Categoria Opinião  Noticia Atualizada em 16-07-2010

O QUE SE É, O QUE SE FAZ
Por que insistiram tanto em colocar o assunto “goleiro Bruno” na seção de esportes dos jornais?
O QUE SE É, O QUE SE FAZ

Por que insistiram tanto em colocar o assunto "goleiro Bruno" na seção de esportes dos jornais? Por que isso não foi publicado, desde o início, nas páginas policiais? O que tem a ver a monstruosidade daquelas pessoas envolvidas no assassinato de Eliza com as notícias esportivas? O fato de um profissional do futebol ter cometido um crime fora do campo constitui uma manchete futebolística?

Isso me leva a pensar na nossa identidade e nos rótulos que são colocados em nós. O Bruno é um homem rico, um cidadão com algumas passagens pela polícia, um monte de outras coisas... e também um profissional do futebol. Mas se prefere rotulá-lo simplesmente como "goleiro do Flamengo". Talvez seja porque assim se vende mais jornal e se consegue mais audiência.

Zico, membro da direção do clube, veio a público tentar amenizar a situação, mas acabou reforçando a ideia que inicialmente quis superar. Ele disse que isso não pode se repetir, para que os torcedores não se envergonhem do time. Que motivo um flamenguista teria para se envergonhar porque um jogador do seu clube do coração cometeu um crime? Esporte é esporte, justiça é justiça. Um flamenguista deveria se envergonhar se Bruno levasse um gol de forma vexatória, isso sim! Quem matou Eliza não foi o Flamengo, mas Bruno e sua gangue. Ele não matou por ser do Flamengo. O que tem a ver o Flamengo com isso?

O nome próprio do suspeito dessa barbárie não é "Goleiro Bruno". O nome é simplesmente Bruno. No momento, ele era goleiro do Flamengo. Mas ele não nasceu goleiro do Flamengo. E certamente não o seria para sempre. Uma série de circunstâncias o levou a desempenhar atualmente essa função social.

Particularmente, não gosto de acoplar ao nome próprio das pessoas o pronome de tratamento oficial que lhes cabe. Isso pode levar a uma confusão entre a identidade e a atividade, isto é, entre o que a pessoa é e o que ela faz. Ninguém é pura e simplesmente o que faz; é muito mais. Enquanto eu me refiro a alguém como médico, por exemplo, posso até chamá-lo de doutor; mas enquanto me refiro à mesma pessoa em família ou amizade, ou num outro universo de significados, não faz sentido chamá-lo de doutor. Eu só chamo de pai àquele homem que é pai para mim. Não chamo de pai outros homens só porque eles têm filhos.

Por causa disso, não costumo assinar "Padre Juliano". É claro que sou padre vinte e quatro horas por dia, mas nem tudo o que eu fizer será por ser padre que estarei fazendo. Outro dia alguém me viu sair de um supermercado com uma sacola de compras e dava para ver uma latinha de cerveja dentro dela. Foi comentário. "Ué, o Padre comprando cerveja?". Não! O Padre celebra missa, atende confissões, visita a enfermos. Mas eu não estava comprando cerveja enquanto padre, ou seja, no exercício do sacerdócio. É que o Juliano estava no seu dia de folga e simplesmente queria assistir a um filme e tomar uma cerveja para refrescar. Qual o problema?

A felicidade de uma pessoa consiste nela ser o que é, e não o que imaginam ou desejam que ela seja. A identidade de alguém não pode se esgotar no que esse alguém fez ou faz. O fazer é importante para ir construindo o ser, mas o ser não se limita ao fazer. Assim, Jesus não se encontrou com "a mulher adúltera", nem com "o cego de nascença". Ele conheceu uma pessoa que era muito mais do que um pecado – ainda que grave – de adultério; ele conheceu uma pessoa que era muito maior do que uma deficiência visual. "O que o homem vê não é o que importa: o homem vê a face, mas Deus olha o coração" (1Samuel 16,7).

Fonte: O Autor
 
Por:  Juliano Ribeiro Almeida    |      Imprimir