Categoria Opinião  Noticia Atualizada em 18-10-2010

A QUESTíO DO BAFÔMETRO
A negativa de alguns motoristas de veículos automotores de se submeterem ao teste do bafômetro, para se aferir a quantidade de álcool no sangue, é o assunto em destaque na mídia.
A QUESTíO DO BAFÔMETRO

A negativa de alguns motoristas de veículos automotores de se submeterem ao
teste do bafômetro, para se aferir a quantidade de álcool no sangue, é o assunto em
destaque na mídia.

Igualmente, o grande número de mortos e feridos envolvidos em
acidentes de trânsito. O que vem deflagrando intensa atividade legislativa e
regulamentar do Estado.

Mas, é inegável, o personagem principal dessa movimentação normativa e
preventiva, sem coadjuvantes, é o bafômetro. Este instrumento auxiliar das autoridades
de trânsito foi consagrado como prova certa e inquestionável. Aí que reside sua
polêmica.

Para muitos, a não submissão do motorista aparentemente (ou flagrantemente)
embriagado ao teste do bafômetro, escudado na garantia universal e secular da não
auto-incriminação, constituir-se-ia em óbice intransponível para a penalização do
condutor infrator, o que o deixaria impune, mesmo tendo ingerido bebida alcoólica.

O raciocínio é equivocado. Em verdade, o teste do bafômetro constitui-se apenas
em uma, de muitas, provas colocadas à disposição das autoridades de trânsito e
judiciárias. O fato de sua sofisticada e precisa verificação do teor alcoólico não
transforma este precioso instrumento em prova única, nem estabelece uma hierarquia
entre as provas.

Não adianta fazer uma listinha, nosso ordenamento jurídico adotou um modelo
aberto de perscrutação da culpa. Em outras palavras, todos os meios de prova
moralmente legítimos e não proibidos pela lei podem ser utilizados para
responsabilização civil e penal dos motoristas infratores, com a imposição das sanções
cabíveis.

Inexistindo entre todas as provas admissíveis uma ordem de credibilidade, uma
preferência legal, que mais agradaria a autoridade ou o magistrado para busca da
verdade. Esses agentes são livres para apreciação da prova, mas devem sempre
motivar suas razões.

Por exemplo, a recusa de um suposto pai a se submeter a exame de DNA pode
ser suprida pelo depoimento de vizinhos e parentes que atestem a intensa atividade
sexual vivida pelos genitores da criança no período que precedeu a concepção, além de
sinais físicos assemelhados ao do suposto pai. Da mesma forma, um estupro pode ser
positivado pelo depoimento de testemunhas e da própria vítima quando, em perfeita
sintonia e com riqueza de detalhes, revelarem sem sombra de dúvidas toda a
atrocidade sofrida pela mulher ofendida em sua integridade física e psíquica, mesma
na ausência de confissão do acusado em seu interrogatório. Ainda, nos casos de
lavagem de dinheiro e mercado de capitais o próprio luxuoso ou vasto patrimônio do
investigado e de sua família, em descompasso com os rendimentos auferidos, podem
caracterizar o delito, quando esbarrar a investigação nos sigilos bancário e fiscal.

A regra para a prisão em flagrante do motorista embriagado é a mesma.
Contenta-se esta hipótese de custódia provisória com sua demonstração por quaisquer
meios admitidos e não vedados pelas leis. A ausência da realização do teste do
bafômetro em nada prejudica a necessária segregação cautelar daquele que ousa
colocar em risco a vida de todos os pedestres e condutores de veículos automotores,
principalmente daqueles encarregados do transporte coletivo de passageiros e de
cargas perigosas, mas desde que positivada a sincera possibilidade de embriaguez por
outras provas.

A voz de prisão emanada pela autoridade de trânsito, mesmo sem o teste do
bafômetro, assim, configurará legitima hipótese de estrito cumprimento do dever legal.
Sendo pacífico o entendimento de juízes e tribunais superiores de que o depoimento
das autoridades policiais que fizeram cessar o curso da infração penal não pode ser
desmerecido pela simples alegação de parcialidade ou interesse pessoal, porque
destacados pelo Poder Público para o escopo único de zelar pela incolumidade dos
cidadãos. Para o condutor detido restará o ônus da prova da alegação de versão
mendaz apresentada pelos agentes de trânsito, o que ao final será sopesado pelo
magistrado.

Se é certo que o desejo de não submissão ao teste do bafômetro caracteriza
hipótese de recusa legítima, melhor seria traduzi-la como perda da extraordinária
oportunidade de, indubitavelmente, rechaçar toda a fúria estatal que recairá sobre o
próprio motorista, desde a primeira abordagem, até conclusão final dos procedimentos
administrativo e judicial de apuração da infração. Poucas provas não se confundem
com ausência de provas. Acaso desfavorável o veredicto para o motorista, terá este que
se contentar com o diminuto, mas suficiente, material probatório carreado para os
autos do processo, respondendo às sanções cominadas ao caso concreto.

Em conclusão, o apego à garantia da não auto-incriminação não se constitui em
imunidade material ou processual para motoristas que se atreverem a dirigirem
voluntariamente embriagados, expondo toda a coletividade a risco. Importa tãosomente
na exclusão de apenas uma, de muitas, provas colocadas à disposição das
autoridades de trânsito e do Estado-Juiz para julgamento do ilícito. Podendo o
motorista beberrão, exercido seu direito de espernear, ter que "lecionar" suas aulas de
garantias constitucionais no xadrez, quiçá dividindo o mesmo beliche daquele que se
valeu, sem sucesso, do direito ao silêncio.

Fonte: Carlos Eduardo Rios do Amaral
 
Por:  Carlos Eduardo Rios do Amaral    |      Imprimir