Categoria Geral  Noticia Atualizada em 27-01-2015

Alexis Tsipras prepara-se para negociações duras com a UE
Novo primeiro-ministro grego toma posse com rapidez relâmpago e quebrando com várias tradições.
Alexis Tsipras prepara-se para negociações duras com a UE
Foto: www.publico.pt

Nada foi como costuma ser na Grécia. Na manhã seguinte às eleições, houve um acordo de coligação, uma tomada de posse, um juramento civil, e uma transferência de poder em que o chefe do Governo cessante não apertou a mão ao novo primeiro-ministro.

Mas o mais importante foi a escolha de Alexis Tsipras para parceiro de coligação: o partido conservador e nacionalista Gregos Independentes, com o qual o Syriza (Coligação de Esquerda Radical) tem uma coisa em comum: a posição anti-troika e anti-austeridade. Com os 149 deputados do Syriza (que venceu com 36,34% dos votos, distante da segunda força mais votada, Nova Democracia com 27,81%) e os 13 dos Gregos Independentes (que foram o sexto mais votado com 4,75% dos votos), o novo Governo tem maioria parlamentar.

Tsipras surpreendeu os analistas que esperavam uma aliança com o mais moderado O Rio (To Potami), que ficou em quarto lugar com 6,08% dos votos, e que lhe permitiria compromissos com Bruxelas que a ala radical do Syriza não o deixaria fazer sozinho. O líder do Syriza fez o caminho exactamente inverso e pondo o destino nas mãos de uma coligação que arrisca desintegrar-se se não forem conseguidos compromissos substanciais com os credores, que continuam a dar sinais de que apenas pequenas mudanças serão possíveis. "Ele amarrou-se ao mastro com esta escolha", comentou um diplomata europeu. Se o navio for abaixo, ele irá também. E, como lembra a imprensa grega, Tsipras é o sexto chefe de Estado que toma posse durante o mandato de Karos Papoulias na presidência (desde 2005).

À espreita, se tudo falhar, está o partido de extrema-direita Aurora Dourada, que embora tenha obtido um resultado ligeiramente mais baixo do que em 2012 (com 6,28%, terá 17 deputados no novo Parlamento), conseguiu o terceiro lugar entre os mais votados em circunstâncias excepcionais – a liderança e metade dos deputados na prisão. A jogada do novo primeiro-ministro grego teve isto em conta.

O dia começou cedo com a reunião entre Alexis Tsipras e o líder dos Gregos Independentes, Panos Kammenos, depois do encontro com o Partido Comunista (5,57% dos votos e 15 deputados) que rejeita integrar qualquer executivo e defende uma mudança de sistema. A correspondente do Guardian em Atenas, Helena Smith, notou que o entusiasmo era tal que Kammenos chegou dez minutos mais cedo do que o marcado.

Quando saiu, Kammenos anunciou que havia um acordo. "O objectivo para todos os gregos é começar um novo dia, com total soberania", declarou.

E a agenda seguiu em ritmo de corrida a partir daí: o líder do Syriza encontrou-se com o chefe da Igreja Ortodoxa da Grécia, o arcebispo Ieronimos, para lhe dar conta da decisão de fazer uma tomada de posse civil, algo que nunca tinha acontecido na Grécia. Tsipras, que vive em união de facto, algo digno de nota num país conservador, tem ainda assim boas relações com Ieronimos, até por causa do apoio social da igreja durante a crise.

Foi assim que Tsipras, o mais jovem primeiro-ministro da Grécia, os seus 40 anos a contrastar com os 75 anos do Presidente Papoulias, tomou posse, deixando de lado a parto do juramento que dizia respeito à igreja. Muitos notavam ainda a ausência de gravata num país de políticos em que esta é uniforme obrigatório.

O primeiro acto oficial de Tsipras como chefe de Governo foi também simbólico: uma visita ao local onde, a 1 de Maio de 1944, cerca de 200 gregos foram executados pelos nazis.

Seguiu-se outra excepção no protocolo quando o chefe de Governo cessante, Antonis Samaras, não cumpriu a tradição de passar pessoalmente o gabinete de primeiro-ministro. Samaras enviou um assessor próximo. Tsipras, em resposta, fez o mesmo.

A apresentação do Governo e das pastas de cada ministro deverá ser feita esta terça-feira, e seguir-se-á a aprovação no Parlamento. "Quero esperar e acreditar que a maioria absoluta de 162 deputados [149 do Syriza e 13 do parceiro de coligação] que conseguimos vá aumentar durante o voto de confiança" ao novo Governo, disse Tsipras antes da nomeação ao Presidente. "Temos de acelerar procedimentos porque temos uma batalha complicada à nossa espera", sublinhou.

O jornalista Nick Malkoutzis, do Kathimerini e do site MacroPolis, comentava que a aliança com os Gregos Independentes era a "opção nuclear".

É uma aliança estranha, já que os dois partidos discordam em quase tudo tirando a oposição à troika, desde a imigração à política externa passando por questões sociais. Os Gregos Independentes surgiram antes das eleições de 2012, quando Kammenos saiu da Nova Democracia por se opor ao acordo com a troika e formou um novo partido.

O líder do partido populista foi recentemente acusado de anti-semitismo ao sugerir que os judeus tinham tratamento preferencial nos impostos na Grécia.

Os Gregos Independentes fazem parte do grupo Conservadores e Reformistas no Parlamento Europeu, o grupo moderadamente eurocéptico formado em 2009 pelo primeiro-ministro britânico David Cameron e que inclui entre outros o partido anti-euro (ou anti-resgates) Alternativa para a Alemanha.

Tsipras encontrou-se ainda ao final da tarde com o líder do partido O Rio (To Potami), Stavros Theodorakis, que apesar de novo na cena política grega era visto como uma força mais moderada, mas não era esperado que mais nenhum partido se juntasse à aliança. Theodorakis descreveu o acordo entre o Syriza e o Gregos Independentes como um "mau presságio" para o novo Governo.

Os responsáveis europeus têm repetido que apenas pode haver pequenas cedências. No jogo de negociações cruciais com a União Europeia, Tsipras escolhe começar com uma parada mais alta. O jornalista Nick Malkoutzis vê uma janela de oportunidade, na verdade, a única: se conseguir fazer reformas estruturais e mudanças institucionais que nenhum outro Executivo quis ou foi capaz de fazer, um governo Syriza poderia obter vantagem negocial, mais do que se apenas cumprisse critérios financeiros.

Fonte: www.publico.pt
 
Por:  Desirée Duque    |      Imprimir