Categoria Geral  Noticia Atualizada em 11-01-2008

Padre baleado diz que ainda não perdoou criminosos
Sacerdote já voltou a celebrar missas, faz fisioterapia e quer retomar o curso de psicologia
Padre baleado diz que ainda não perdoou criminosos
Foto: Fabíola Gerbase/G1

Baleado no braço e de raspão no peito ao voltar de uma missa no subúrbio do Rio no dia 2 de dezembro, o padre Frank Luiz Franciscatto retoma, aos poucos e lentamente, sua rotina. Em entrevista ao G1, o sacerdote conta que é "uma missão lenta e difícil perdoar " os criminosos que o feriram e acabaram matando sua amiga Vitória Lúcia Marques Kurrik. O perdão, porém, não é impossível.

"Perdoar é uma missão nossa. Não é fácil, mas Jesus manda perdoar. Ele morreu na cruz perdoando. É preciso rezar por eles (os criminosos). É uma caminhada. É um dever como cristão e como sacerdote. Não vou dizer que já perdoei, mas estou caminhando para isso", diz, lembrando que desde a infância sabia que seguiria a carreira religiosa.

Apesar da violência, padre Frank não pensa em deixar o Rio. "Escolhi viver no Rio porque já conhecia a cidade. Estive aqui de 1995 a 1997 e sempre vim passar férias. Tenho uma ligação muito forte com essa igreja e nunca perdi."

A volta ao trabalho foi recebida com alegria pelos fiéis que freqüentam a Paróquia Santa Teresinha do Menino Jesus, em Botagogo, na Zona Sul. Padre Frank pôde celebrar no dia 2 de janeiro a missa de 30º dia de falecimento de Vitória, uma "amiga especial, muito querida, mais do que amiga, uma irmã", como gosta de dizer.

"Senti muita alegria por estar podendo retomar e celebrar essa missa. A mãe de Vitória, seus sobrinhos e outros familiares estavam presentes. Recebi com felicidade o carinho da comunidade. Como o pessoal fez homenagem para ela, me senti mais uma pessoa fazendo parte dessa família. Recebi muita força e me senti muito bem com a possibilidade de ir retomando as atividades", lembra.

"Fui tomado pelo pavor", diz padre
O sacerdote tem dificuldade de lembrar do momento em que o crime aconteceu, mas fala que manteve-se lúcido o tempo todo, mesmo depois de baleado. Ele diz que a ação aconteceu em fração de segundos e que sentiu muito medo. "É difícil lembrar do assalto. Foi tudo muito rápido. Fui tomado pelo pavor. Na hora, é um terror, com as pessoas armadas, gritando de ódio, que assusta. Parecia que eles (os criminosos) estavam com medo, assustados e apreensivos. Depois do acontecido, pensei que fosse perder o braço."

Já na ambulância, conta que veio falando com Vitória durante o trajeto até o hospital, mas sabia da gravidade do caso. "Fui conversando com ela para que ela resistisse, dando palavras de força e coragem. Ela estava viva, mas não sei se lúcida, porque não respondia. Fomos atendidos na mesma salinha. Os médicos diziam que o caso dela era mais grave."

A notícia da morte da amiga veio no dia seguinte, ainda na parte da manhã. Apesar da tristeza, ele diz que em nenhum momento se sente culpado pelo episódio, quando a catequista decidiu acompanhá-lo de Bonsucesso a Botafogo, para que não se perdesse. "Eu me senti vítima tanto quanto ela. Fiquei muito ferido. Eu e ela fomos vítimas dessa situação toda, da violência".

A rotina depois do crime
O dia-a-dia de padre Frank é dividido entre as missas que voltou a celebrar, a fisioterapia diária para recuperar os movimentos do braço, hoje com quatro pinos, e as pequenas caminhadas, acompanhadas de um enfermeiro. Ele espera também retomar as aulas na Universidade Santa íšrsula, em Botafogo, onde cursa psicologia. "Ainda faltam 3 anos para terminar o curso", diz, já pensando em telefonar para saber quando as aulas recomeçam. Como lazer, ele gosta dos mergulhos no mar, interrompidos desde dezembro.

Padre Frank tem 41 anos e nasceu em Frederico Westphalen, uma cidade do Rio Grande do Sul com pouco mais de 27 mil habitantes. Ele tem 3 irmãos, todos casados e com filhos. Sua família ainda mora no mesmo lugar, para onde sempre retorna nas férias. Segundo ele, a catequista Vitória era praticamente uma irmã e chegou a visitá-lo várias vezes no Sul.

Devoto de São Francisco de Assis (patrono dos pobres, doentes e dos animais), assim como Vitória, padre Frank diz que sabe o que dizer se um dia voltar a reencontrar a amiga.

"Eu diria muito obrigado. Muito obrigado pela vida dela. Agradeço a deus por ter oportunidade de conhecê-la. A imagem que guardo é de uma pessoa sorridente, carinhosa e simples. Ela gostava da vida e das pessoas humildes, além de ter uma devoção por São Francisco de Assis e Santa Clara."

Dois presos e dois foragidos
No dia 2 de dezembro de 2007, quando voltava de uma missa em Bonsucesso, no subúrbio do Rio, o carro do padre Frank foi atacado por homens armados, que dispararam contra ele e a professora de catecismo Vitória Lúcia Marques Kurrik. O padre foi atingido no braço esquerdo e a catequista, morreu.

De acordo com o delegado titular da 10ª DP (Botafogo), Eduardo Batista, dois suspeitos, Magno Oliveira de Paiva e José Alexandre da Silva, o Meriti, estão presos na Polinter. Os chefes do tráfico do morro Dona Marta, em Botafogo, na Zona Sul do Rio, Alexandre da Silva Inocente, o Merenda, e da Ladeira dos Tabajaras, em Copacabana, na Zona Sul, Francisco Rafael Dias da Silva, o Mexicano estão com prisão decretada. Todos vão responder por latrocínio (roubo seguido de morte).

Padre baleado diz que ainda não perdoou criminosos.

Fonte:

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Por:  Felipe Campos    |      Imprimir