Categoria Geral  Noticia Atualizada em 27-01-2008

Livro defende que bagunça pode ser a chave do sucesso
Se sua resolução para 2008 foi ser mais organizado, pense novamente
Livro defende que bagunça pode ser a chave do sucesso
Foto: Divulgação

Uma mesa cheia de papéis, uma sala bagunçada e gavetas desorganizadas. Tudo o que o mundo corporativo hoje classifica como negativo e tenta consertar com a ajuda de consultores e gestores da informação, o jornalista David H. Freedman e o professor Eric Abrahamson vêem como uma oportunidade de sucesso. E até escreveram um livro defendendo a tese.

Trata-se de "Uma bagunça perfeita" (Editora Rocco), que chega às livrarias brasileiras um ano depois do lançamento nos EUA. Na obra, os autores defendem que misturar materiais, recursos e pessoas, economizando em processos organizacionais, pode ser uma forma de gerar novas idéias e também de evitar gastos desnecessários.

Professor de Administração na Universidade de Columbia, Abrahamson teve a idéia de escrever sobre o tema ao olhar para o próprio escritório de pernas para o ar.

Junto com o jornalista Freedman" que já colaborou com publicações como "New York Times" e "Newsweek"", ele tenta provar que a bagunça pode ser a chave para o êxito profissional e empresarial. "Regras e procedimentos que acabam impedindo que os negócios sejam fechados", diz Abrahamson.

Além disso, ele afirma que a bagunça tem uma beleza que a organização não tem: "Eu prefiro a obra de Frank Gehry (arquiteto canadense conhecido por desenhar prédios como o Museu Guggenheim, na Espanha, em esboços a esmo em pedaços de papel) à arquitetura russa da era comunista, que era muito organizada."

O G1 conversou com os dois autores do livro, que sendo uma obra sobre bagunça, foi classificada de "auto-ajuda" nos EUA e virou livro de "administração e negócios" no Brasil.

Leia os principais trechos:

G1 - Como surgiu a idéia de escrever um elogio à bagunça?
Eric Abrahamson - Eu sou professor em uma organização que forma administradores. E meu escritório é uma confusão. E isso criou uma tensão na minha mente: como ensinar a administrar e, ao mesmo tempo, ser um bagunceiro. Isso criou uma tensão na minha cabeça, e eu acabei escrevendo um artigo acadêmico sobre isso. O livro só tornou essa noção mais popular, mais baseada no dia-a-dia.
David Freedman - Viemos de direções completamente diferentes. Como jornalista da área de ciências e de negócios, eu tinha entrevistado um físico sobre a aleatoriedade na natureza e no cérebro humano. Meu primeiro interesse era essa noção mais científica de desorganização. Depois, passei a me interessar na parte de negócios, como a organização e a desorganização afetam os aspectos diários da vida. Aí, eu encontrei Eric, primeiro com a idéia de entrevistá-lo para o livro, e acabei o convidando para ser meu co-autor.

G1: Uma das teses do livro é que organização demais pode prejudicar a criatividade dos negócios, fazer com que as pessoas percam oportunidades.
Eric Abrahamson - Existe a organização do tempo, que cria uma venda para oportunidades que aparecem ao longo do dia. Alguém com uma agenda flexível pode dividir o tempo entre atividades interessantes e desinteressantes, passando cinco minutos em reuniões estimulantes e atendendo longamente alguém desconhecido, mas com boas idéias. Isso pode ser feito no nível pessoal e também por empresas. É possível aproveitar as boas oportunidades que a improvisação apresenta.
David Freedman - É muito simples pensar que quanto mais organizado, melhor. Entretanto, as organizações, há um nível de bagunça otimizada. Mas, como bagunça é bagunça, não dá para classificar desorganização e colocar em uma planilha, porque isso simplesmente vai contra todo o conceito.

G1 - Isso pode ser elevado à economia mundial? Existem países que poderiam se beneficiar de um pouco mais de desorganização?
Eric Abrahamson - Eu trabalho em uma organização teuto-suíça e pensar de forma criativa, fora dos padrões, é extremamente difícil para eles. Essa empresa, que não é tão grande assim, tem mais de 8 mil regras e procedimentos que acabam impedindo que os negócios sejam fechados. Em alemão, não existe no dicionário uma palavra que defina bagunça, existe apenas falta de ordem. O conceito de bagunça simplesmente não existe.
David Freedman - Depende de como se define o sucesso. Se produzir mercadorias de alta qualidade for sua medida, então países muito bem organizados, como a Alemanha e o Japão, são bem-sucedidos. Agora, se a definição for de o quanto felizes as pessoas são, de paz, então esses dois países vão para o fundo da lista.

G1 - Vocês defendem também que, geralmente, os custos de organização não são levados em conta pelas empresas.
Eric Abrahamson - Se organização fosse de graça, tudo bem. Além disso, há um grande número de erros antes de essa organização ser atingida. É comum pessoas contratarem "personal organizers" para colocar sua vida em ordem e empresas gastarem em consultoria para se reestruturarem. Mas isso tem que ser colocado na ponta do lápis. Para mim, se eu gasto US$ 6 mil para me organizar, eu tenho que ver o retorno disso. Além disso, a bagunça pode ser linda. Eu prefiro a obra de Frank Gehry (arquiteto canadense conhecido por desenhar prédios como o Museu Guggenheim, na Espanha, em esboços a esmo em pedaços de papel) à arquitetura russa da era comunista, que era muito organizada.
David Freedman - Por exemplo, vale a pena gastar um monte de tempo arrumando a casa, em vez de fazer outras coisas? É uma pergunta que muita gente não faz. Organização demais impede que as pessoas formem novas conexões, pensem de outro jeito, usem materiais que não estão acostumadas. A bagunça pode ser a raiz da inovação, da descoberta e da mudança útil. Pode também não ser, mas a organização muitas vezes mata a possibilidade (de mudança).

G1 - Vocês usam a Al Qaeda como uma organização de sucesso que é completamente desorganizada. Existem outros exemplos?
Eric Abrahamson - A Al Qaeda funciona porque é uma bagunça. Se fosse uma burocracia, simplesmente desapareceria. As pessoas na Al Qaeda nem sabem que é (o chefe). Também tem o exemplo da pequena livraria que não organiza os livros por gênero literário, mas de acordo com a editora. Isso simplifica as coisas, corta custos e permite que pessoas procurando por um tipo de livro acabem encontrando outro totalmente diferente. É oferecendo surpresas que a livraria consegue competir com a organização das grandes cadeias de livrarias.
David Freedman - Há alguns anos, a Marinha dos Estados Unidos escreveu um artigo sobre guerras assimétricas. Isso significa que entidades muito organizadas combatem hoje inimigos completamente desorganizados, como os terroristas. Ao contrário do que ocorre no mundo ocidental, é muito difícil saber quem é quem no mundo terrorista. O terrorismo, ao contrário do Exército americano e da Otan, está em constante mudança, novas pessoas se juntam ao grupo o tempo todo, mas não respeitam um molde definido, trazem novas táticas, idéias, foram novos subgrupos.

G1 - O livro, que prega as desvantagens da organização e da categorização, também não se encaixa em nenhuma categoria. Isso foi intencional?
Eric Abrahamson - Nós quase não conseguimos publicar o livro por causa das seções das livrarias, onde tudo é organizado por tipo. Falavam para nós: se você não consegue achar uma categoria, você não pode escrever. Um absurdo.
David Freedman - Nosso agente disse desde o início que o livro precisa estar em uma categoria, enquanto eu e o Eric estávamos determinados a manter a idéia de desordem no livro. No fim, foi classificado como "auto-ajuda" (no Brasil, porém, ficará na seção "administração e negócios").

Livro defende que bagunça pode ser a chave do sucesso. Se sua resolução para 2008 foi ser mais organizado, pense novamente.

Fonte:

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Por:  Felipe Campos    |      Imprimir