Categoria Opinião  Noticia Atualizada em 24-12-2013

UM GATO NO CULTO
�- Continuei dormindo e sonhando. Sonhei que estava acordado na cama, e ao lado, sentado na cadeira, tinha um gato me olhando.� ( Fernando Sabino ).
UM GATO NO CULTO

Vez por outra ele passava em frente daquele templo sem ter coragem para entrar. Observava o povo chegando para o culto. Uns chegavam, entravam, procuravam o seu lugar e, em ora��o, aguardavam. Outros s� entravam aos primeiros acordes do prel�dio. Um pequeno grupo s� entrava quando os introdutores vinham avisar que o culto tinha come�ado. Havia uns incorrig�veis: vinham para ficar do lado de fora mesmo.Ele achava engra�ado. S� n�o conseguia rir.

Entretanto, naquela noite, o Gato encheu-se de coragem e entrou. Entrou sem fazer ru�do como s� os gatos o sabem fazer. E, confiado na sua absoluta discri��o, ele caminhou (ou deveria dizer engatinhou?) pelo santu�rio, dando a impress�o de que procurava um lugar adequado para absorver o m�ximo poss�vel daquele culto inspirativo.

Checou o ambiente. Passou as patinhas pelos bancos e levou aos olhos para constatar a limpeza. Conferiu a decora��o. Chegou at� a olhar para o teto, � procura de l�mpadas que precisassem ser trocadas. Quem o visse assim pensaria tratar-se de um fiscal ou de algu�m muito entendido em lugar de adora��o...

O Gato j� se acomodava, quando passos cadenciados chamaram a sua aten��o. Um adorador, pessoa nada discreta, adentrava ao santu�rio. O Felino olhou de soslaio para os trajes "tipo t� aqui" e ficou sem entender. A pessoa tinha errado de endere�o ou aquela roupa j� era para o "depois-do-culto"? -Eu, hem! � pensou.

A partir da� o nosso "Miau" passou s� a observar. Gatos s�o assim mesmo. Observadores. Maliciosos. Ningu�m sabe o que eles est�o pensando. Reparou num casal. Ela, cabe�a apoiada no ombro dele, dava a impress�o de que preferia estar no banco de uma pra�a qualquer a estar ali naquele local sagrado. Um cidad�o estava t�o � vontade no banco - pernas e bra�os abertos - como se estivesse � espera do "plim-plim".

Durante o culto, o Bichano trocou de lugar v�rias vezes. Num banco, um irm�o cochilou feio e a sua B�blia teria lhe ca�do em cima n�o fosse o seu inimit�vel pulo de lado. Um menino fazia um barquinho de papel com o boletim informativo, sob os olhares c�mplices da mam�e e do papai. Que gracinha!... Num outro banco ouviu uma mastiga��o sem fim. Ensaiou o miado, mas se conteve: era s� chiclete... Noutro banco, aproximou-se, mansamente, de um grupo de jovens e os viu, durante a mensagem, concentrados como se estivessem copiando os pontos do serm�o. Chegou mais perto e constatou: alheios ao andamento do culto, enviavam torpedos, Deus sabe para quem.

E assim, discret�ssimo, ele se acomodou junto ao gazofil�cio, meio preocupado com o que poderiam pensar de um gato perto do cofre... Mas ficou por ali mesmo. Dali, acompanhou as apresenta��es coreogr�ficas, os c�nticos congregacionais, o serm�o do pastor... Quando alguma coisa n�o passava na sua avalia��o felina, co�ava a barba de forma significativa.

Pois bem. Patinhas cruzadas, olhinhos pregui�osos, o Gato ficaria ali se de repente - z�s! - m�os �geis n�o o tivessem segurado firme, erguendo-o do solo e retirando-o rapidamente do seu confort�vel lugar. N�o adiantava protestos. Saiu sem miados, sem amea�ar com suas tem�veis garras. L� fora, voltando aos telhados de onde viera, ele se espregui�ou e saiu-se com esta: "J� estava come�ando a gostar...Pena que me descobriram... Tem nada n�o! Na pr�xima vez, j� sei: vou disfar�ado de visitante... ningu�m vai me notar! Quer apostar?"

Deu um miado meio sarc�stico e sumiu na noite, por entre pr�dios e telhados.

Fonte: Reda��o Maratimba.com
 
Por:  Silvio Gomes Silva    |      Imprimir