Categoria Geral  Noticia Atualizada em 24-12-2014

Jesus vive no Papa Francisco?
Há uma luz, um tempo de esperanças, talvez até um clamor, no Vaticano. Juram-se novas palavras, descobrem-se distintas vontades, antecipam-se bons sobressaltos,põe-se em causa, moraliza-se.
Jesus vive no Papa Francisco?
Foto: www.ionline.pt

Hoje, dia em que as crianças são soberanas na noite de todas as prendas, volto ao Papa Francisco. Extraordinária figura, mesmo para quem de Deus duvide ou nele não acredite. Há menos de uma semana falava-lhe da sua fortíssima dimensão política, virtude alicerçada numa superioridade moral que o faz ser confiável e decisivo em múltiplas negociações. Agora, véspera do nascimento de Cristo, escrevo-lhe de um outro lado, o do homem que fala para dentro de casa, para o interior das paredes do Vaticano, centro de poder, contradições e intriga.

O discurso de Francisco aos cardeais é ambicioso. Duro e cortante. Corajoso e sem meias-medidas. Só alguém muito apaziguado com as questões da vida e da morte, da transcendência e da realidade humana, do poder e da ausência dele, poderia ousar, perante uma sala de príncipes da Igreja, inscrever na história do mundo uma nova tábua moral, dramática para a Igreja e os seus senhores, equiparados (não por estas palavras) a vendilhões do templo ou a fabricantes de bezerros de ouro.

Em surdina, os mais conservadores certamente que o definirão como um soberbo. Quem é ele para colocar em causa os comportamentos das cúpulas e humilhar os bispos perante o mundo? Julgar-se-á Moisés a descer das montanhas de Sinai ou, pior ainda, terá a tentação de se achar iluminado pelo Espírito Santo e de ser dono de toda a verdade? Sobretudo quando a verdade é tão diferente da que uma larga parte da hierarquia do Vaticano está habituada.

No excelente resumo de Joana Azevedo Viana, percebemos que as críticas de Francisco, divididas em 15 pontos, são também um ataque ao curso de um mundo habitado por monstros que vivem em todos os homens. O monstro da ganância, do autismo espiritual, das vãs glórias, da má-língua e da boataria, dos maus pensamentos, da indiferença, do lucro e da vaidade. Monstros que habitam no Vaticano e que têm de ser extirpados sob pena da Igreja Católica ser não uma luz, mas um próprio foco do mal.

Um dia perguntei a José Policarpo se saberia reconhecer Jesus se ele regressasse. Após segundos de hesitação respondeu-me, com sinceridade, que não o poderia afirmar, mas que o esperava, esperava estar à altura.

Seria um excesso de linguagem afirmar que Francisco é Jesus, mas não é excessivo dizer que o Papa que veio da Argentina representa o que em mim é a imagem, o exemplo e o discurso do Homem que hoje celebramos.

Há uma luz, um tempo de esperanças, talvez até um clamor, no Vaticano. Juram-se novas palavras, descobrem-se distintas vontades, antecipam-se bons sobressaltos, põe-se em causa, moraliza-se. Entre o que é caminho para ser caminhado há uma porta que esconde segredos, uma porta que pode e deve ser aberta para que a Igreja salde em si o que é humano para melhor abraçar o que não o é. Matar os segredos e seguir em frente com superioridade moral... De outro modo será sempre um abraço de espinhos que magoa a esperança de um mundo novo.

Fonte: www.ionline.pt
 
Por:  Desirée Duque    |      Imprimir