Categoria Opinião  Noticia Atualizada em 03-02-2014

A crueldade não é gratuita
“A covardia é a mãe da crueldade”, Montaigne
A crueldade não é gratuita

Para tentar compreender o universo da perversão e comentar os cruéis assassinatos recentes em Cachoeiro de Itapemirim-ES, atento ao estudo da psicanalista e psicóloga Marie Danielle Brulhart Donoso. A pesquisa "Estudo psicanalítico sobre a gramática da maldade", desenvolvida no Instituto de Psicologia (IP) da USP, analisou algumas modalidades de violência a fim de compreender como o homem pôde alcançar tais níveis de brutalidade.

Seu estudo é baseado nos grandes genocídios, porém, destaco em seu trabalho os recortes que apontam a perversidade na relação do dia a dia, e não só nos grandes massacres. "A dominação atrelada à crueldade pode encontrar-se num chefe autoritário, por exemplo".

A psicanálise revela que durante o desenvolvimento da criança surgem componentes cruéis, o que faz com que tais elementos façam parte da constituição de qualquer ser humano. Sobre as mortes "bárbaras" em Cachoeiro, não creio que as pessoas sejam mais cruéis hoje. Elas obtêm mais recursos. Esta perversão acompanha a humanidade ao longo de sua história.

As ações cruéis, por mais bizarras e incompreensíveis que possam parecer, não são gratuitas. Há influência do contexto social, histórico e político. Quem é o sujeito violento? Geralmente, estes crimes são realizados por facções ou gangues com ligação ao tráfico de entorpecentes. Uma liderança perversa causa identificação e a coletividade inibe a capacidade de julgamento, de culpa e os impulsos destrutivos do líder são prevalecidos e copiados como ideal de conduta por seus "seguidores".

"A guerra teoricamente usa a violência como meio para atingir um fim, mas existe outra forma de brutalidade, que é quando a violência deixa de ser um instrumento para atingir uma meta e passa a ser o próprio fim, matando para exterminar o outro, porque ele é diferente, e, portanto, intolerável", afirma a pesquisadora.

Nos dois casos específicos de Cachoeiro, podemos, em princípio, enquadrá-los nesta lógica. Um trabalhador (vigia) e um religioso (que estava no culto) dilacerados praticamente em menos de 48 horas na mesma cidade, em bairros diferentes, sem qualquer explicação plausível até o momento. A única coisa em comum seria o forte movimento de drogas nos locais em que foram mortos e encontrados.

Contudo, a afirmação de José Saramago de que os animais podem ser selvagens, mas apenas o homem é cruel nos faz refletir. Digo que a crueldade tem o limite que a sociedade a proporciona. É comum. Infelizmente a crueldade está na nossa mídia cotidiana, muitas vezes em contextos menores, ao lado ou dentro de casa. É uma guerra difícil de vencer. Mas, só os fracos desistem da luta antes do fim da guerra.

Fonte: Redação Maratimba.com
 
Por:  Roney Moraes    |      Imprimir