Categoria Geral  Noticia Atualizada em 27-01-2015

ANS fica só com 40% das multas que aplica nos planos de saúd
Levantamento feito a pedido do Estado de Minas revela que, em 56% dos casos de 2014, as operadoras não pagaram o que devem. Em 2013, apenas 20% do total foi recebido
ANS fica só com 40% das multas que aplica nos planos de saúd
Foto: www.em.com.br

De janeiro a outubro do ano passado, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) aplicou 2.454 multas a planos de saúde por descumprimento de regras como a cobertura para procedimentos. Desse total, mais da metade (56%) das multas aplicadas a operadoras não foram pagas. O levantamento feito pela ANS a pedido do Estado de Minas mostra que, dos R$ 302 milhões cobrados dos convênios médicos e odontológicos, a agência reguladora recebeu R$ 120 milhões, pouco mais de um terço. Outros R$ 171 milhões foram encaminhados à dívida ativa. O número é melhor que o de 2013 quando o valor das multas alcançou R$ 493 milhões, mas apenas 20% deste total foi recebido. Ao todo R$ 529,5 milhões foram encaminhados para dívida ativa entre 2006 e 2014.

Para especialistas, o rombo dos valores não arrecadados pela ANS pode ser ainda maior, se levados em conta os processos administrativos que caducam sem ser analisados pela agência, além do que ela deixa de arrecadar, a título de ressarcimento, quando beneficiários de planos de saúde são atendidos pela rede pública. O professor de medicina da Universidade de São Paulo (USP) Mario Scheffer afirma que as multas cobradas pela agência reguladora estão muito aquém do que deveria ser aplicado por infrações cometidas pelas operadoras. "A ANS deixa de cobrar e fiscalizar o pagamento de muitas multas e processos que acabam prescrevendo. As operadoras apostam na impunidade, pois têm brechas na legislação que permitem isso, e quem acaba pagando pelo mau atendimento e a má fiscalização é o usuário", afirma.

Na opinião da coordenadora institucional da Proteste – Associação de Consumidores, Maria Inês Dolci, a cobrança, como é feita hoje, permite que o pagamento demore muito a ser efetuado. "Para que as multas tenham efeito educativo e incentivar a melhoria no atendimento, a cobrança deveria ser mais ágil, e isso depende de uma alteração na legislação", aponta. O jornalista Leonardo Fonseca da Silva está há mais de quatro meses esperando uma solução da ANS para conseguir incluir o filho recém-nascido como seu dependente no plano de saúde. Depois de fazer todos os trâmites pedidos pela operadora e apresentar todos os documentos dentro do prazo estipulado, a consulta no pediatra não foi liberada. "Eu tinha 30 dias para apresentar os documentos e apresentei no penúltimo dia do prazo. Dias depois, não conseguimos realizar a consulta do pediatra pelo plano e tivemos que desembolsar R$ 350", lembra.

Ainda de acordo com Leonardo, depois disso, ele já fez reclamação à ANS e entrou com uma ação junto ao Procon requerendo que a operadora inclua seu filho como dependente, mas somente mais de quatro meses depois a agência obteve uma liminar obrigando o plano de saúde a inclui seu filho na cobertura. "Mesmo com a liminar, o problema ainda não foi resolvido. A qualquer hora eu posso chegar numa consulta com ele e o médico simplismente não aceitar", lamenta.

De acordo com a advogada do Instituto Brasileiro de Consumidores (Idec), Joana Cruz, o problema vivido por Leornardo é mais comum do que se imagina. Para ela, falta colaboração das operadoras, que têm ciência de que cometeram o erro, mas postergam o pagamento da dívida, já que a legislação permite que se discuta a legalidade da cobrança. "Talvez seja necessário que a ANS aplique sanções mais duras, que evitem que as operadoras protelem esses pagamentos. No final, quem sai prejudicado é o consumidor que continua refém dos planos", completa.

Enfermaria

A aposentada Aparecida de Rosa Lara Gomes, de 56 anos, sofreu para conseguir o atendimento previsto em contrato com o plano de saúde. Depois de fazer acompanhamento médico e constatar que necessitava de uma cirurgia para extrair um cálculo renal, ela ficou surpresa ao dar entrada no hospital e a encaminharem para a enfermaria, quando seu plano previa internação em quarto. "Me disseram que não havia vaga e que, por isso, eu teria que ficar na enfermaria. Mas a minha cirurgia foi planejada e marcada com antecedência. Eles tinham que me atender conforme estava previsto no contrato", afirma. A aposentada lembra que, enquanto entrou para a sala de cirurgia, seu acompanhante ficou na administração do hospital, em contato com o plano de saúde, discutindo o problema. "Quando voltei, ainda fiquei na enfermaria. Só depois me colocaram no quarto. É um absurdo como eles tratam os usuários", lamenta.

Segundo o diretor-adjunto de Fiscalização da ANS, Suriêtte dos Santos, a mediação de conflitos para as reclamações registradas nos canais de relacionamento da agência e a suspensão da comercialização de planos de saúde com grande número de queixas têm sido importantes instrumentos para agilizar a solução do problema do consumidor. "Hoje, mais de 80% das demandas são resolvidas sem que a gente tenha que abrir processo judicial", disse. Ainda de acordo com Suriête, as operadoras têm o direito a ampla defesa, tanto nos processos administrativos quanto nas esferas judiciais. "Dentro da esfera judicial, a ANS não tem o que fazer, mas, em relação aos processos administrativos, nós estamos aperfeiçoando o trabalho para ajudar a reduzir os passivos processuais", completa.

A agência informou ainda que busca o constante aprimoramento da regulação do setor e da eficácia de seus processos. Uma das prioridades da Diretoria de Fiscalização é o desenvolvimento de um modelo de análise coletiva de processos que permita a promoção de soluções em larga escala para alcançar a totalidade de consumidores expostos a infrações.

Empresas ganham tempo com recurso

A Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) informou, por meio de nota, que, sobre o recolhimento das multas por alegado descumprimento de regras, como a cobertura para procedimentos, a federação reforça que suas associadas respeitam os prazos e normas em vigor estabelecidas pela ANS. "Importa ainda esclarecer que o recolhimento das multas segue regras de aplicação de penalidades estabelecidas em lei e nos regulamentos da ANS. Essas regras preveem recursos administrativos das operadoras a instâncias superiores da agência, quando questionada a pertinência da infração. Dessa forma, para melhor conclusão sobre o assunto é importante que seja verificada a origem dos alegados valores de multas."

Já a Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge), entidade que representa os planos de saúde, também afirmou, por meio de nota, que, a aplicação de multas é um importante instrumento que dá suporte à regulação do setor, incentivando as boas práticas das operadoras em todas as dimensões do atendimento prestado a seus beneficiários. "No entanto, o valor das multas aplicadas atualmente é desproporcional e fere qualquer princípio de razoabilidade, tendo em vista sua função primordial de auxiliar na fiscalização do sistema de Saúde Suplementar, e não o de prover fundos. É necessário aprofundar a discussão em torno desse assunto, que vem causando sérios problemas às operadoras – em especial as de menor porte –, comprometendo a saúde financeira e, por consequência, a qualidade do atendimento de seus pacientes."

Segundo a agência reguladora, em 2013 foram aperfeiçoados processos internos que ajudaram a reduzir passivos processuais. Entre eles, medidas que desburocratizaram trâmites, como a assinatura eletrônica de documentos. Segundo nota da agência foi também criada a Análise Eficiente de Processos (AEP), que simplificou o fluxo de julgamento dos processos administrativos. Foi também criada a Análise Eficiente de Processos (AEP), que simplificou o fluxo de julgamento dos processos administrativos sancionadores em segunda instância da ANS. Com a contratação de servidores temporários trabalhando na AEP, a agência triplicou o número de processos julgados em relação a 2012. Foram 3.027 em 2013. Em 2014, a diretoria colegiada julgou 6.212 processos. (FM)

Fonte: www.em.com.br
 
Por:  Desirée Duque    |      Imprimir