Categoria Opinião  Noticia Atualizada em 20-04-2015

O juramento de um profissional
Dia desses fui a uma formatura. Linda, a cena de cada novo profissional prometendo, de p� e solenemente, ser um verdadeiro sacerdote ao longo da carreira.
O juramento de um profissional
Foto: Reprodu��o/Google

� assim, quase sempre com o cora��o puro de uma crian�a, que come�amos as nossas caminhadas. E a� come�am a chegar os primeiros clientes, segurando com as m�os os seus problemas ou direitos doentes e raqu�ticos.

Estes primeiros pacientes s�o afortunados! Com que carinho nos debru�amos sobre os casos deles! Lemos e relemos cada documento, e pesamos criteriosamente todas as circunst�ncias a fim de que nosso diagn�stico seja absolutamente preciso.

Nestes primeiros dias n�s at� recebemos as fam�lias dos nossos clientes, e pacientemente as ouvimos e at� confortamos, se for o caso. Terminado o expediente di�rio, deixamos nossos locais de trabalho com a alma leve de quem passou o dia a recitar uma linda ora��o.

Mas eis que os dias v�o se passando, e o desfile das mis�rias humanas n�o diminui � pelo contr�rio s� aumenta, juntamente com o nosso torpor. Decorridos alguns meses, a ang�stia do pr�ximo passa a ser cada vez mais apenas uma rotina desconfort�vel, desagrad�vel ao esp�rito e aos sentidos. Lentamente, sem que o percebamos, passamos a ser v�timas daquele que Ralph Waldo Emerson definiu como "o pior veneno": o tempo!

� assim que passamos a estudar cada caso com aten��o cada vez menor, e quanto mais experientes mais delegamos tarefas a auxiliares que n�o tem experi�ncia alguma, em uma total invers�o de l�gica. Atender familiares? Para que? Afinal, o passar dos anos transformou o ato de ouvir as express�es de ansiedade e ang�stia deles em uma mera perda de tempo � ficamos importantes demais para isso.

Na maior parte das vezes, passamos a s� nos dar ao trabalho de alguma pesquisa mais extensa quando nos deparamos com algum daqueles casos pol�micos. Assim, quando se trata de impor um rem�dio amargo a algu�m importante, cercamo-nos de todas as precau��es � ali�s, n�o raramente pesquisamos tanto que acabamos encontrando uma maneira de resolver o problema sem ministrar rem�dio amargo algum.

J� quanto aos miser�veis, o tempo que dispensamos aos casos deles costuma ser inversamente proporcional � dura��o de nossas carreiras. Assim, em seguida �s express�es "a situa��o � conhecida", "trata-se de um quadro comum" ou "� mais um daqueles casos" n�o raramente seguem-se rem�dios amargos, daqueles que causam dor e sofrimento durante anos a fio.

Encerrado o expediente, deixamos os nossos gabinetes e escrit�rios j� n�o mais com aquela alma leve dos primeiros dias, mas com uma sensa��o estranha de al�vio por estarmos saindo daquela passarela na qual desfilam as mais pungentes mis�rias humanas.

� diante desta realidade que talvez fosse oportuno mudarmos nossos t�o solenes juramentos.

Que tal prometermos, simplesmente, em nossos cora��es, sermos pessoas n�o s� de bem, mas tamb�m do bem por toda a vida? Que tal nos comprometermos a receber e atender, ao longo de nossas carreiras, cada miser�vel, cada pessoa atormentada por problemas, que bater � porta dos nossos gabinetes ou escrit�rios? Que tal, finalmente, jurar que tentaremos, pelos tortuosos caminhos da vida, reduzir ao m�ximo nossos "momentos de Pilatos"? Por favor, n�o juremos que n�o teremos deles � a vida n�o nos permitir� tamanho luxo! Mas que n�o sejam muitos, eis algo que humana e honestamente poder�amos cobi�ar e prometer nestas noites de formatura.

Fonte: O Autor
 
Por:  Pedro Valls Feu Rosa    |      Imprimir