Categoria Geral  Noticia Atualizada em 22-12-2014

Crítica Dupla Identidade: episódio final
“Podem me matar, não importa o que façam comigo: eu sempre vou estar por ai” Charles Manson
Crítica Dupla Identidade: episódio final
Foto: cabinecultural.com

Por Luis Fernando Pereira

Acompanhar uma série como Dupla Identidade é de um grande prazer, principalmente para alguém que já se identifica com o gênero (suspense policial) e que gosta de semanalmente exercitar o cérebro tentando adivinhar os passos seguintes que a história vai dar. Esta é uma característica típica dos fãs de séries do tipo. Muitas vezes erramos, outras acertamos, mas ao final o que todos nós queremos é desligar a tv com aquela sensação de ter assistido algo que realmente tenha valido a pena. E acredito que, mesmo com os erros cometidos, a série de Gloria Perez termina a sua temporada com um saldo positivo.

Edu x Bryan
Havia escrito que o desfecho do penúltimo episódio abriria caminho para uma sequência importante, o primeiro encontro na trama de Edu (Bruno Gagliasso) com a sua mãe. Esta cena seria recheada de frases impactantes e entenderíamos finalmente os motivos de Edu para ser o que é. Bem, não foi isso que o roteiro buscou entregar, e a cena, bem curta, não trouxe nada de importante para a série.

A presença da mãe, entretanto, foi peça chave para que o espectador percebesse que de fato, e literalmente, Edu (ou Bryan) vivia realmente sob dupla identidade. Com a mãe também descobrimos que Edu sempre sonhou em ser político e sempre a teve como única referência familiar. Estes são os únicos elementos que temos para tentar construir um perfil de compreensão. Mas é neste momento que uma fala do próprio em episódios passados faz sentido e esclarece; ele diz para Vera que ela passa tanto tempo "construindo perfil que não se dá conta que o assassino pode estar ao seu lado".

É muito provável que, ao final, seja esta a mensagem do roteiro para a primeira temporada: o ser humano possui este potencial de crueldade dentro de si, inerente; quando vemos, por exemplo, uma criança sendo cruel com um animal, percebemos isso mais claramente. Ali está concentrado um potencial de crueldade; alguns transformam este potencial em ações no futuro, outros não. E o elemento que desencadeia este comportamento pode ser algo comum, aparentemente sem importância, como uma discussão com a mãe, um término de namoro, uma brincadeira de mau gosto de algum amigo… Só não ficamos sabendo o que desencadeou este comportamento em Edu.

Prisão
Com isto definido, podemos analisar o desfecho real que o personagem teve na série: foi deportado para os Estados Unidos, pois, evidentemente, ser preso no Brasil não pode ser considerado uma punição. Esta decisão foi tomada para não dar a entender que Edu ficaria impune, mas também para dar brecha para a presença dele em uma segunda temporada da série, caso exista, claro. No Brasil, a única opção de pena seria a sua morte, pois se fosse preso causaria enorme revolta.

Gloria Perez usou vários casos célebres para desenvolver a história de seu protagonista, e estes últimos passos seguiram esta linha também, com Edu se auto-defendendo (de forma arrogante) em seu julgamento, e com a sua prisão em cadeia americana. Agora, para que ele retorne para outra temporada (a ideia por trás desta decisão), Gloria terá que usar outro caso famoso do mundo dos serial killers: o de Hannibal Lecter.

Hannibal, mesmo preso, foi peça fundamental no desenvolvimento da história em O Silêncio dos Inocentes. Ele fazia um papel dúbio, ora ajudando a polícia a encontrar outro assassinos em série, ora dando vazão aos seus instintos de assassino. Esta saída pode ser interessante, e será a única, talvez, aceitável para uma volta de Edu à série.

Outros personagens
Se tentarmos ver a série sob a ótica dos outros personagens, a única que merecerá nossa atenção será Ray (Débora Falabella). Ela foi ganhando muita força ao longo dos episódios e chegou neste final no mesmo nível de Edu. Sua relutância em ser testemunha do julgamento, em descartar Edu como amor de sua vida e, sobretudo, em reconhecer que sua personalidade sofre de algum distúrbio grave, fez de Ray uma peça bem rica na história. Agora ela carrega um filho com DNA assassino e este fato será de grande importância para o futuro da personagem. A última cena da temporada, com os dois se encarando de modo expressivo, só mostra que Edu e Ray, ou Bruno Gagliasso e Débora Falabella, foram os nomes de Dupla Identidade nesta primeira temporada.

Os outros desfechos foram desenvolvidos de forma apressada, mas até que não incomodaram muito. A família de Oto, destroçada e vivendo sob mentiras, acabou se transformando em um bom representante de milhares de famílias deste tipo que fazem parte de nossa sociedade. A dupla Vera (Luana Piovani) e Dias (Marcelo Novaes) tiveram um desfecho em aberto, mas a tendência é que os dois estejam neste momento nos Estados Unidos sendo felizes.

Luana Piovani teve um visível crescimento nestes últimos episódios, e chegou em alguns momentos a polarizar as atenções com Edu. Essa sempre foi a ideia da série, que trabalhou desde o início a história como se fosse uma caça do gato ao rato. Vera e Edu foram concebidos para estarem numa única imagem, eram partes de uma mesma foto. Porém, enquanto Edu crescia, Vera ficava inerte, e Ray acabou ocupando o seu lugar. No final Vera voltou a ser importante e terminou a história como uma importante peça no quebra cabeça de Dupla Identidade, mas o estrago já havia sido feito.

Erros e acertos
Ao final, a série de Gloria Perez fecha o ano com saldo positivo. Algumas decisões foram falhas, e o último episódio ilustra bem isso. O caso do cadarço, por exemplo, que tinha tudo para ser um grande elemento de reviravolta na história, só foi usado no final (até acredito que por pressão da audiência), não servindo para nada de concreto. Tudo foi resolvido em alguns minutos de um modo bem preguiçoso. Outro erro foi trazer a história de sua vida nos Estados Unidos somente agora. Uma regra básica em séries e filmes de suspense é: resolva seus casos com o que já foi mostrado até aqui. Inserir um novo elemento nos últimos instantes soa bem simplista e acaba fragilizando a força do roteiro.

Ainda assim, este mesmo roteiro foi eficaz em deixar as pessoas (no universo da série) sem saber se Edu era o assassino até o último instante. E isso é crível, realmente é difícil de acreditar que alguém como ele pudesse ser um assassino cruel. As cenas que mostram as colegas de Edu do trabalho voluntário e o marido de uma das vítimas (que o defendia ferozmente) descobrindo que foram enganados foram muito bem feitas.

Dupla Identidade acaba sua primeira temporada re-inaugurando um gênero não muito comum na televisão brasileira. Somente por isso a experiência já foi válida. O trabalho de arte, trilha sonora e fotografia foram pontos mais que positivos na história. Largar este clima tropical, comum às novelas, e trazer esta atmosfera mais escura, quase que de um submundo, foi outro acerto.

E por fim, vale novamente o destaque aos trabalhos de Bruno Gagliasso e Débora Falabella. O primeiro foi poderoso desde o primeiro capítulo, apresentando todas as nuances de um personagem cheio de camadas, rico em características e com uma personalidade muito bem construída. Bruno foi o grande nome da série e espera-se que seja lembrado em todas as premiações possíveis, pois sem ele, Dupla Identidade não teria esta mesma força. Já Débora trabalhou de modo gradual, e sua personagem foi crescendo a medida que ficamos sabendo mais de seu problema comportamental.

Agora nos resta esperar por uma segunda temporada, ou torcer para que a televisão brasileira continue produzindo séries que saiam deste padrão tão comum já há décadas.

PS: a segunda temporada da série acaba de ser confirmada, então mais para frente escreveremos sobre as nossas perspectivas.

Fonte: cabinecultural.com
 
Por:  Desirée Duque    |      Imprimir