Categoria Geral  Noticia Atualizada em 31-01-2015

Tim Burton visita clichês dos anos 1950 em "Grandes olhos"
Longa realista foge dos universos fantásticos que tornaram-se assinatura do cineasta
Tim Burton visita clichês dos anos 1950 em
Foto: divirta-se.uai.com.br

A estreia de um trabalho do cineasta Tim Burton, inevitavelmente, traz a pergunta: este filme surpreende? A resposta, no caso de "Grandes olhos", é sim. E por um motivo insólito: trata-se de um longa realista, sem os universos fantásticos que marcam a obra do diretor norte-americano. Aliás, logo no início da exibição, o letreiro informa que a história é baseada em fatos reais.

Vale lembrar: para Tim Burton, o normal é, ironicamente, um ponto acima do real. Até porque o contexto de Grandes olhos está num ambiente amplamente idealizado: a sociedade norte-americana da passagem dos anos 1950/1960, época apresentada com a sua profusão de clichês.

Grandes olhos conta a história de Margaret Keane (Amy Adams), autora de pinturas sentimentais que trazem crianças pobres de olhos enormes. A artista aceita que o marido, Walter Keane (Christoph Waltz), assine as obras como se fossem dele. Os quadros fazem enorme sucesso e, durante décadas, a pintora tem de conviver com tal situação. Para retomar a autoria de suas próprias criações, Margaret se vê obrigada a lutar contra Walter nos tribunais.

Por que os quadros fazem sucesso? Como Margaret aceita essa situação?. Com um olhar curioso, Burton coloca essas perguntas, além de evocar o imaginário das décadas de 1950 e 1960, cercado de todos os tons róseos (e azuis) dos filmes altruístas e dos melodramas daquele período.

Ingênuos, cruéis e bizarros. Assim Burton caracteriza os anos 1950. Tudo é apresentado de forma objetiva, sem julgamentos, mas com afeto e ironia. Aos poucos, os clichês vão sendo borrados. A imagem banal da criança pobre chorando se torna terrivelmente dolorosa; o sucesso "popular" dos quadros não foi tão espontâneo assim; atitudes "sensatas" vão ganhando ares de total delírio.

É surpreendente como Tim Burton vai criando intertextos e dubiedades sem interferir no andamento da trama e, especialmente, sem zombar ou ridicularizar ninguém. Há o constante deslocamento entre o motivo central e o entorno, o choque entre a observação brincalhona e a sinalização de problemas graves. Considerações sobre a sociedade não apagam o individual.

Vale observar: Tim é ainda meio sem jeito com tipos "normais", o que só contribui para o jogo empatia/distanciamento que move Grandes olhos. Os atores estão ótimos.

Definido pelo diretor como indie, o filme acaba revelando um aspecto pouco percebido (mas onipresente) em sua obra: Tim Burton faz cinema de sentimentos. Estão na tela humildade, megalomania, arrogância, ingenuidade, autoestima, subserviência e cinismo.

Qual seria o papel do Grandes olhos na filmografia do cineasta? Só o tempo dirá. Por enquanto, é um bom trabalho, envolvente e para ser curtido – tema de conversas e discussões. Certamente, temos aqui outro filme intrigante, surpreendente, de um dos mais interessantes criadores do nosso tempo.

Fonte: divirta-se.uai.com.br
 
Por:  Desirée Duque    |      Imprimir