Categoria Policia  Noticia Atualizada em 25-04-2012

Após 25 anos, oficial e ex-soldado da PM vão a júri por assassinato em SP
Major e fiscal respondem por morte e tentativa de homicídio em 1987. Vítimas eram suspeitas de matar filho de cabo; policiais alegam inocência.
Após 25 anos, oficial e ex-soldado da PM vão a júri por assassinato em SP
Foto: g1.globo.com

Após 25 anos e seis adiamentos, devem ser julgados nesta quarta-feira (25) um oficial e um ex-soldado da Polícia Militar de São Paulo acusados de participar do assassinato de um jovem e da tentativa de matar um adolescente em 4 de março de 1987. O juri popular está marcado para começar às 12h30 no plenário 14 da 4ª Vara do Júri no Fórum da Barra Funda, na Zona Oeste da capital paulista.

A previsão da assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça de São Paulo é que a decisão dos sete jurados e a sentença da juíza Carla Montesso Eberlein sejam conhecidas nesta noite. Os réus respondem ao processo em liberdade.

O major Robson Bianchi, que era tenente à época dos fatos, e o fiscal de segurança Luiz Fernando Gonçalves, que era soldado, respondem pelo envolvimento no homicídio de Aluízio Cavalcante Júnior, de 18 anos, e da tentativa de homicídio de Cláudio Aparecido de Moraes, de 17.

De acordo com a denúncia feita pelo Ministério Público em 15 volumes, cada um com 200 páginas, o então tenente Bianchi autorizou o cabo José Carvalho a atirar nas vítimas. Segundo a Promotoria, o cabo suspeitava que os jovens estivessem envolvidos no assassinato de seu filho na região de São Miguel Paulista, na Zona Leste, e, por esse motivo, queria matá-los. Carvalho nunca foi julgado porque morreu no ano seguinte ao crime, de causas naturais, em 14 de julho de 1988.

A acusação informa que, antes da execução, uma espécie de "tribunal" foi formado para julgar se Aluízio e Cláudio deveriam ser mortos. Nove policiais militares teriam participado do "julgamento". Após ter recebido a autorização do tenente, o cabo e mais três policiais dispararam contra as cabeças e pescoços das vítimas, segundo a acusação.

Ainda de acordo com documentos do MP, Aluízio levou dois tiros e morreu na hora. Cláudio também foi baleado duas vezes, mas sobreviveu após se fingir de morto. Achando que os dois estivessem mortos, os policiais decidiram jogar os dois em um terreno em Itapecerica da Serra, na Grande São Paulo. Desconfiados, resolveram voltar no dia seguinte, em 5 de março de 1987, mas só encontraram o corpo de Aluízio, que foi ‘desovado’ em Guarulhos, onde foi encontrado dias depois.

Cláudio havia fugido e procurou a família de Aluízio, que acionou a Corregedoria da PM. O órgão chegou a prender os policiais suspeitos. O adolescente foi assassinado depois, com 12 tiros em 18 de janeiro de 1997 em circunstâncias misteriosas, nas quais a autoria do crime nunca foi descoberta.

Julgamentos

Em 1987 os crimes dolosos contra a vida de cidadãos praticados por policiais militares só podiam ser julgados pela Justiça Militar. Com a mudança da lei, em 1996, policiais também passaram a ser julgados pela Justiça comum. A Justiça Militar passou a aplicar penas administrativas para os policiais que cometiam crimes.

De acordo com a acusação, no início dos anos de 1990, a PM expulsou os soldados Rubens Antonio Baldasso, Dirceu Bortoloto, Edinilton Feres e Luiz Fernando Gonçalves da corporação porque a Justiça Militar concluiu que eles participaram do homicídio de Aluízio, da tentativa de homicídio de Cláudio e da ocultação de cadáver de Aluízio.

Três processos surgiram na Justiça comum nesses últimos 25 anos por causa da execução: um de ocultação de cadáver e outros dois de homicídio e tentativa de homicídio. Esses dois últimos eram um só processo, mas acabaram desmembrados.

Em 1990, a Justiça em Guarulhos condenou a dois anos de reclusão esses mesmos quatro soldados por ocultação de cadáver. Apesar disso, após recursos impetrados pela defesa deles, a Justiça determinou que nenhum dos policiais ficasse preso. Foi decretado o cumprimento condicional da pena.

Em 2008, três outros policiais foram absolvidos pela Justiça em São Paulo dos crimes de assassinato e de tentativa de assassinato: soldados Dirceu Bortoloto, Francisco Inocêncio Carlos Gomes e Rubens Antonio Baldasso.

O terceiro julgamento deve ocorrer nesta quarta no Fórum da Barra Funda. De acordo com as partes envolvidas no processo, alguns dos réus demoraram mais de 25 anos para serem julgados por alguns motivos: mudança da lei, que levou para a Justiça comum um caso que só era julgado pela Militar, além dos recursos impetrados pela defesa pedindo vários adiamentos.

O que dizem as defesas
Normalmente, a Justiça tem 20 anos para julgar um homicídio. Após isso, o crime prescreve e os acusados não são mais julgados.

Esse caso de Aluízio chegou a ser levado para análise da Comissão de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA). A decisão de levar os réus a júri foi tomada pela Justiça em 2002. Naquela ocasião, o prazo final foi estendido e por causa disso, o crime ainda não prescreveu.

Os dois réus que devem ser julgados nesta quarta alegam inocência das acusações.

Luiz Gonçalves, que já foi condenado pela Justiça comum pela ocultação de cadáver, trabalha atualmente como fiscal de segurança, de acordo com sua advogada, Neide Marzocca Saldanha Nogueira da Gama. "Ele [Luiz] não vai preso. Vou alegar negativa de autoria. E o exame de balística não comprova que ele atirou. Ele é trabalhador, pai de cinco filhos, expulso da PM por causa disso. Todos os PMs sabem que quem executou foi o cabo Carvalho. Meu cliente não viu o crime, ele ouviu os tiros. Aí ele contou que o cabo voltou e havia dito que tinha feito justiça", afirmou a advogada Neide da Gama.

A advogada Ieda Ribeiro de Souza, que defende o major Robson Bianchi, afirmou que vai demonstrar aos jurados a inocência de seu cliente. "De nenhuma forma ele participou do assassinato. E vou provar isso no júri. Isso [da execução] foi numa época remota da PM. Ele é major atualmente. Ele teve as promoções por merecimento. Respondeu procedimento disciplinar na PM por causa disso e foi inocentado enquanto os outros policiais foram expulsos e ele não. Ele é inocente."

Família da vítima

"Mataram meu filho porque ele foi pego fumando maconha com um amigo. Depois disso, esse cabo falou que eles mataram o filho dele. Aí, os policiais levaram os dois para um lugar ermo e os fuzilaram, depois de fazerem roleta-russa e um tribunal. O que eu quero? O que sempre busquei: justiça", disse emocionado o soldador aposentado Aluizo Cavalcante, de 75 anos, pai de Aluízio e uma das quatro testemunhas arroladas para o júri. Ele guarda há 25 anos as reportagens sobre o caso. Alguns recortes de jornais já estão amarelados.

Além dele, também deverão ser ouvidos um ex-sargento da PM que teria presenciado o crime. "O pai de Aluizio chegou a gravar uma conversa com esse ex-policial, na qual ele conta que quatro policiais, inclusive o cabo, mataram o filho dele e atiraram em Claudio. Ele ainda conta que foi o então tenente Bianchi quem autorizou a execução. Esse áudio foi juntado ao processo e será apresentado aos jurados", disse o advogado Ademir de Osti Barbosa, que defende os interesses da família de Aluízio.


O pai de Aluízio mostra as reportagens que
guardou sobre o caso nos últimos 25 anos




Fonte: g1.globo.com
 
Por:  Maratimba.com    |      Imprimir