Categoria Geral  Noticia Atualizada em 24-11-2009

Ação de rebeldes maoístas preocupa a Índia
Eles eram considerados um bando de ideólogos ultrapassados.Agora, autoridades preparam campanha para derrotá-los em Chattisgarh.
Ação de rebeldes maoístas preocupa a Índia
Foto: New York Times

É na beira do Rio Indravati, a centenas de quilômetros de distância da fronteira internacional mais próxima, que a Índia realmente acaba. Oficiais paramilitares indianos apontam metralhadoras para o outro lado do rio. A densa floresta e as montanhas do outro lado pertencem a rebeldes maoístas dedicados a derrubar o governo.

"Essa é a zona livre deles", disse P. Bhojak, um dos oficiais posicionados na margem do rio aqui nesta cidade, no estado de Chattisgarh.

Ou uma parte dela. Os rebeldes maoístas agora estão presentes em 20 estados e evoluíram para uma insurgência potente e letal. Nos últimos quatro anos, os maoístas mataram mais de 900 oficiais de segurança da Índia, um número quase tão alto quanto os mais de 1.100 membros das forças de coalizão mortas no Afeganistão durante o mesmo período.

Os maoístas antes eram considerados apenas como um bando desorganizado de ideólogos ultrapassados, mas agora os líderes indianos estão se preparando para empregar quase 70 mil oficiais paramilitares em uma longa campanha de contra-insurgência, a fim de capturar os guerrilheiros em algumas das áreas mais inóspitas e isoladas do país.


Para a Índia, a crescente insurgência maoísta é um momento de avaliação para a democracia do país e tem causado um agitado debate sobre sua decadência. No passado, a Índia absorveu um punhado de rebeldes sectários ao persuadi-los a entrar no processo político do país. No entanto, os maoístas não querem se separar, nem serem absorvidos. Eles querem derrubar o sistema.

Antes considerados personagem ao estilo Robin Hood, os maoístas alegam representar os despossuídos da sociedade indiana, particularmente os grupos tribais indígenas, que sofrem com alguns dos índices mais altos de pobreza, analfabetismo e mortalidade infantil do país. Muitos intelectuais e até alguns políticos já chegaram a simpatizar com a causa, mas a crescente violência maoísta tem forçado uma reconsideração sobre se ainda devem ser tolerados.

"A raiz disso é a pobreza e a privação", disse Ramachandra Guha, conhecido historiador que vive em Bangalore. "Os maoístas são uma manifestação infeliz disso. É um problema sério, que não vai desaparecer".

O rápido crescimento econômico da Índia a transformou em uma potência global emergente, mas também aprofundou acentuadas desigualdades sociais. Os maoístas acusam o governo de tentar tirar grupos tribais de suas terras para obter acesso a matéria-prima; eles sabotaram estradas, pontes e até o fornecimento de energia.

Embora os objetivos políticos maoístas pareçam inatingíveis, analistas alertam que eles não serão facilmente eliminados.

Aqui, no estado de Chattisgarh, maoístas dominam milhares de quilômetros quadrados de território e chegaram aos estados vizinhos de Orissa, Bihar, Jharkhand e Maharashtra, parte do chamado Corredor Vermelho, que vai do centro ao leste da Índia.

A violência explode quase diariamente. Nos últimos cinco anos, os maoístas detonaram mais de mil dispositivos explosivos improvisados em Chattisgarh. Nas últimas semanas, eles incendiaram duas escolas em Jharkhand, além de terem sequestrado, depois liberado, um trem de passageiros na Bengala Ocidental, enquanto realizavam um ousado ataque contra um posto policial na mesma área.

Esforços para iniciar negociações de paz estão a caminho, mas até agora, nenhuma ação concreta. Com a ofensiva do governo cada vez mais intensa, as pessoas que mais se sentem vulneráveis são os moradores de vilas tribais que vivem nas florestas de Chattisgarh, onde a polícia e os maoístas, às vezes também chamados de naxalitas, já estão combatendo.

"Antes", disse um morador da vila, "tínhamos medo dos tigres e dos javalis. Agora, temos medo das armas dos naxalitas e da polícia".

A campanha de contra-insurgência, chamada de Operação Caçada Verde, estabelece o envio de forças policiais e paramilitares às florestas para confronto com os maoístas e conseguir expulsá-los de bases de operações mais recentes para áreas florestais mais remotas onde possam ser contidos.

"Pode levar um ano, dois, três ou quatro", previu Vishwa Ranjan, chefe da polícia estadual de Chattisgarh, acrescentando que perdas seriam inevitáveis. "Não existe doutrina de morte zero", disse ele.

Quando uma área for liberada, o plano também prevê a introdução de projetos de desenvolvimento, como estradas, pontes e escolas, na esperança de ganhar apoio das tribos. Também conhecidas como adivasis, essas pessoas enfrentaram décadas de exploração por parte de autoridades locais, agiotas e empreiteiras privadas, conforme informaram vários relatórios governamentais.

"Os adivasis são o grupo menos incorporado à economia política da Índia", disse Ashutosh Varshney, especialista sobre as questões do país da Brown University, em Providence, Rhode Island. Ele chama a situação dos adivasis de "uma das buscas não-concluídas da democracia indiana".

A cerca de 65 km de Laheri, um centro de processamento pertencente à Essar Steel está fechado há meses. Os maoístas sabotaram os dutos subterrâneos da Essar, de 267 km de extensão, que transferem material de um dos depósitos de minério de ferro mais cobiçados da Índia para a Baía da Bengala. "Disse a meus gerentes que formaria uma equipe e faria os reparos", disse S. Ramesh, gerente de projetos da Essar. "Mas não posso prometer por quanto tempo isso vai durar". O centro da Essar é parte de um empreendimento mais amplo do governo indiano e de várias mineradoras privadas para extrair os recursos de terras cheias de guerrilheiros. Ramesh disse que 70% do minério de ferro da Índia ficam em estados infiltrados por maoístas; a produção nesta área está estagnada bem abaixo de seu potencial.

Ramesh teme que o crescimento da Índia seja prejudicado se o país não puder explorar seus próprios recursos naturais. Mesmo assim, ele também afirmou que a operação de contra-insurgência não seria uma panaceia. "Ela sozinha não vai ajudar", afirmou. "Não estamos combatendo um inimigo. Estamos lutando contra cidadãos."

Com policiais morrendo em grandes números e maoístas realizando ataques mais ousados, o debate sobre a insurgência tem ficado agitado nos salões intelectuais da Índia, nas páginas de opinião e nos talk shows.

O escritor Arundhati Roy recentemente pediu diálogos incondicionais e disse à CNN-IBN que os maoístas tinham motivo para pegar em armas por causa da opressão do governo. Outras pessoas, que lamentam o sofrimento dos adivasis, afirmam que a violência maoísta se tornou intolerável.

"Você não pode defender a tática", disse Varshney, professor da Brown University. "Nenhum estado moderno pode aceitar ataques a instituições do estado, mesmo quando o estado está errado". Os moradores locais estão no meio da confusão. Recentemente, no mercado da vila de Palnar, o cenário era de mulheres descalças equilibrando recipientes de água na cabeça, homens desnutridos saindo da floresta para comprar vegetais, nozes ou um fermentado para produzir licor local. Enquanto os ambulantes espalhavam suas mercadorias em lençóis, o gabinete do governo, ali perto, estava atrás de um portão trancado.

"É uma situação ruim", disse um morador da vila, que pediu para não ser identificado por temer retaliação de ambos os lados. "As atividades dos naxalitas aumentaram. Eles fazem reuniões na vila. Eles dizem às pessoas que elas têm que lutar. As pessoas aqui não votam por medo".

Outro homem chegou em uma motocicleta, vindo de uma vila mais distante. Há vários meses, a polícia fez uma incursão em sua vila e prendeu mais de doze pessoas, acusando-os de colaborar com a insurgência. Alguns eram simpatizantes dos maoístas, segundo o homem da motocicleta, mas a maioria foi levada equivocadamente pela polícia. Agora, a Operação Caçada Verde prevê mais confrontos.

"A vida é muito difícil", disse o homem. "Os naxalitas pensam que estamos ajudando a polícia. A polícia acha que colaboramos com os naxalitas. Vivemos com medo de quem possa nos matar primeiro."

Hari Kumar contribuiu com a reportagem

Tradução: Gabriela dAvila


Fonte:

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Por:  Catarina Rezende de Carvalho    |      Imprimir