Categoria Opinião  Noticia Atualizada em 23-04-2012

A EVOLUÇíO DO GÊNERO
“A crônica tem uma característica diferente, ela é imediatista. Somos ligados às coisas imediatas. Atuamos diante das coisas presentes”.
A EVOLUÇíO DO GÊNERO

Durante a primeira Bienal Rubem Braga, realizada no ano de 2006 em Cachoeiro de Itapemirim (evento literário hoje consolidado como o mais importante da região sul do Espírito Santo) tive a oportunidade de conversar com o cronista, poeta e professor Adriano Spínola, no Teatro Municipal. Essa é uma das finalidades da Bienal colocar frente a frente o escritor/ palestrante com o leitor/expectador. Contato, na maioria das vezes, quase impensável para ambos. O que realmente fascina na feira literária é, sem dúvida, essa proximidade.

Spínola proferiu uma palestra intitulada "A Crônica Contemporânea". Eu, na época, já arranhava meus devaneios literários em publicações dos jornais locais. Aliás, desde 1998, diga-se de passagem. Foi na Bienal Rubem Braga que, outro grande nome da literatura brasileira, Afonso Romano de Sant’Anna, após autografar meu exemplar da obra "A sedução da palavra", me disse para criar um blog como meio mais rápido e fácil para publicar meus textos. Até então detinha a emplacar os artigos somente no jornal impresso sem enxergar a verdadeira revolução que estava a minha frente: as novas mídias e ferramentas da internet para divulgação dos trabalhos. Hoje, nem se fala, se passar batido um arroubo criativo no Twitter ou Facebook eu fico para morrer!

Por isso tenho certeza de que a evolução do gênero ‘crônica’ é capaz de acompanhar a velocidade tecnológica, pois "só o brasileiro é capaz de dar dribles desconcertantes no futebol e na escrita".

A palavra crônica vem do latim chronica, que significava, no início da era cristã, o relato de acontecimentos em ordem cronológica. No século XIX, com o desenvolvimento da imprensa, essa modalidade de escrita passou a fazer parte dos jornais. Ela apareceu pela primeira vez em 1799, no Journal de Débats, publicado em Paris.

Essa prática foi trazida para o Brasil na segunda metade do século XIX e era muito parecida com os textos publicados nos jornais franceses. José de Alencar foi um dos escritores brasileiros a produzir esse tipo de texto nesse período.

A crônica brasileira foi, gradualmente, distanciando-se daquela originada na Europa. Ela passou a ter um caráter mais literário, fazendo uso de linguagem mais leve e envolvendo poesia, lirismo e fantasia.

A crônica contemporânea tem uma identidade plural e é sincrônica. Plural porque ela hoje tem várias formas, apesar de perseguir aqueles modelos estabelecidos por Machado de Assis, Rubem Braga, Carlos Drumond Andrade, Paulo Mendes Campos e outros, e,ainda, continua muito presente na vida nacional.

Hoje, todo jornal, toda revista têm os seus cronistas que comentam os fatos políticos ou, então, recriam aspectos do cotidiano. Agora ela é sincrônica no sentido de que traduz uma simultaneidade, ou uma síntese não só atemporal, como espacial.

A forma de retratar a realidade por meio da escrita não está mais ligada apenas aos fatos do cotidiano. Spínola exemplificou dizendo que: "como a gente verifica por aí, Luiz Fernando Veríssimo de repente fala do século IXX e não está mais ligado a um só espaço ou a uma cidade, mas a vários lugares". As crônicas atuais são as mais sintomáticas nesse sentido, porque através da internet dizemos o que sentimos sobre o mundo.

As novas tecnologias, por exemplo, estão dando essa percepção simultânea do mundo, das coisas. E isso está fazendo com que o cronista não se sinta mais habitando apenas uma cidade, mas da cidade transportou-se para o mundo. Então ele fala de algo acontecido na esquina e de repente pode falar de algo acontecido na China.

Quando questionei a diferença entre crônica jornalística e crônica literária, Adriano, de pronto, respondeu: "a crônica literária, evidentemente, tem uma recriação da linguagem mais conotativa. Possibilita várias interpretações, enquanto que a crônica jornalística se associa mais a um comentário. Vamos dizer que ela é unidimensional, ou ‘monosemântica’ (sic) que possibilita uma só interpretação".

Em sua palestra, Spínola afirmava que a crônica é o gênero literário mais importante do Brasil por vários motivos: a capacidade de improviso, o temperamento anárquico, a carnavalização, a plasticidade intelectual do homem brasileiro, e outras.

Para nós vale muito mais a imaginação recriadora dos fatos. A crônica tem uma característica diferente, ela é imediatista. Somos ligados às coisas imediatas. Atuamos diante das coisas presentes. Nenhum povo consegue ter escritores com esse grau de liberdade, beirando até a irresponsabilidade. Muitas vezes o cronista deixa para escrever sua crônica na última hora, como já fiz várias vezes. Isso não aconteceria, jamais, em outros países.

Fonte: Redação Maratimba.com
 
Por:  Roney Moraes    |      Imprimir