Categoria Geral  Noticia Atualizada em 05-11-2014

Namorado participou de curso com falsa biomédica, afirma ins
Mesmo presente, rapaz não recebeu o certificado em bioplastia estética. Polícia investiga se ele aplicou hidrogel em paciente que morreu, em Goiás.
Namorado participou de curso com falsa biomédica, afirma ins
Foto: g1.globo.com

O namorado da falsa biomédica Raquel Policeno Rosa, de 27 anos, que aplicou hidrogel no bumbum da ajudante de leilão Maria José Medrado de Souza Brandão, 39 anos, morta no último dia 25, esteve presente nas aulas de um curso de bioplastia em Mogi Guaçu (SP). De acordo com o coordenador do Instituto Folha Verde, Carlos Firmino, o rapaz não chegou a efetivar a matrícula como Raquel, mas participou das aulas práticas. "Ele viajou com ela e participou, não o tempo todo, mas principalmente como modelo dela para a aplicação do ácido hialurônico na face", relatou.

O rapaz, identificado como Fábio, passou a ser investigado após ter o nome mencionado em gravações de áudio obtidas no celular da vítima. Segundo a Polícia Civil, ele é professor de línguas estrangeiras e não tem qualquer formação na área estética ou de saúde, mas participou das aplicações de hidrogel feitas em Maria José. A expectativa é que ele se apresente na próxima sexta-feira (7).

De acordo com Firmino, apesar da presença de Fábio nas aulas, apenas Raquel recebeu o certificado em bioplastia estética. Ela pagou cerca de R$ 1,8 mil por 60 horas de atividades, entre 18 de agosto e 5 de setembro.

O coordenador do instituto ressaltou que, mesmo com o diploma, ela não poderia fazer qualquer procedimento sem a presença de um médico e que o curso nunca foi indicado o uso de hidrogel. "O curso baseia-se em cima do ácido hialurônico. Esse produto que ela aplicou, de hidrogel, nós desconhecemos. Ele nunca foi mencionado, assim como nenhuma outra substância que não conste no verso do certificado dela", ressaltou.

Segundo Carlos, Raquel Rosa procurou o curso dizendo que trabalhava como esteticista e que iria fazer a bioplastia junto com um médico. "Ela disse que já tinha feito o procedimento com outro produto, mas que ficou insegura e queria aprender a parte científica", lembra.

Na última segunda-feira (3), o Instituto Folha Verde suspendeu o curso e informou que ele só será reaberto depois que exigências quanto à formação dos interessados forem estabelecidas. O coordenador afirma que serão estabelecidas exigências de graduação para essa formação.

Defesa do namorado
Em depoimento à polícia, na última segunda-feira (3), Raquel negou qualquer participação do namorado na aplicação de hidrogel feita em Maria José. "Segundo a autora, ele participou apenas no primeiro momento, e teria ido massagear um dos glúteos dela, visando espalhar melhor o líquido que ela já havia injetado", relatou a delegada responsável pelo caso, Myrian Vidal.

No entanto, nos áudios analisados pela investigação, Raquel tenta acalmar a vítima e diz que o inchaço que ela estava sentindo em uma das nádegas iria sumir. "Fica tranquila, ele vai assentar, vai ficar por igual os dois lados. É assim mesmo, porque a minha mão é mais pesada que a do Fábio [namorado] e a minha massagem é um pouco mais forte, um pouco mais intensa. É por isso que tá [sic] mais inchado. Mas pode ficar tranquila. Quando o produto assentar, daqui a três dias, você vai ver que os dois lados vão ficar iguais".

Para a delegada, a declaração contradiz o depoimento do filho de Maria José, que afirmou ter visto o rapaz aplicando o hidrogel em uma das nádegas de sua mãe. "Se confirmado a participação dele, e eu acredito que está bastante forte isso nos autos, ele responderia por homicídio culposo, já que na segunda conduta da Raquel, ele não teria participado, ou seja, ele sequer sabia que a mulher estava pedindo ajuda", afirmou a delegada.

A delegada diz que nas conversas entre Raquel e a paciente ficou constatado que o socorro demorou a ser prestado e, por isso, ela deve responder por homicídio doloso, quando há intenção de matar. Além disso, tanto ela quanto o namorado podem responder por exercício ilegal da medicina.

Denúncia
Mais de três meses antes da morte de Maria José, a Vigilância Sanitária de Catalão, no sudoeste do estado, recebeu uma denúncia sobre a atuação de Raquel na cidade. Um e-mail enviado ao órgão, no dia 10 de julho deste ano, dizia que a mulher fazia as "aplicações de substâncias duvidosas", em ambientes que não eram adequados e sem acompanhamento "de profissionais capacitados, como cirurgiões plásticos com cursos específicos".

A Vigilância Sanitária de Catalão afirma que investigou o caso, mas não conseguiu localizar a suspeita. "A denúncia chegou via e-mail e uma fiscal entrou em contato com ela para agendar o procedimento. Mas ela disse que era preciso juntar pessoas. Aí marcou uma vez em Catalão, mas por desconfiar bastante, acabou desmarcando. Mais tarde, agendou para Goiânia. A partir daí, enviamos as informações para a Vigilância Sanitária da capital, com endereço, mas não houve êxito em encontrá-la", explicou o coordenador de Vigilância Epidemiológica, Diego Rodrigues.

O e-mail informou ainda que sessões de aplicações estavam agendadas em um salão de beleza da cidade nos dias 14 e 15 de julho, datas anteriores ao curso de bioplastia que, segundo sustenta Raquel, a qualificou para os procedimentos.

No entanto, segundo a polícia, Raquel não tem formação na área da saúde e não poderia fazer aplicações de hidrogel. "Ela está convicta de que não errou [no caso de Maria José] porque fez o curso de bioplastia estética, com duração de 15 dias, e disse que a morte está relacionada a outro fator. Mas esse curso não a qualifica para os procedimentos", declarou Myrian Vidal.

O G1 entrou em contato com a Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia para confirmar se a Vigilância Sanitária da capital chegou a receber a denúncia, mas não houve retorno até a publicação desta reportagem.

Aplicações
No depoimento, Raquel disse que fez aplicação de hidrogel duas vezes em quatro pacientes, entre elas, a Maria José. Em um primeiro momento, o procedimento foi realizado em um hotel. Dias depois, as mesmas pacientes realizaram retoques com ela em uma clínica estética. Entretanto, Raquel afirma que não tem o nome completo ou contato de suas clientes por ter perdido seu celular, onde estariam todas as informações.

Segundo o Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, a aplicação de hidrogel é um procedimento exclusivo para médicos. O presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de Goiás (Cremego), Erso Guimarães, informou ao G1 que desconhece a profissão de bioplasta. "Existem 14 profissisões regulamentadas pelo Ministério do Trabalho na área da saúde, como por exemplo médico, enfermeiro e fiosioterapeuta. Bioplasta não é um delas", afirmou.

Após a morte de Maria José, o Conselho Regional de Medicina do Estado de Goiás (Cremego) publicou uma resolução proibindo o trabalho médico em estabelecimentos como clínicas de estética e salões de beleza. A norma começou a vigorar no último dia 29.

Internação
Maria José aplicou hidrogel no bumbum no último dia 24. Após se sentir mal, ela foi internada no Hospital Jardim América, em Goiânia, e morreu na madrugada do dia seguinte, com suspeita de embolia pulmonar. Era a segunda vez que a ajudante de leilão fazia o procedimento - a primeira vez fora 15 dias antes.

Em áudios conseguidos com exclusividade pela TV Anhanguera, Maria relatou a Raquel que sentia dor no peito e falta de ar. É possível notar que a paciente estava ofegante e fraca, mas a responsável pela aplicação descartou riscos e orientou a vítima a comer "uma coisinha salgada".

Momentos depois, Maria encaminhou uma mensagem escrita dizendo: "Tenho medo de AVC [Acidente Vascular Cerebral]. Minha mãe morreu cedo disso". Nesse momento, Raquel deu uma risada e descartou a possibilidade de paciente sofrer do problema. "AVC não dá falta de ar não. AVC é no cérebro, não dá falta de ar. Pode ficar tranquila. Você fuma? Alguma coisa assim? Você costuma praticar atividade física? Pode ficar tranquila que tem a ver com a tensão, não tem nada", salientou.

Anúncios na internet
A ajudante de leilão conheceu o trabalho da mulher por meio de anúncios na internet. Em um grupo de no aplicativo de celular Whatsapp, Raquel também fazia propaganda de seu trabalho. "Faço bioplastia de glúteo. Se alguém tiver interesse, me chame inbox". Ao ser questionada sobre valores, ela informou que cobra até R$ 3,9 mil pelo procedimento e promete um "resultado imediato".

A dona da clínica onde Maria José passou pelo procedimento, a esteticista Clênia Marques Rosendo, disse à polícia que não sabia qual o procedimento seria realizado no local e por isso decidiu local uma das salas para a mulher por R$ 250 a diária. A clínica foi interditada no último dia 28 de outubro por não possuir alvará sanitário. Além disso, o local também foi multado em R$ 2 mil.

Fonte: g1.globo.com
 
Por:  Desirée Duque    |      Imprimir