Categoria Geral  Noticia Atualizada em 15-03-2011

Ex-Nuclen: No Brasil, há lobby violento da indústria nuclear
O medo de um grande acidente nuclear que hoje vive o Japão deveria desestimular projetos de construção de usinas nucleares no Brasil, opina o professor Joaquim Francisco de Carvalho.
Ex-Nuclen: No Brasil, há lobby violento da indústria nuclear
Foto: terramagazine.terra.com.br

Ele, que já foi um dos diretores da empresa responsável pelas usinas de Angra 1, 2 e 3 (antiga Nuclen, hoje chamada de Eletronuclear), acredita que o Brasil não precisa correr tamanho risco e revela: "Há um lobby violentíssimo da indústria nuclear".

"As empresas em países mais desenvolvidos investem muito em lobby", diz. Para aliviar o custo deles, eles empurram para cima da gente", critica Carvalho, que também chegou a atuar como coordenador do setor industrial do Ministério do Planejamento. Ex-defensor da energia nuclear, tornou-se crítico. "Saí por isso mesmo, não concordava com essas coisas".

O Japão vive o temor de um vazamento nuclear de grandes proporções depois que o terremoto no País afetou o sistema de refrigeração de três dos seis reatores de Fukushima, ao norte de Tóquio. Nesta segunda-feira (14), a Marinha dos Estados Unidos confirmou que detectou vazamento de radiação no local, embora tenha afirmado em comunicado que os níveis eram baixos.

Carvalho, hoje aposentado e professor da Universidade de São Paulo, calcula que apenas sistemas hidrelétricos, eólicos e térmicos seriam suficientes para gerar energia para a população brasileira até 2040. Até lá, os brasileiros deverão somar 215 milhões de habitantes, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

A Eletronuclear se antecipou nesta segunda e declarou que as usinas de Angra têm barreiras de aço para proteger contra terremotos. Qualquer usina é projetada dessa forma, rebate o especialista. Ainda assim, os acidentes acontecem porque "não há obra completamente segura". "Correr esse risco quando não se precisa é burrice", conclui.

Leia a entrevista.

Terra Magazine - O senhor acha que o acidente no Japão vai comprometer investimentos em projetos para energia nuclear, como os que o Brasil tem pendentes?
Joaquim Francisco de Carvalho - O Brasil simplesmente não precisa correr o risco de usar usinas nucleares para gerar energia elétrica. O Japão infelizmente correu o risco e aconteceu esse terremoto horrível. Mas eles não tinham alternativas. A França também não tem alternativas e corre um risco grande se houver um acidente nuclear. A Alemanha tem consciência disso e a chanceler Angela Merkel suspendeu o plano que estendia o prazo de vida de usinas nucleares no país. Isso porque a Alemanha não tem os recursos hidrelétricos que o Brasil tem. Está investindo pesadamente em energias alternativas.

Quais são as opções alternativas?
O potencial eólico no Brasil é muito grande. E não é aproveitado. Ele pode ser interligado à geração hidráulica de forma que não exista o problema que existe em outros países, de uma geração intermitente. E ainda contribui para quando há seca.

O acidente muda um pouco a ideia de que a energia nuclear possa ser vista como energia limpa, não?
Sem dúvida, não é assim. Eu ainda estou muito abalado com isso que aconteceu no Japão, mas eles correram o risco.

No Japão, três reatores superaqueceram. Esse é um risco sabido?
Nenhuma obra é perfeita. É um risco pequeno, mas é um risco. E se não há necessidade, não há por que correr esse risco. O Japão fez essa opção porque precisava, não tem reservas de petróleo nem potencial hidrelétrico, nem nada.

Mas esse é o principal perigo?
Há muitos riscos, não dá para dizer qual é o maior, o principal problema mesmo é que acidente nuclear não é que nem acidente aéreo. Se um avião cair, é uma tragédia para aquelas famílias, mas a tragédia não passa do local e do momento da queda. Num acidente nuclear, pode ser que não morram muitas pessoas na hora, mas as consequências duram por anos. É uma tristeza. É um desespero total. E um acidente nuclear pode se espalhar por um continente inteiro.

O Brasil trabalha na instalação da usina nuclear de Angra 3 e tem ainda a proposta de construção de uma usina nuclear no Nordeste, entre Pernambuco e Bahia.
Não é necessário. Isso é porque há um lobby violentíssimo da indústria nuclear. As empresas em países mais desenvolvidos investem muito em lobby, porque energia nuclear é muito caro. Então, para aliviar o custo deles, eles empurram para cima da gente.

Estamos comprando a ideia?
Estamos comprando. É como a história do bonde. O caipira nunca tinha visto um bonde, só andava a cavalo, e achou uma maravilha quando viu. O carioca muito malandro se aproveitou. Vendeu o bonde pra o caipira levar pra roça. Nós estamos comprando o bonde. Correr o risco das nucleares quando não se precisa é uma burrice.

A Alemanha, por exemplo, celebrou acordo com o Brasil para construção de usinas em Angra. É um dos países que faz esse lobby?
A Alemanha ainda tem consciência. Pior são os Estados Unidos. Eles são contra as hidrelétricas no Brasil, não aceitam que um país como o Brasil avance numa área diferente.

Fonte: terramagazine.terra.com.br
 
Por:  Wellyngton Menezes Brandão    |      Imprimir