Categoria Opinião  Noticia Atualizada em 01-08-2007

NA ÉPOCA DE MADAME FAX E DOUTOR CIDREIRA
As reuniões eram na pequena gráfica do Fraga Júnior, quase em frente ao bar Garota da Barra. Na parede, um enorme quadro do Che Guevara, imponente e charmoso...
NA ÉPOCA DE MADAME FAX E DOUTOR CIDREIRA

As reuniões eram na pequena gráfica do Fraga Júnior, quase em frente ao bar Garota da Barra. Na parede, um enorme quadro do Che Guevara, imponente e charmoso em sua boina, nos dizia para endurecer sem perder a ternura. E lá estávamos nós, eu, o Fraga,Julinho, Gleicinha, Garcia, Zé Rubens, Doutor Tadeu, Chico Teixeira, professor Daniel e tantos outros "militantes" do Partido dos Trabalhadores. Era ali que pensávamos nas estratégias para vencer a direitona burguesa e neoliberal e tomar o poder. Brigávamos mais dentro do que fora, como bons petistas.

Meu codinome era madame fax por ser a única que possuía tal aparelho em casa e recebia todas as mensagens da regional. Já o codinome de Tadeu era doutor cidreira por ser ele médico homeopata e sempre pedir calma nas discussões mais acaloradas e sanguíneas do Zé Rubens. E é claro que foi o próprio Zé Rubens quem nos deu esses
codinomes.

Fraga, como ex-prisioneiro do regime militar detinha sobre ele olhares de admiração e respeito. Época interessante essa, onde ainda acreditávamos que alguma coisa poderia ser diferente com o PT no governo. Mas o que valeu dessa época foram as histórias que hoje temos para contar e as sonoras e viscerais gargalhadas que demos durante as campanhas do Lula para presidente e do Doutor Tadeu para Prefeito de Itapemirim e depois para Deputado Estadual.

Dinheiro, nenhum. Ajuda da esfera estadual só os santinhos. O jeito era apelar para os amigos e para a criatividade. Como não tínhamos grana para palanques, o negócio era arrumar um caminhão emprestado.

Lembro de um comício no morro do Zé da Gata, em Marataízes, onde o amigo Téo, do Teixeira Material de Construção , nos cedeu um caminhão caçamba. E lá fomos nós, subindo o morro íngreme , quando, derrepente ,o caminhão parou e não quis mais pegar.

O jeito era fazer o comício ali mesmo, bem no final da subida. Colocamos quatro enormes pedras atrás das rodas para o caminhão não voltar morro abaixo. Enfeitamos o "palanque" com bandeirinhas e com palavras de ordem.Garcia começou a sentir um insuportável mau cheiro e descobrimos que atrás do nosso "palanque" tinha uma grande pocilga. O cheiro de lama e de merda de porco impregnava as narinas e embrulhava o estômago.

Mas não tinha outro jeito, o caminhão não pegava nem com reza. O professor Zé Rubens junto com o professor Daniel ficaram responsáveis de sair as 18:30h da escola Whasington Pinheiro, na Vila, em retumbante caminhada com mais de quinhentos alunos até o local do comício, num percurso de aproximadamente seis quilômetros.

Nos preparamos para uma grande noite. Eu fiquei responsável por anunciar os candidatos, descer do caminhão por uma escadinha de madeira pela parte de trás, misturar-me no meio do povão e fazer tremular uma grande bandeira do PT, subir a escadinha, fazer um mini-discurso sobre a grande vantagem de se votar nos candidatos do PT, descer a escadinha, sacudir novamente a grande bandeira vermelha, puxar palmas para os candidatos, enfim, militante faz-tudo, como a grande maioria de nós. O comício estava marcado para as 20:00 h .E o nosso grupo lá, na espera. Deu 20, 20:30, 21, 21:30 , quando ouvimos ao longe alguma coisa parecida com "o povo, unido, jamais será vencido".

Nos animamos, tomamos nossos postos, quando surge o professor Daniel com Zé Rubens quase botando os bofes para fora por causa da caminhada, por causa dos seus 150 quilos e da subida do morro do Zé da Gata. Junto com eles a retumbante marcha de umas quinze pessoas.Mesmo assim o nosso comício aconteceu. No final, sentamos na caçamba do caminhão e demos boas gargalhadas. A esperança de um governo diferente me foi tirada, mas essas gargalhadas ninguém me tira.Aliás, estou dando muitas delas agora, enquanto escrevo esse artigo.E a luta continua....

Fonte: A Autora
 
Por:  Ivilisi Soares Azevedo    |      Imprimir