Categoria Geral  Noticia Atualizada em 10-08-2013

Leitor tem "flashbacks" da vida com o pai em concerto de música clássica
Filho de violinista assistiu à execução da obra favorita do músico. O pai morreu antes de ganhar DVD de concerto, que continua embrulhado.
Leitor tem
Foto: g1.globo.com

Nestes dias que antecedem o Dia dos Pais, o G1 está publicando relato dos leitores sobre atitudes dos pais que encheram de orgulho os filhos.

Neste sábado a vez é de Laudelino Amaral de Oliveira Lima, que através da música tem suas mais fortes lembranças paternas.

"Meu pai, Cláudio de Oliveira Lima, foi violinista. Trabalhou muito tempo em apresentações sinfônicas, orquestras e similares. Nos anos 1990, indo para Cabo Frio (RJ), lhe fiz a seguinte pergunta: "Pai, para você qual a obra mais bonita da música clássica?" Ele respondeu: "São muitas, mas eu gosto bastante das que têm coral e orquestra. Ficaria com o Requiem de Mozart". "Pai, e como violinista, para você, qual a obra mais bonita?" "Só existe uma filho, nada é mais bonito que o Concerto Nº 1 para Violino e Orquesta de Max Bruch."

Ele parou o carro e sacou uma fita. Durante a execução ele tecia vários comentários sobre alguns pontos. Todos lá em casa acabamos por escutar essa obra muitas vezes, e uma delas foi ao vivo. Acordei em um dia de sábado com o som do violino. Meu pai estava sentado na cama tocando alguns fragmentos da música. Minhas duas irmãs, sentadas no chão ao pé da cama e minha mãe escutava inerte. Fiquei de pé na porta, depois chegaram os outros dois irmãos. Que momento mágico deve ter sido para meu pai. Ao final, minhas irmãs bateram palmas, minha mãe o abraçou carinhosamente, reparei que ele tinha lágrimas nos olhos e um sorriso no rosto.

Na virada do século, já vendo o avanço na idade daquele que eu tanto admirava, pensei em dar-lhe um presente. Entrei em contato com várias orquestras sinfônicas e pedi para que uma das duas obras entrasse em apresentações futuras.

Ao final de 2007, achei milagrosamente em uma loja de DVDs o Requiem de Mozart gravado na Bósnia. Embora meu pai o tenha escutado durante toda a vida, nunca viu a execução da obra.

Comprei e resolvi dar no Natal, que seria três semanas depois.

As sinfônicas nunca responderam e no dia 12 de dezembro de 2007 recebi a notícia do falecimento do meu velho. Duas semanas antes do Natal. O DVD está embrulhado para presente na minha estante de livros até hoje. Não sei o que fazer com ele. Só sei que não abrirei.

Ele serve para me lembrar de que nunca mais devo adiar as coisas boas. Isso me cobrou um preço que não poderei mais pagar.

No dia 18 de junho de 2009, o concerto Nº 1 de Max Bruch foi apresentado na sala Cecília Meireles, Rio de Janeiro. E lá eu estava. Enquanto tocava, tive vários flashbacks de momentos em que ele comentava a música. Em 40 minutos de apresentação, repassei uns 20 anos da vida com meu pai. A gravata me apertava. Tirei-a e reparei que tinha gotas de lágrimas, mas eu não estava triste. Talvez eu tenha atingido o grau de felicidade que ele teve aquele dia no quarto."

Fonte: g1.globo.com
 
Por:  Maratimba.com    |      Imprimir