Categoria Música  Noticia Atualizada em 19-12-2007

Briga de orquestras acaba na Justiça em Belo Horizonte
ONG contratada pelo governo rachou Sinfônica de MG e criou uma nova
Briga de orquestras acaba na Justiça em Belo Horizonte
Foto: http://g1.globo.com

O que nem Federico Fellini, em seu cáustico filme"Ensaio de orquestra", ousou imaginar está acontecendo na pacata Belo Horizonte: duas orquestras disputam o mesmo palco, o mesmo instrumental, o mesmo caixa e a mesma platéia. A conhecida queda dos mineiros pela conciliação e o espírito natalino não foram suficientes para estabelecer uma trégua entre os representantes dos dois grupos - um tradicional e público; o outro novo e privado. Diálogo agora só por meio de oficiais de Justiça.

No último domingo (16), os oficiais foram chamados para impedir a escolha de músicos para a nova orquestra, que atende pela sigla Icos (Instituto Cultural Orquestra Sinfônica). Quem os acionou foram advogados que representam a maioria dos músicos de uma instituição bem mais conhecida, a Orquestra Sinfônica de Minas Gerais (OSMG). A confusão não terminou aí" e, ao que tudo indica, ainda vai longe. Segundo relataram testemunhas ao G1, os representantes do Icos chamaram a polícia e registraram boletim de ocorrência contra a ação do oficial de Justiça.

Depois de fazer este ano vítimas na Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp), a guerra jurídica chegou à OSMG e está abalando o Palácio das Artes" endereço único dos dois quartéis inimigos. O que ocorreu em São Paulo, entretanto, se parece mais com o terremoto, imaginado por Fellini, que um só maestro temperamental e um único grupo de músicos rebelados podem causar. Em Belo Horizonte, a situação é mais complicada: a luta é fraticida, pois os músicos agora divididos estiveram sempre unidos na OSMG, que existe há 30 anos, sob uma única batuta.

Impasse
Em Minas, tudo começou há dois anos, tendo como modelo exatamente a Osesp - que deixou de ser pública e se transformou em Oscip (organização da sociedade civil de interesse público), ONG que pode receber verbas públicas, captar incentivos fiscais e patrocínios privados. Com a intenção declarada de melhorar as condições de trabalho da OSMG e os salários de seus integrantes, a Fundação Clóvis Salgado, do governo de Minas, assinou uma parceria com a então recém-criada Icos, que é uma oscip. Esse tipo de mudança também está em processo nas orquestras oficiais do Espírito Santo, Bahia e Rio Grande do Sul.

Na prática, os músicos da OSMG, funcionários públicos concursados, migrariam para o Icos. Eles avaliaram, entretanto, que seus direitos, como a estabilidade e as vantagens adquiridas, não estariam garantidos com a transferência. Conclusão: mesmo com o atrativo de salários triplicados para quem está em início de carreira, até hoje apenas 32 dos 74 músicos da OSMG se licenciaram para aderir à nova estrutura. E instalou-se o impasse, cuja face mais absurda e visível são as duas meias-orquestras, atuando em paralelo, no maior centro cultural do Estado.

Audições no exterior
Para tentar completar seu quadro de músicos , o Icos, que se apresentou pela primeira vez este mês com somente 17 instrumentistas, marcou, no início de dezembro, audições de músicos até em Miami e Filadélfia. Na versão em inglês de seu site, o Instituto se coloca, confusamente, no lugar da OSMG. Diz o texto: "a OSMG, localizada em Belo Horizonte, terceira maior cidade brasileira, com quatro milhões de habitantes, está fazendo audições de músicos para completar seus quadros". Informa ainda que a OSMG passa por completo processo de reformulação administrativa e artística e terá como regente titular Fábio Mechetti" que, vindo dos Estados Unidos, já está em Belo Horizonte. Mas quem ainda rege a OSMG, que faz concertos de Natal nesta quarta e quinta-feira, é o maestro Marcelo Ramos. Ele se licencia do cargo em janeiro.

As vantagens oferecidas aos músicos estrangeiros são salários que variam de R$ 65 mil a R$ 78 mil anuais, além de assistência de saúde e benefícios sociais, e oito semanas de férias pagas por ano. Ainda falando em nome da OSMG, o Icos diz que a Orquestra funciona em prédio do "famoso arquiteto Oscar Niemeyer" (Palácio das Artes) e que seus integrantes fazem turnês pelo Brasil e por Minas Gerais. Por fim, lembra que o custo de vida em Belo Horizonte é inferior ao de outras capitais brasileiras e ao das cidades americanas.

"Entendemos que o que está ocorrendo é a privatização de um patrimônio artístico e cultural público, com total desprezo pelos músicos, que nunca foram ouvidos", afirma o contrabaixista Fernando Santos, 14 anos de OSMG, que fala em nome do grupo que não aderiu ao Icos. A Fundação Clóvis Salgado, parceira da Icos, tem adotado um tom moderado. Segundo a assessoria de imprensa da Fundação, as duas orquestras conviverão pacificamente, por enquanto sob o teto do Palácio das Artes, para o bem do público mineiro, que terá agora mais opções. Mas os músicos que ficaram na OSMG questionam no Tribunal de Justiça do Estado a legalidade da parceria público-privada. Caberá aos tribunais decidir até quem tem o direito de usar o título Orquestra Sinfônica. Intriga digna de cinema.

Briga de orquestras acaba na Justiça em Belo Horizonte.

Fonte: Redação Maratimba.com
 
Por:  Felipe Campos    |      Imprimir