Categoria Ciência e Saúde  Noticia Atualizada em 11-07-2011

Leite materno vira mercadoria em site especializado nos EUA
"Tempo é dinheiro", diz americana que pôs anúncio no Only the Breast. Vendedora ganhou US$ 1.200 por mês com vendas, segundo revista.
Leite materno vira mercadoria em site especializado nos EUA
Foto: g1

A norte-americana Tina Faye resolveu solucionar de uma vez, nesta semana, dois problemas que a incomodavam há mais de seis meses, quando deu à luz um bebê. Seu filho não tomava o leite materno que ela produzia em grande quantidade e acabava sendo jogado fora, e desde que ele nasceu ela não conseguia trabalhar e ganhar dinheiro. Faye ligou o computador, digitou "vender leite materno" no Google e encontrou um site que faz a conexão entre mães que negociam leite humano nos Estados Unidos. Na última segunda-feira (4) ela pôs um anúncio oferecendo seu leite para quem quiser comprar, até mesmo homens. Em 24 horas, seu anúncio foi visto por mais de cem pessoas.

"Sou uma jovem e saudável mãe de 2. Tenho um pequeno suprimento de leite materno e estou querendo começar a prover um suprimento regular para qualquer pessoa que queira leite materno fresco. Meu bebê não toma e eu tenho jogado fora o leite que produzo! Que desperdício", dizia seu anúncio. Ela pede US$ 3 (o equivalente a cerca de R$ 5) por cada 30 ml do leite que produz. "Tempo é dinheiro", disse Faye, em entrevista ao G1, ao explicar o que a levou a vender o leite que produz. "Eu preciso do dinheiro e meu filho não toma o leite, que acaba se estragando", contou.

Faye é parte de um mercado crescente e controverso nos Estados Unidos. Cada vez mais mulheres vendem e compram leite materno no país com a ajuda na internet, uma tendência que muitas mães brasileiras acham estranha e que a pediatra Ana Maria Escobar diz que pode até ser perigosa. Para as envolvidas no comércio, entretanto, é algo normal.

Segundo enquete realizada na principal página de negociação de leite materno, 89% dos mais de mil votantes acham que as mulheres devem ser compensadas por compartilharem o leite materno. "Aqui, tudo o que demanda trabalho, faz você gastar o seu tempo, é valorizado e pode ser compensado financeiramente", explicou ao G1 a brasileira Mônica Mello, que mora em Nova York há 12 anos e acha normal a venda de leite materno na cultura americana.

Benefício mútuo
Até recentemente, nos Estados Unidos, o leite materno era oferecido gratuitamente por voluntários ou disponibilizado em bancos de leite como os que também existem no Brasil, e negociado de forma esporádica em listas de classificados, como o Ebay. Desde que o site Only The Breast entrou no ar, no início de 2010, entretanto, já atraiu mais de 3.000 mães interessadas em comprar e vender leite materno.

E o mercado pode ser bastante lucrativo, por mais que o preço de US$ 3 por 30 ml pareça baixo. Faye alegou que faz pouco tempo que anuncia o leite que produz, e ainda não tem noção do quanto pode ganhar. Mas um levantamento publicado pela revista americana "Wired" mostrou casos de mães que ganham até US$ 1.200 (cerca de R$ 1.900) por mês apenas com a venda de leite materno.

Segundo Chelly Snow, fundadora do site, a ideia veio quando ela deu à luz, em 2009 e começou a valorizar a importância do leite materno para o desenvolvimento do bebê. Na página do Only the Breast, ela explica que sua ideia é, em primeiro lugar, ajudar às mães que precisam comprar, e oferecer uma compensação financeira às mães que têm o trabalho de tirar e enviar o leite que produziam.

Além de promover encontro entre compradoras e vendedoras de leite, o site criado por ela promove a amamentação, defendendo como melhor forma de manter um bebê saudável. A página ensina como retirar e armazenar o leite, bem como indica formas de enviar pelo correio sem risco de estragar a "mercadoria".

A cada dia, mais de 30 anúncios novos de compra e venda são incluídos no Only the Breast. Atualmente, mais de mil anúncios de oferta de leite materno estão disponíveis no site. Muitos deles trazem fotos, além de descrições detalhadas sobre os hábitos e a alimentação das mães, como uma propaganda da qualidade do leite que é oferecido.

O retorno no país foi tão positivo que o grupo já permite inclusão de anuncios até do Reino Unido e da União Europeia. Snow rejeitou o pedido de entrevista do G1, entretanto, alegando que era um mercado fora da rota do site dela, já que o Only the Breast não permite a venda internacional do leite materno para o Brasil.

Debate cultural
Faye, a americana que anunciou o leite dela à venda nesta semana concorda que não há nada demais neste processo. "Acho ridículo ver mulheres dizendo que é nojento comprar ou vender leite materno ou algum ‘fluido corporal’ de outra pessoa. Eu garanto que a maioria dessas mulheres toma o fluido corporal de vacas, e ainda paga caro por isso", disse, em entrevista ao G1.

A ideia de compra e venda de leite materno não parece ter a mesma força no Brasil, e a pediatra Ana Maria Escobar, do Instituto da Criança (em SP), disse ao G1 que nunca ouviu falar de nada parecido. "É esquisito", disse. "Aqui há vários bancos de leite, pois algumas mães produzem muito e podem ajudar as que não conseguem amamentar. Nunca vi esse leite ser comprado."

Segundo ela, um site como o Only the Breast não tem um controle total sobre a procedência e a qualidade do leite, ao contrário do que costuma acontecer em bancos de leite. "É preciso saber se a mãe teve os cuidados de saúde e higiene corretos, senão submete-se a criança a um risco desnecessário", disse.

A designer Mônica Mello, entretanto, explicou que a cultura americana aceita bem este tipo de coisa. Depois de morar 12 anos em Nova York, e de ter dois filhos no país, ela conta em seu blog (mozinha.com) a experiência de uma mãe brasileira na cultura americana. "Eu já acho normal a ideia de comprar e vender leite materno. Amamentar não é prático, dá trabalho, e por isso é aceito que as mães vendam o leite", disse.

Ela conta que sua primeira filha, Luna, hoje com 4 anos, foi alimentada apenas com fórmula, mas que quando teve o segundo filho, Lorenzo, de 6 meses, começou a produzir e a retirar muito leite com uma bomba elétrica, que usava para alimentar ele e ainda sobrava. Mônica diz que chegou a tentar doar o leite a entidades que funcionam com ajuda de voluntários, mas acabou não conseguindo por questões burocráticas, que fazem um forte controle sobre as doadoras.

Ela disse que não conhecia o Only the Breast, mas que acha uma ideia boa. "Eu venderia leite materno, sim. Se eu doaria, por que não iria vender? Lógico que prefiro doar para quem precisa, afinal, são crianças, é uma caridade, mas se não posso doar e posso vender, não vejo motivo para não fazer isso."

Fonte: g1
 
Por:  Wellyngton Menezes Brandão    |      Imprimir