Categoria Opinião  Noticia Atualizada em 08-01-2014

SER AVÔ
Neste ano serei avô duas vezes. Minha filha primogênita terá mais um bebê em março e o filho do meio será pai no mês de maio.
SER  AVÔ

Neste ano serei avô duas vezes. Minha filha primogênita terá mais um bebê em março e o filho do meio será pai no mês de maio. Então, serão dois meses quase seguidos de agradáveis emoções. Só poderão me compreender aqueles que já passaram por isso. E não são todos, certo?

Lembro o famoso verso de Coelho Neto: "Ser mãe é padecer no paraíso". E ser avô? Estou certíssimo de que não é desdobrar fibra por fibra de nada; até porque nunca vi nenhum avô com fibra. Todos são desfibrados, desrespeitados, feitos de bobos pelos netinhos que fazem dele gato e sapato. E ele deixa. E até estimula-os a isso. O avô que parou de brincar de cavalinho para me ler, sabe que estou falando a pura verdade.

Da minha parte não tive avós. Ou melhor: não os conheci, não convivemos. Na memória, tenho um velhote que nos visitava espaçadamente a quem chamávamos de avô, mas não era. Talvez o tenhamos recebido em casa umas duas ou três vezes, no máximo, e fomos ao sítio que ele cuidava, no norte do Espírito Santo, uma vez. É o de que me lembro. Nunca soube qual o parentesco dele com meu pai. Penso que ajudara na sua criação, na penúria que certamente enfrentou para sobreviver. Nós o chamávamos de "vô Laudelino" e ele, por sua vez, sabia agradar crianças, trazendo sempre uns pacotinhos de "bala doce", como ele dizia. Por mais que eu me esforce, não consigo lembrar-me do seu rosto... Sei que era meio pançudo e usava chapéu de abas largas... Falava pouco, por isso não tenho lembranças de sua voz...

Esse fazia as vezes de avô. A que chamávamos de "vovó ", vivia, também, distante da gente. Suas visitas eram mais frequentes em nossa casa, em comparação às do "avô". O parentesco, desta vez, era com minha mãe, penso que pelos mesmos motivos do avô em relação ao meu pai: participação na sobrevivência . Vó Maria, assim como meus pais, era "crente" ou "protestante" (Não falávamos evangélica, termo atual) e isso servia, sem dúvida, como fator de maior aproximação. Mesmo vendo-nos com mais frequência, sua influência sobre nós não teve nada de notável. Lembro-me de que era carinhosa, gostava de entoar cânticos que eram praticados em sua igreja, certamente visando a nos transmitir o que ela possuía de melhor: sua crença em Jesus. Minhas lembranças da "Vovó" são mais vivas. Cheguei a visitá-la em sua residência no Município de Pancas-ES, durante minhas férias, quando seminarista. Na época, eu tinha uns vinte e dois anos e ela já estava "bem cansadinha"...

Vamos combinar, então: eu não teria como creditar meus costumes e manias aos avós. Se eu não arrumasse meu quarto, se eu deixasse sapatos e peças de vestuário fora do lugar, se eu abandonasse copos e pratos onde eventualmente faço minhas refeições, se eu não tivesse por hábito observar o que está desorganizado ao meu redor e tentasse organizar, sem esperar receber ordem para isso... a culpa não estaria em meus avós. Seria preguiça mesmo, o que me parece, um pouquinho pior.

Não sei bem se tenho inveja de quem teve avô ou avó. Eles me fizeram falta? Seria dessa ausência que me veio esse meu indisfarçável ar debochado?(Hein, Ivilisi?). Dos avós se diz que eles em nada favorecem a educação dos netos; muito pelo contrário. Olho para os meus três filhos – todos com mais de vinte e cinco – e sou inclinado a não discordar. Cheguei a planejar criá-los guardando considerável distância de avós: coisa de dois mil quilômetros, mas como "na prática a teoria é outra", minha sogra, a vovozona, não os deixou ilesos. Cabe aqui até outro chavão: "De nada adianta chorar sobre o leite derramado". Afinal, meus filhos estão vivos e são lindos. E chega de chavões.

A verdade é que vou ser vovô duas vezes em 2014. A minha neta que faz doze, deixará de ser única. No seu caso, receber uma irmã e uma prima de uma só tacada, é coisa que também precisa ser administrada pela sua cabecinha de menina. E aí, eu não sei que situação é mais espinhosa: a dela ou a minha. Ela terá que dosar o seu inevitável desconforto nessa indiscutível perda de espaço, e eu, por meu turno, terei que me desdobrar para administrar minha babação - desculpe o termo - de forma a não provocar ciúmes tripartites. É duro ser avô.


Fonte: O Autor
 
Por:  Silvio Gomes Silva    |      Imprimir