Categoria Geral  Noticia Atualizada em 17-03-2014

MP investiga participação do crime organizado em incêndios de ônibus
Objetivo é descobrir porque só 7% dos alvos são carros de cooperativas. Facção é suspeita de comprar linha de transporte por até R$ 270 mil em SP.
MP investiga participação do crime organizado em incêndios de ônibus
Foto: g1.globo.com

O Ministério Público investiga a suspeita de participação de uma facção criminosa que atua dentro e fora dos presídios de São Paulo nos mais de cem incêndios a ônibus na capital desde o início de 2013.

Ao contrário da Polícia Civil, que analisa os casos separadamente por acreditar não haver relação entre eles, o Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) irá apurar todos juntos, buscando relacioná-los entre si para descobrir quem está por trás dos atos. O objetivo é entender por que só 7% dos alvos são carros de empresas permissionárias (normalmente cooperativas que atuam no transporte local de passageiros, operando trechos de bairros e mais curtos).

A maioria dos ataques teve como alvo veículos de concessionárias, empresas contratadas por licitação pela prefeitura para o transporte em corredores e entre regiões do município.

A apuração vai ocorrer de forma separada a outras quatro investigações que o Ministério Público tem nas promotorias criminal e dos patrimônios público e social sobre o envolvimento do crime organizado com cooperativas que atuam no transporte coletivo municipal. Os procedimentos foram instaurados entre o fim de 2012 e o início de 2014. A suspeita do MP é que o crime organizado não coloque fogo no próprio patrimônio.

Ao menos quatro cooperativas são investigadas. Elas são suspeitas de funcionar como uma nova forma de renda da facção e também para lavar o dinheiro do tráfico de drogas - mais de R$ 8 milhões mensais. Segundo promotores, as denúncias tiveram início em 2012. A suspeita é que a quadrilha tenha comprado micro-ônibus e linhas de cooperativas: cada trajeto local vale entre R$ 150 mil e R$ 270 mil. O MP suspeita que o dono da van continua trabalhando na linha, mas agora como funcionário do "crime organizado".

Segundo o promotor Everton Zanella, coordenador estadual do Gaeco, o MP obteve junto à Polícia Civil informações sobre todos os inquéritos instaurados e boletins de ocorrência registrados relacionados aos ataques.

"Recebemos tudo o que polícia já investigou e vamos tentar uma relação entre os casos. Nos parece que grande parte dos casos vem do crime organizado. São ações com o objetivo de afrontar o estado. Uma demonstração de poder", afirma Zanella.
Números do Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de São Paulo (SPUrbanuss) apontam que, dos 42 veículos incendiados entre o início do ano e 14 de fevereiro, apenas 3 (7%) são de permissionárias, com capacidade de até 75 passageiros. O restante foi de empresas concessionárias, que ganharam uma concorrência da prefeitura para explorar linhas longas e corredores. Outros nove coletivos intermunicipais também foram incendiados.

Em 2013, dos 61 ônibus destruídos pelo fogo na capital, oito eram de permissionárias (13% do total). Considerando que cada carro custa pelo menos R$ 500 mil, o prejuízo das empresas concessionárias nos últimos 12 meses é superior a R$ 250,5 milhões.

"É estranho que vans de permissionárias não sejam incendiadas. Tem bem mais ônibus do que micro-ônibus (como alvo) e isso ocorre por algum motivo. Isso que queremos descobrir. Pode ser que a população saiba o que é do crime organizado e o que não é", diz o promotor.
Em dezembro de 2009, PMs prenderam duas pessoas com nove armas em um micro-ônibus de uma cooperativa na Zona Leste de São Paulo.

Entre o armamento havia uma metralhadora calibre ponto 30 - usada em ataques a carros-fortes e capaz de atingir um helicóptero -, escopetas, um fuzil alemão e um AK-47 russo, além de 500 munições. Em 2005, uma ação da Polícia Civil já havia prendido 15 perueiros na Zona Leste em uma cooperativa chefiada por um ex-cabo da PM por suspeita de ligação com o tráfico de armas e drogas.
Polícia Civil não vê ação de facção
Para o delegado José Vicente de Azevedo Fonseca, que contabiliza os ataques no Departamento de Polícia Judiciária da Capital (Decap), não há nenhuma relação entre os ataques. Até dia 20 de fevereiro, os ataques a ônibus de 2013 já haviam virado 37 inquéritos - 15 deles já finalizados e remetidos à Justiça. Dentre 42 suspeitos identificados, 37 haviam sido presos.

"Não há nada que mostre relação com o crime organizado ou a briga entre empresas de ônibus. São realidades distintas, com motivações distintas, predominantemente em retaliação a ações legítimas da polícia, como a morte de um suspeito em confronto, ou por enchente, lixo, entre outras coisas", afirma o delegado, referindo-se aos ataques como "um crime da moda".
"Eles acabam incendiando ônibus por vingança e para demonstrar poder", diz Fonseca. "Levantou-se a possibilidade de atuação do crime organizado em casos esparsos, mas em dez delegacias seccionais, isso ficou restrito a um dos casos, não é nada generalizado."

Em dois ataques na Zona Norte da capital, a investigação identificou os mesmos suspeitos. "São associações criminosas que já existem, ligadas a outros crimes, como o tráfico e roubos, com pessoas que permanecem associadas para este crime (do ataque ao ônibus)", afirma Fonseca.

O delegado entende que o número de ataques a carros de permissionárias é proporcional à frota que representa na capital. Os números da SPTrans, porém, são diferentes: a frota do sistema de transporte municipal é de 14.757 ônibus, sendo 5.940 (40,25%) operados por permissionárias e 8.787 por concessionárias. Os outros 30 restantes ficam na reserva.

O sindicato das empresas que são concessionárias nega qualquer tipo de disputa entre elas devido ao projeto da prefeitura de promover uma reestruturação no sistema, com uma nova licitação, que dividirá as áreas de serviço, prevista para ocorrer só no ano que vem.

"Estamos preocupados com a quantidade de ônibus incendiados. O número atingiu um nível extremamente preocupante. E o que assusta é que nenhum foi por motivo relacionado ao transporte. E eu lhe asseguro que, entre as empresas, não há nenhuma competição ou disputa. Isso sequer foi cogitado aqui", diz o presidente do SPUrbanuss, Francisco Christovam.

Apesar de ter contabilizado os números que mostram o pequeno número de micro-ônibus de permissionários alvo de criminosos, Christovam não acredita que haja um direcionamento para não atingir veículos de permissionárias. "Colocam fogo em ônibus de empresa porque é maior, dá mais visibilidade, é mais pirotecnia é maior. Fica mais chamativo colocar fogo do que em micro-ônibus", entende.

Outra possibilidade investigada é a suspeita de uma fraude contra seguradoras, já que grande parte dos veículos queimados está em fase de renovação. Segundo o SPUrbanuss, a frota tem que ser renovada a cada dez anos de uso e, devido à decisão da prefeitura de suspender a licitação neste ano, as empresas estão operando com ajustamento do contrato inicial e enfrentam dificuldades para conseguir financiamentos junto aos bancos para a compra a de novos veículos.

Por meio das assessorias de imprensa, o secretário municipal de transportes, Jilmar Tatoo, e o secretário estadual de Segurança Pública, Fernando Grella, afirmaram que não se posicionarão sobre o tema.

Fonte: g1.globo.com
 
Por:  Maratimba.com    |      Imprimir