Categoria Opinião  Noticia Atualizada em 15-04-2013

MINHA VIZINHA DE VERíO
Ela é minha vizinha de verão. Só isso. Não: tem mais. Eu morei na cidade onde ela mora e, às vezes, a via caminhando na calçada. Isso lá se vai uns vinte anos... Eu tinha meus quarenta e pouco. Hoje, ela já é bem idosa.
MINHA VIZINHA DE VERíO

Como disse o Cazuza, o tempo não para. Na verdade, o tempo é implacável.

Aconteceu naquela manhã que minha mulher ofereceu carona para a minha vizinha de verão. Sua filha estava ausente e ela precisava ira pra a casa da nora; e como eu estava saindo na mesma direção...

Minha vizinha de verão tem um casal de filhos. Seus filhos são pessoas com quem nos falamos apenas quando a gente se encontra. A filha é extremamente simpática, gentil, generosa. Tem mais ou menos a idade da minha esposa. Nossas conversas giram em torno de notícias da nossa antiga cidade. "Sabe quem morreu?" "Sabe quem agora é vereador? "" Lembra da fulana? Não é que separou do marido? "... E isso nos rende bons e agradáveis papos... E sempre a três: ela, minha mulher e eu. E não é que essa filha descobriu-me flamenguista doente? E aqui é que entra a sua generosidade. Dentro do motivo rubro-negro, de vez em quando eu sou lembrado com suvenires e outros pequenos agrados que me deixam honrado de ter uma amizade assim. Ela não é rubro-negra, mas, por qualquer motivo, gosta de fazer um flamenguista feliz.

Já o outro filho da minha vizinha, houve tempo em que nos víamos com mais frequência. Éramos um pouco mais jovens e íamos ao mesmo ambiente onde aconteciam partidas de futebol e jogo de bochas entre os membros de uma família amiga. Ambos tínhamos convite permanente para esses momentos prazerosos. Nossas conversas, ainda que meio superficiais, eram mais amiúde. Futebol sempre gera bons papos. Um assunto puxando outro e por aí vai... Hoje, nossos encontros já não são tão frequentes. Às vezes o vejo na praia com a esposa. Trocamos cumprimentos... Gente boa.

A bem da verdade, eu nunca troquei sequer um diálogo com minha vizinha de verão. Quando acontecia de passarmos um pelo outro, os cumprimentos eram formais e muito rápidos. Eu sempre imaginava que ela, sendo muito católica, esquivava-se de mim, conhecido que sou pela condição de protestante. Diferente dos filhos, claro.

Naquele dia, a possibilidade de poder ser útil à minha vizinha me fez bem. Apressei-me nos meus preparativos, parei o carro em frente a sua casa, acomodei suas bolsas no banco traseiro e lá fomos nós para o endereço que eu não sabia. Ela daria as coordenadas.

Estranha essa sensação de estar ao lado de alguém que a gente conhece, mas que nunca se falou. E ali, ela precisava falar. "Naquela esquina nós vamos virar à direita." E ainda deu informação extra: "Essa casa à nossa esquerda é da minha irmã." "Próxima esquina, à esquerda." "Agora nós vamos parar depois daquele carro que está estacionado."

Sua nora não morava muito distante. Saltei do carro, retirei as bolsas e ficamos aguardando alguém atender. Como houve uma pequena demora, ela insistia para que eu a deixasse na calçada e seguisse em frente. "Muito obrigada. O senhor pode ir. Tem gente em casa. A casa está aberta...".

Alheio à orientação da minha vizinha eu ajudei a chamar, bati palmas... E aí, ouvi um vizinho anunciar: "A dona da casa vem lá". Com efeito, lá vinha a nora. Eu sabia o seu nome, mas tal como minha vizinha de verão, eu nunca tinha conversado com ela.

A nora não escondeu os seus sentimentos ao ver a sogra. "Tô que nem doida ligando pra lá. Ninguém atende. Já estava indo lá ver o que estava acontecendo..." Minha vizinha a interrompe e diz pra ela que eu tinha lhe dado carona até ali. Notei que ela queria livrar-se daquele constrangimento. A nora finge que não me tinha visto, faz um agradecimento entre dentes e continua seu discurso desnecessário, quase cruel.

Despedi-me das duas e saí. Confesso que diante da "recepção calorosa" da nora, perdi um pouco da alegria de ter servido à minha vizinha de verão.


Fonte: Redação Maratimba.com
 
Por:  Silvio Gomes Silva    |      Imprimir