Categoria Cinema  Noticia Atualizada em 06-10-2010

"O Brasil vai ser o mesmo depois do filme", diz Padilha
Diretor nega que "Tropa de elite 2" seja panfletário ao falar de corrupção. Wagner Moura conta que deputados impediram filmagens no Congresso.

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José Padilha até se esforça em falar de cinema, mas quando o assunto é "Tropa de elite" a conversa acaba migrando para temas mais tortuosos, como corrupção, pirataria e violência urbana. "Acredito em cinema político, embora não só nele, porque o entretenimento também é válido. Mas quero que meus filmes mobilizem as pessoas de alguma forma", disse o cineasta nesta quarta-feira (6), no Teatro Municipal de Paulínia, onde na noite de terça (5) aconteceu a première de "Tropa de elite 2".

Na nova – e definitiva, segundo o diretor – aventura do Capitão Nascimento, o personagem aparece dividido entre as ideologias de esquerda e direita. A primeira é representada na figura de um ativista dos direitos humanos que questiona os métodos de tortura do Bope – a quem o policial se refere como "intelectualzinho de m... que quer voto de maconheiro". Já a direita, é mostrada por meio dos políticos que atuam na área da segurança pública – mais preocupados com reeleição, nem que para isso sejam necessárias alianças com as milícias das favelas.

"Esses conceitos de esquerda e direita estão bastante confusos hoje. A diferença entre a Dilma e o Serra, no fundo, é o marketing. O Lula é esquerda quando propõe o bolsa-família, mas quando o assunto é o Banco Central, é um político de direita", dispara o cineasta.

Nem Wagner Moura escapa do debate. Questionado sobre o forte esquema antipirataria que cercou a primeira exibição de "Tropa de elite 2" em Paulínia – que incluiu revistas em bolsas de convidados e portas com detectores de metal – o ator também emplacou seu discurso.

"Pirataria não é democratização da cultura. Essa estratégia proteção que vocês viram ontem é resultado de um trauma que sofremos", afirmou Moura, se referindo à cópia pirata de "Tropa de elite" (2007) que foi parar nas bancas dos camelôs e foi vista por cerca de 11 milhões de pessoas antes da estreia. "Eu vi gente dizendo loucuras, que o pirata foi estratégia de divulgação nossa. O que a gente sofreu foi um roubo!".

"Pirataria não respeita direito trabalhista, pratica sonegação fiscal, além de promover omissão policial. O PM deveria prender o camelô que fosse flagrado com sua banquinha. Sem contar que é uma concorrência desleal com o cara que tem sua loja de DVDs e paga seus impostos", completa Padilha, que teve orientação do Bope para garantir que o filme não vazasse antes da estreia oficial, marcada para sexta (8), em 636 salas do país.

Eleição

"Tropa de elite 2" faz uma crítica mordaz aos ao governo e ao Congresso. Um deputado chega a ser espancado em cena – numa sequência que foi ovacionada pelo público de Paulínia com gritos e aplausos. O que acabou gerando especulações de que a data de estreia do filme teria sido alterada para não influenciar votos dos espectadores nas eleições.

"O filme pode ser chamado de panfletário, mas é preciso ver se essa acusação tem fundamento. No ‘Tropa 1’ fomos chamados de fascistas, mas o Capitão Nascimento tentou fechar o Congresso? Tentou impedir o trabalho dos meios de comunicação? Não.", dispara o diretor. "Não fiz o ‘Tropa 2’ com o objetivo de influenciar as eleições. Infelizmente, o Brasil vai continuar o mesmo depois do filme. Fiz para trabalhar com amigos e falar o que acontece no meu país".

A atriz Tainá Muller, que na história interpreta a jornalista investigativa Clara, é mais otimista. "Torço para que nosso filme reverbere e ultrapasse todas as fronteiras, especialmente nesse ano de eleição".

Congresso vetou filmagens
Padilha tentou filmar algumas das cenas de "Tropa de elite 2" no Congresso, mas teve o pedido negado. Acabou executando a sequência em estúdio.

"Desde que anunciei que o filme falaria de corrupção, alguns políticos já saíram se defendendo, dizendo que a história não era inspirada neles", ironizou o diretor. "É sim baseado em fatos reais, embora tenhamos modificado boa parte".

O cineasta cita a invasão de Bangu em 2003, quando o traficante Fernandinho Beira-Mar tomou o presídio e o então ativista Marcelo Freixo (hoje deputado pelo PSOL) intermediou a negociação entre os presos e o Bope. "O Freixo foi o único cara que inspirou diretamente um personagem, o Fraga [Irandhir Santos]", explica Padilha. "Mas quando vi no jornal foto de candidato posando de braço dado com miliciano bandido e assassino, não poderia deixar um fato como esse de fora da história".

Na época da proibição das filmagens no Congresso, no início do ano, ator Wagner Moura chegou a perguntar ao então deputado Michel Temer os motivos. "Ele me disse que eram apenas ‘as normas da casa’".

O drama do Capitão

Mas nem tudo é política em "Tropa de elite 2". Na história – que dá um salto de 15 anos em relação ao original – o agora Coronel Nascimento aparece mais descrente com a polícia, tentando melhorar sua relação com o filho adolescente, que questiona a fama de policial violento e assassino do pai.

"Exploramos a fundo o emocional no Nascimento", explica o roteirista Bráulio Mantovani. "Um bom protagonista tem que sofrer mais".

Tanto Mantovani, quanto Padilha e Moura garantem que "Tropa de elite 2" é superior ao primeiro filme. "A fotografia das cenas da invasão de Bangu é resultado de um trabalho excepcional do Lula Carvalho. Também acredito que as cenas de ação estão mais bem filmadas", enaltece Padilha.

Moura acredita que o grande mérito do filme é "unir pensamento e entretenimento". "É uma história que emociona e pode gerar um debate que me interessa muito. Fiquei feliz quando vi que o primeiro filme gerou tanta discussão, inclusive aquela em que fui chamado de fascista", ironiza.

"Se ‘Tropa’ não fosse um bom filme, com atuações tão memoráveis, talvez as pessoas não se interessariam tanto pelo debate", completa o roteirista.

Fonte: Dolores Orosco Do G1, em Paulínia
 
Por:  Wellyngton Menezes Brandão    |      Imprimir