Categoria Opinião  Noticia Atualizada em 18-08-2008

SAÚDE COM MORAL
Em sua coluna "Dr. Saúde", na revista encartada ao Jornal A Gazeta de 17 de agosto de 2008
SAÚDE COM MORAL
Foto: http://www.es.gov.br

Juliano Ribeiro Almeida

Em sua coluna "Dr. Saúde", na revista encartada ao Jornal A Gazeta de 17 de agosto de 2008, Dráuzio Varela comentou a oposição da Igreja Católica à política do governo federal para propaganda e distribuição de camisinhas, com o seguinte argumento: "Levar a sério a opinião dos religiosos a respeito da melhor estratégia para combater a AIDS é tão ridículo quanto contratar epidemiologistas para rezar missa e ouvir confissão". E lamentou o sofrimento que "os senhores de aparência piedosa ainda causarão em nome de Deus". Ele acusa a Igreja Católica de exercer pressão, sobretudo nos municípios do interior, para que não se distribua o preservativo entre os jovens, e denunciou os políticos que têm medo de uma perseguição moral por parte dos padres.

Mas o que o Papa e a CNBB realmente pretendem não é fazer lobby para determinar políticas públicas, com saudade dos tempos anteriores ao Estado laico. A Igreja Católica quer contribuir para a reflexão, colaborar na busca de soluções para a AIDS. E ela entende estar fazendo isso quando manifesta sua doutrina moral sobre a sexualidade, mostrando que a AIDS não é um problema que se possa resolver com paliativos que eliminem somente a proliferação e não as causas. A Igreja crê sinceramente que a AIDS é a conseqüência que a humanidade está colhendo de uma cultura que desvirtuou o verdadeiro sentido da sexualidade humana. Ela simplesmente não pode se calar diante desse quadro: os adolescentes, na escola, apertando o botão de uma máquina, são convidados a iniciar uma vida sexualmente ativa, concluindo que isso é muito normal e saudável, por ter o patrocínio do próprio governo.

Uma canção de Gilberto Gil e Jorge Mautner diz: "Os pais/ estão preocupados demais/ com medo que seus filhos caiam nas mãos dos narco-marginais/ ou então na mão dos molestadores sexuais./ E no entanto, ao mesmo tempo, são a favor das liberdades atuais!/ Por isso não acham nada demais/ na semi-nudez de todos os carnavais/ e na beleza estonteante e tão natural/ da moça que expressa no andar provocante/ a força ondulante da sua moral,/ amor flutuante acima do bem e do mal" (Os pais, no álbum Banda Larga Cordel). O mesmo Estado que distribui camisinhas às suas crianças depois se preocupa com a diminuição etária da iniciação sexual, com a gravidez na adolescência e com os inumeráveis casos de falha no sistema (camisinhas furam!). Tapa-se um buraco e rasga-se outro: para esse imenso porão das exceções, o Estado quer aprovar o aborto para resolver problemas posteriores.

De fato, não cabe à religião propor soluções científicas. Os líderes religiosos não têm competência para isso. E nem é isso também que a Igreja está pretendendo. O que a instituição católica quer, com essa oposição, é justamente que a solução para essa epidemia transmissível sexualmente deve estar numa postura moral, pois é a moral – e não a ciência – que define o comportamento sexual das pessoas. Só a vivência de valores como continência sexual antes do casamento e fidelidade conjugal é que poderão eliminar de vez a epidemia. Que nem todos estejam dispostos a isso está claro; nesses casos, soluções urgentes são também óbvias. Mas é preciso que alguém proponha o caminho da castidade, mostre sua eficácia. O que a Igreja está criticando é que as políticas públicas simplesmente não reconhecem que o caminho mais seguro é esse. Que haja pessoas decididas a romper com qualquer orientação religiosa e a viver de uma forma sexualmente livre e até promíscua, é um fato. Para esses, a Igreja não tem coisa alguma a dizer nessa matéria. Mas que essa postura seja apresentada como a normal, a oficial e a mais inteligente, financiada universalmente pelo dinheiro público, isso é inadmissível.

Quem diz que os católicos não têm o direito de contrariar a distribuição de camisinha parece desconhecer que eles também pagam impostos e vivem sob liberdade de expressão. Quem compara esse posicionamento da Igreja à inquisição medieval – da qual mais tarde ela teve que pedir perdão – esquece-se que governos, muito mais do que religiões, tiveram do que se arrepender com o passar dos séculos.

Juliano Ribeiro Almeida, 28 anos, é sacerdote católico, pároco em Itapemirim-ES. [email protected]

Fonte: O Autor
 
Por:  Juliano Ribeiro Almeida    |      Imprimir