e voca��es que necessitem de uma prepara��o acad�mica", explica.

"Quando eu era menor mesmo, quando a dislexia de fato era grande, eu sofria demais", se lembra Vitor. "A dislexia vai perdendo seu n�vel, ela n�o se mant�m constante. Por isso quando eu fiz o teste de dislexia, ela era grande. Mas agora ela caiu para leve. E hoje em dia eu ainda tenho um problema com a parte de leitura e tudo mais, mas bem menos que antes", ressalta.

Vitor, no entanto, ainda teme as quest�es do Enem relacionadas ao portugu�s. "Eu tenho muita dificuldade em portugu�s principalmente, n�? Desde pequeno eu sempre evitei essa mat�ria. Eu estudava horas com uma professora e no dia seguinte tirava nota baixa. Ent�o era um des�nimo absurdo com portugu�s e na hora que fui querer aprender, vi que era uma disciplina que eu n�o tinha nem base", explica.

De acordo com a psicopedagoga, � comum o disl�xico ficar frustrado na escola. "O jovem disl�xico muitas vezes traz um sentimento constru�do socialmente de "n�o leitor ou n�o escritor". O pensamento que geralmente ocorre nessa situa��o � "n�o gosto de escrever, n�o quero aprender", diz.

Supera��o
Mesmo com as dificuldades, Vitor prestou o Enem e alguns vestibulares em 2013 e ficou feliz com o resultado. "Tomara que daqui a alguns dias, no Enem, eu me supere mais uma vez, como aconteceu na reda��o do ano passado", diz confiante. "Na reda��o do ano passado do Enem eu fiz 760 pontos, algo que me deixou orgulhoso e deixou meus pais tamb�m
orgulhosos de mim".

Vitor conta que com essa nota conseguiria entrar em geografia em uma faculdade federal do Rio de Janeiro. "Mas n�o adianta, n�? Eu quero medicina. E mesmo se eu conseguir algum outro curso esse ano, tamb�m n�o vou. Vou estudar mais um ano para medicina", afirma.

O jovem diz que n�o esquece o caminho que trilhou. "Eu acho assim, eu lutei muito para conseguir. N�o � f�cil, principalmente quando voc� � pequeno e n�o v� resultados nas provas da escola. Voc� estuda acima do normal e sua nota n�o � t�o boa quanto a das outras pessoas. S� que eu tive muitos apoios e agora estou tendo resultados, n�?", diz feliz.

Segundo ele, a reda��o no Enem n�o foi o �nico motivo de orgulho da fam�lia. "Em uma faculdade no ano passado eu quase consegui entrar para medicina. Foi por pouco, acho que se eu acertasse mais um teste, talvez eu conseguisse entrar tamb�m".

Enem
Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (Inep), as pessoas que t�m o dist�rbio podem pedir uma hora a mais em cada dia de prova, aux�lio ledor e aux�lio transcritor. O Minist�rio da Educa��o (MEC) n�o tem dados quanto ao n�mero de disl�xicos inscritos para o Enem 2014, no entanto, afirmou que cerca de 5,7 mil pessoas pediram o aux�lio ledor - mas neste n�mero tamb�m est�o insclusos outros dist�rbios e defici�ncias.
Vitor preferiu pedir apenas a hora a mais para fazer as provas.

"Eu consegui uma horinha a mais nos dois dias para fazer a prova. Nos outros vestibulares que me inscrevi tamb�m pedi. Isso � extremamente legal, n�? Esse reconhecimento e tudo. Porque uma hora a mais simplesmente ajuda demais", diz. "Eles ofereceram os aux�lios ledor e transcritor, mas eu n�o quis. Prefiro fazer sozinho mesmo por eu j� ter treinado assim desde pequeno. � que essa pol�tica de poder ler com algu�m do lado � muito recente, ent�o eu sempre tive que treinar sozinho", explica.

O estudante conta que tem medo do modelo de prova do Enem. "O Enem � uma prova que eu tenho que te tentar me controlar emocionalmente, porque � uma prova que querendo ou n�o me assusta muito. Eu acho o Enem dif�cil para mim por causa da interpreta��o de texto e da reda��o. Mas tomara que eu me supere", diz. Apesar de achar que a prova � dif�cil, Vitor promete se dedicar ao m�ximo."Eu prestarei o Enem e eu prestarei para medicina. Entrarei com tudo nessa prova e eu acho que posso ter capacidade para conseguir. Por eu ter superado tantas coisas, d� para eu superar mais essa.

Estudo
Vitor reconhece que ainda tem uma grande estrada pela frente e, para alcan�ar seu objetivo que � entrar em um curso de medicina, estuda 13 horas por dia de segunda a sexta. "A rotina de estudo � pesada, tenho aula do cursinho todo dia e na parte da tarde fa�o aulas de reda��o", diz. "Estou h� um ano no cursinho pr�-vestibular. Os meus estudos come�am �s 7h no cursinho e terminam em m�dia umas 20h. De s�bado vou das 7h �s 13h. S� tento tirar o domingo para descansar", explica.

Para conseguir estudar medicina, o jovem abriu m�o da academia, do futebol e da balada com os amigos. "Se voc� quer medicina tem que ser o mais perfeito poss�vel. Qualquer coisa que te atrapalhe vai ter uma consequ�ncia na sua nota final", diz. Vitor tem medo de ficar muitos anos nos cursinhos preparat�rios. "Tem gente que tenta por muitos anos e isso d� um desespero, n�? As vezes eu penso, ser� que eu vou ficar tentando e tentando. Mas os resultados do ano passado mostram que estou no caminho certo", conclui.

Uma das mentoras de Vitor na caminhada � a professora de reda��o M�nica Arouca, que atende entre os seus estudantes, pessoas com dislexia. "As maiores dificuldades de um disl�xico para escrever e ler � a concentra��o, ortografia, a acentua��o e as vezes a organiza��o", explica. Por esse motivo, a professora indica um trabalho em conjunto com v�rios profissionais. "Para auxiliar no aprendizado e enfrentar o problema, � necess�rio o estudante fazer um acompanhamento com fonoaudi�logo, psicopedagogo e um professor que trabalhe com sons", explica.

Segundo ela, o aluno disl�xico � sinest�sico, por isso o tipo de ensino � diferente. "Ele precisa entender o som, sentir a palavra. Quando ele passa o dedo sobre a mesa de estudos e "desenha" a palavra, ele vai se lembrar como � o certo. Ele precisa sentir, porque o aluno disl�xico � sinest�sico", explica. M�nica diz que cada aluno tem uma necessidade diferente, mas entre as dicas que ela d� para um disl�xico estudar sozinho est�o: gravar o que est� lendo e depois ouvir; sublinhar as palavras; reescrever textos; fazer esquemas mentais e tentar organizar o pensamento.

A psicopedagoga F�tima Cavenaghi explica tamb�m que os pais t�m papel importante na forma��o de filhos com dislexia. "Os pais devem ficar atentos a frustra��es, ansiedades, baixo desempenho e desenvolvimento de seus filhos.

� deles a responsabilidade de ajud�-los a ter resultados melhores e deve partir deles a procura de profissionais para o acompanhamento. Quanto mais cedo for realizado o diagn�stico e interven��o, maiores ser�o as possibilidades de sucesso", explica. A psicopedagoga diz, no entanto, que os disl�xicos t�m um grande potencial.
"Apesar de todas as dificuldades descritas anteriormente, o disl�xico, diferente de muitos dist�rbios de aprendizagem, possuem estat�sticamente um QI normal ou acima da m�dia", diz.

J� para Vitor, o maior inimigo do disl�xico � a pessoa que usa dist�rbio como desculpa. "Estimulo as outras pessoas a n�o fazerem isso. N�o usarem as dificuldades como desculpa para n�o estudar. Principalmente quando voc� fica cansado de estudar voc� pensa que n�o aguenta mais isso. E a� voc� pensa coisas negativas. Mas n�o d� para desanimar, voc� tem que tentar fazer de tudo e acreditar que � capaz, que voc� consegue", diz. "Essa � a grande dica. A dislexia � uma barreira que � ultrapass�vel, d� para passar sim. � s� voc� acreditar e n�o usar a dislexia para tudo, n�?"





Fonte: g1.globo.com
 
Por:  Ludyanna Ferreira    |      Imprimir