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BENTA CONTRADIÇíO
Bento XVI movimentou a economia no Brasil nos últimos dias. Os meios de comunicação tiveram pratos cheios de belas imagens e de frases de efeito do Sumo Pontífice
BENTA CONTRADIÇíO

Bento XVI movimentou a economia no Brasil nos últimos dias. Os meios de comunicação tiveram pratos cheios de belas imagens e de frases de efeito do Sumo Pontífice. Os vendedores ambulantes comemoram o estupendo crescimento da venda de souvenirs com motivos religiosos. O que parece ter sido bom para o catolicismo brasileiro, foi mais uma vez infinitamente melhor para o capitalismo que grassa a sociedade e que consegue fazer proezas com o jogo do "bate e assopra". Os detalhes do vaso sanitário que o Pontífice utilizou ganham de repente mais importância que o debate sobre aumento dos salários dos parlamentares.

Entre a cena do marido traindo a mulher e a da transa do casal de namorados, vez ou outra ele aparecia ali na tela, o próprio Papa, com o sorriso simpático e os braços estendidos para saudar o povo brasileiro e falar da castidade. O presidente Lula, que dia desses chamou de "hipócritas" as pessoas e igrejas que criticavam suas fabriquetas escolares de camisinha, aproveitou o ensejo para fazer auto-elogios e "defender os valores da família". O ex-ministro da Saúde José Serra, ora governador de São Paulo, pediu a beatificação da Irmã Dulce, que é aclamada justamente por ter levado adiante um grande hospital filantrópico, já que os ministérios da saúde historicamente não cumprem seu papel de proporcionar atendimento decente à população carente. Logo após o término fantasmagórico de mais uma novela espírita daquelas que empurram o kardecismo na consciência mal evangelizada dos católicos, aparecem os jargões da rede que agora, em questão de segundos, se torna a TV mais católica do mundo; com a mesma rapidez com que o monsenhor secretário de Sua Santidade o paramenta com a estola papal, ao vivo diante das câmeras, a Rede Globo, em seu afã de contrapor o risco comercial da TV do bispo Edir Macedo, fantasia-se de cristã. As freiras, que na novela são tão ridicularizadas e negativamente estereotipadas, na transmissão da viagem papal são entrevistadas com respeito e ar quase de heroísmo.

Nestes dias solenes, teólogos de araque surgem repentinamente nas redações de todos os jornais; e todos os agnósticos se acham, por alguns momentos, um pouco católicos, no fundo, no fundo. Quem nunca leu sequer um livro de teologia na vida, de repente se acha no direito de avaliar a profundidade, os enfoques e até mesmo o peso de cada declaração do Papa. Católicos que não ocupam sequer seus lugares no banco da missa aos domingos se acham no direito de "reivindicar" aberturas e avanços por parte da doutrina e da moral da Igreja. Paira uma ignorância geral sobre a fé católica, camuflada de conclusões carregadas de clichês e preconceitos.

E agora, tudo permanece como sempre esteve. Enfim, a rotina regressa e expulsa os últimos fragmentos de escrúpulos espirituais. O aborto deixa de ser aquele assunto desagradável que ninguém quer abordar e volta à pauta do dia. O Brasil segue o procedimento do pato quando sai à chuva: ele se deixa ficar por um tempo debaixo d'água, mas quando para de chover, sacode-se todo e mostra que continua seco como antes da chuva.


Fonte: O Autor
 
Por:  Juliano Ribeiro Almeida    |      Imprimir